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Sobrinho divulga vaquinha de bitcoins para financiar atos pró-Bolsonaro

Eduardo Militão

Do UOL, em Brasília

31/08/2021 04h00

Um sobrinho do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) conhecido como Leo Índio tem divulgado uma campanha de financiamento de atos previstos em 7 de setembro de apoio ao tio. Leonardo Rodrigues de Jesus usou suas redes sociais para promover uma chave da criptomoeda bitcoin a fim de levantar dinheiro para as manifestações.

Um dos articuladores do movimento pró-Bolsonaro, o caminhoneiro Marcos Gomes, o Zé Trovão, disse ontem (30) que "a pauta principal" do protesto é retirar os 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). "Todos estão em busca do mesmo ideal: impeachment dos 11 ministros", afirmou num canal de Telegram.

Leo Índio disse ao UOL não defender o ataque aos integrantes da Corte. "Eu apoio a harmonia entre os Poderes", afirmou.

Entre os dias 15 e 30 de agosto, ele divulgou 11 vezes a chave Pix do motorista de aplicativo Rafael Moreno, 33 anos, apoiador de Bolsonaro e defensor da monarquia no Brasil. No dia 23, divulgou a chave para bitcoins também, reproduzindo as mesmas palavras utilizadas por Moreno:

Criamos essa nova forma de contribuição!"
Leo Índio, sobrinho do presidente Bolsonaro

Ontem, Leo Índio voltou às redes, divulgando o sistema de arrecadação por Pix, mas disse à reportagem, que não cuida da arrecadação, mas apenas divulga a vaquinha. O método de pagamento em bancos e os bitcoins são de responsabilidade de Moreno.

O motivo do uso de criptomoedas seria evitar bloqueios de contas bancárias ordenadas pela Justiça. "O Supremo togado, cabeça de ovo, está mandando bloquear os Pixs que arrecadam para o dia 7 de setembro! [sic]", reclamou Léo Índio na rede social, novamente endossando palavras de Moreno.

Envie um PIX com qualquer valor para [chave Pix] ou envie Bitcoins!"
Leo Índio

No dia 20, a Polícia Federal fez busca e apreensão nos endereços do deputado Otoni de Paula (PSC-RJ), de Zé Trovão e do cantor Sérgio Reis. Naquela data, o Supremo também ordenou confisco de uma conta bancária ligada aos movimentos de 7 de setembro. A chave Pix da conta também foi bloqueada.

O bitcoin é um dos principais "criptoativos" do mundo virtual — e possui câmbio próprio. A Receita Federal ordena que sejam declarados. O Banco Central tem afirmado que a troca de bitcoins por reais precisa ser feita em instituições financeiras autorizadas, esclareceu um especialista em investigações financeiras e lavagem de dinheiro ouvido pela reportagem sob a condição de anonimato.

Segundo a Polícia Federal, um bitcoin vale R$ 250 mil hoje.

A conta bancária divulgada por Leo Índio seguia recebendo recursos por meio do Pix até ontem. O valor arrecadado não foi revelado por Rafael Moreno, que disse só ter obtido dinheiro com Pix, não com bitcoins.

Oito caminhões de som alugados

Até o momento, o sistema de arrecadação de Moreno, apoiado pelo sobrinho do presidente, conseguiu alugar oito carros de som para cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Belo Horizonte, além de faixas em Londres, na Inglaterra. Um caminhoneiro bolsonarista contou à reportagem que o aluguel de cada veículo não sai por menos de R$ 1.000 por dia.

A meta é alugar caminhões de som em todos os estados.

Rafael Moreno não revelou quanto arrecadou com Pix, mas disse que a campanha com bitcoins não rendeu dinheiro. "Aluguei alguns carros de som em diversos lugares do Brasil, além de mandar fazer centenas de bandeiras, camisetas, banners, adesivos e outros brindes, para distribuir aos participantes do ato de 7 de setembro", afirmou ele, por meio de nota.

Segundo ele, os atos serão democráticos e defenderão "a liberdade daqueles que foram presos pela opinião". Moreno diz ser contra a intervenção militar, mas pede nova Constituição, escrita pelo deputado Luiz Bragança (PSL-RJ), descendente da família imperial, que governou o Brasil entre 1822 e 1889.

Queremos transparência nas eleições e queremos o impeachment daqueles que deveriam proteger a constituição, porém estão rasgando-a quase que diariamente"
Rafael Moreno, militante de movimento monarquista

Ele afirmou que a divulgação da conta bancária foi feita de forma voluntária.

Zé Trovão é quem tem que responder, diz Índio

Procurado, Leo Índio disse que o movimento de 7 de setembro será pacífico e se desvinculou do ataque aos ministros do STF. "Essa pergunta tem que ser feita ao Zé Trovão", afirmou ele, por meio de mensagens, na tarde de ontem.

Na avaliação dele, a manifestação chamada por Bolsonaro às ruas será "um movimento patriota e ordeiro", numa "data festiva". "Eu não faço parte de nenhum movimento. Sou um cidadão qualquer. Espero que seja igual os anteriores, em paz", disse.

Ele afirmou ainda que não tem informações sobre a arrecadação de dinheiro com Pix ou bitcoins. "Não entendo dessa pauta. Criptomoedas e etc. Não estou cuidando disso. Apenas disponibilizei minha página pra divulgar."

Primos

Leo Índio é filho do militar e ex-professor do Instituto Militar de Engenharia Cláudio Márcio Rodrigues de Jesus e da pianista e missionária Rosemeire Nantes Rodrigues, irmã de Rogéria Nantes, mãe dos três filhos mais velhos de Jair Bolsonaro. Em 2007, ele voou com o primo Carlos Bolsonaro do Rio de Janeiro para Brasília, com recursos da Câmara dos Deputados, da cota de passagens do então deputado Jair Bolsonaro, à época filiado ao PP.

No ano passado, Índio trabalhava com o então vice-líder do governo no Senado, Chico Rodrigues (DEM-RR). Flagrado pela Polícia Federal com dinheiro na cueca, o senador perdeu o cargo e o assessor. Léo Índio foi para o gabinete de Carlos Viana (PSD-MG), segundo o site do Legislativo. Ele não trabalha mais no Senado.