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Jornal: Bolsonaro agiu em favor de empresas para obter insumo de cloroquina

O presidente Jair Bolsonaro exibe caixa de hidroxicloroquina no Palácio do Alvorada - Adriano Machado/Reuters
O presidente Jair Bolsonaro exibe caixa de hidroxicloroquina no Palácio do Alvorada Imagem: Adriano Machado/Reuters

Do UOL, em São Paulo

10/06/2021 10h15Atualizada em 10/06/2021 10h32

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ligou para o primeiro-ministro indiano, Narenda Modi, para pedir que o país acelerasse a exportação de insumos para a fabricação de hidroxicloroquina e citou nominalmente dois laboratórios, de acordo com reportagem publicada hoje pelo jornal "O Globo".

O jornal diz ter tido acesso a um telegrama secreto do Ministério das Relações Exteriores que está em posse da CPI da Covid no Senado. O documento contém a transcrição do telefonema feito por Bolsonaro a Modi em 4 de abril do ano passado, segundo a reportagem.

Na ligação, Bolsonaro teria atuado diretamente em favor de duas empresas privadas, os laboratórios EMS e Apsen, ambas comandadas por empresários considerados apoiadores do presidente —Carlos Sanchez e Renato Spallicci, respectivamente—, de acordo com o jornal. Em março do ano passado, Índia havia suspendido a exportação de vários insumos devido à pandemia.

A reportagem diz que Bolsonaro começa a ligação deixando claro que o objetivo era obter os insumos para fabricar a hidroxicloroquina com o intuito de usar o medicamento para o combate à covid-19. À época ainda não havia estudos sobre a eficácia do medicamento no tratamento da doença. Hoje, no entanto, diversas pesquisas apontam sua ineficácia.

"Entrarei diretamente no assunto. Embora não haja, por ora, divulgação oficial, temos tido resultados animadores no uso de hidroxicloroquina para o tratamento de pacientes com a covid-19. Gostaria, por isso, em nome do governo brasileiro, de fazer um apelo ao amigo Narendra Modi para que obtenhamos a liberação de importações de sulfato de hidroxicloroquina feitas por empresas brasileiras", disse Bolsonaro, de acordo com a transcrição feita pelo Itamaraty e obtida pelo "O Globo".

Em seguida, Bolsonaro faz menção aos dois laboratórios brasileiros, que teriam carregamentos do insumo "parados" na Índia, segundo a transcrição revelada pelo jornal.

"O sucesso da hidroxicloroquina para tratar a covid-19 nos faz ter muito interesse nessa remessa indiana. Estou informado de que um carregamento de 530 quilos de sulfato de hidroxicloroquina está parado na Índia, à espera de liberação por parte do governo indiano. Esse carregamento inicial de 530 quilos é parte de uma encomenda maior, e foi comprado pela EMS", afirmou Bolsonaro, segundo a reportagem.

"Adianto haver, também, mais carregamentos destinados a uma outra empresa brasileira, a Apsen. Este, como eu dizia, é um apelo humanitário que submetemos a nosso prezado amigo Narendra Modi, e que, se atendido, poderá salvar muitas vidas no Brasil", disse o presidente, de acordo com o jornal.

"O Globo" informou que procurou a Apsen e a EMS e as empresas afirmaram que "têm relação apenas institucional com o governo brasileiro".

A participação de Bolsonaro na negociação tinha sido confirmada pelo ex-ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, em seu depoimento à CPI da Covid. No dia da ligação, Bolsonaro publicou em suas redes sociais uma foto ao lado do então chanceler. Dias depois, o presidente fez outra publicação agradecendo a liberação dos insumos.

A CPI da Covid foi criada no Senado após determinação do Supremo. A comissão, formada por 11 senadores (maioria era independente ou de oposição), investigou ações e omissões do governo Bolsonaro na pandemia do coronavírus e repasses federais a estados e municípios. Teve duração de seis meses. Seu relatório final foi enviado ao Ministério Público para eventuais criminalizações.