CPI põe relatório em debate e ainda pode fazer mudanças; entenda a votação
A CPI da Covid realizará na próxima terça-feira (26) a votação do relatório apresentado pelo senador Renan Calheiros (MDB-AL) ontem. Antes de votarem, os senadores vão discutir o conteúdo do documento, e o texto final poderá sofrer alterações com base em sugestões feitas a Renan ao longo da semana.
O relatório aponta o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como um dos principais responsáveis pelo agravamento da pandemia no Brasil e recomenda que ele seja responsabilizado por nove crimes. Entre as imputações ao chefe do Executivo estão delitos comuns, que têm pena de prisão e/ou multa, crimes contra a humanidade e crimes de responsabilidade, que podem resultar em impeachment, em última instância.
Para ser aprovado, o documento precisa receber o apoio da maioria dos 11 membros titulares do colegiado (6 votos). Integram a comissão sete senadores de oposição ao governo Bolsonaro ou independentes (o chamado G-7, grupo que deve votar a favor do parecer e contra os interesses do presidente) e quatro parlamentes da base governista.
Desde ontem, após ter sido concluída a leitura do relatório de Renan, iniciou-se o período de "vista" — uma semana na qual os senadores analisarão mais detalhadamente o material. Na próxima terça, a audiência deve começar já com a fase de discussões, de acordo com o rito aprovado pela Mesa Diretora da CPI.
Cada parlamentar terá um prazo de 15 minutos para expor a sua linha de raciocínio, contestar pontos do relatório e/ou sugerir adaptações ou modificações no texto. As sugestões passam pelo crivo do relator, que pode considerá-las ou não em sua redação final do relatório.
Renan afirmou nesta quarta-feira aos colegas que há espaço para "aperfeiçoamento, mudanças e ajustes".
"A boa vontade do relator é total. Se, ao final e ao cabo, eu não atender às pretensões, eu não vou querer que a pessoa aprove, porque ele não estará atendido. E aí, não aprovando, rejeitando o relatório, faz-se um voto vencido. O presidente designa alguém, que faz um voto vencido. É isso", afirmou e emedebista, que foi alvo de críticas dos colegas, recuou e acabou mudou alguns pontos na versão preliminar de seu texto — que contava com 70 pessoas e duas empresas na sugestão de indiciamento.
Membros da base de apoio ao governo Bolsonaro devem apresentar na terça relatórios paralelos como "votos em separado", isto é, versões que divergem parcialmente ou integralmente das conclusões do relator. As opiniões desses parlamentares passam a constar nos registros da comissão, mas não alteram o resultado do texto final — caso haja aprovação do documento pela maioria.
Cada senador que expuser voto em separado também terá prazo de 15 minutos para apresentação, prorrogáveis por mais cinco.
Não será possível apresentar os chamados destaques — sugestões de adições ou supressões — ao relatório de Renan na própria terça-feira.
Ao fim das discussões, etapa que deve ser arrastar ao longo do dia, a presidência da CPI poderá então iniciar o processo de votação — que será "nominal e ostensivo", de acordo com o vice-presidente do colegiado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Ou seja, será possível saber como cada senador votou.
"Na terça-feira, após a apresentação dos votos em separado, após ser encerrada a discussão, a votação do relatório será feita de forma ostensiva e nominal pelas senhoras e senhores senadores membros desta CPI", disse.
O quórum e a eventual aprovação do documento de Renan serão por maioria simples. Os votos serão registrados pelo sistema eletrônico do Senado.
Confirmado o aval ao documento, as sugestões do relator serão encaminhadas aos órgãos de fiscalização e controle, sobretudo o Ministério Público Federal, por meio da Procuradoria-Geral da República, e o Ministério Público dos estados (com foco no Distrito Federal e em São Paulo, onde já existem investigações em andamento).
Relatórios paralelos
Senadores governistas pretendem apresentar relatórios paralelos ao de Renan como forma de se opor às conclusões e sugestões de indiciamentos do colega
Pelo menos Marcos Rogério (DEM-RO), Luis Carlos Heinze (PP-RS) e Eduardo Girão (Podemos-CE), que se diz independente, devem ler um resumo de seus textos na sessão de terça e entregá-los à comissão.
Marcos Rogério disponibilizou ontem seu parecer, que conclui não haver evidências sobre atos e omissões ilegais praticadas por autoridades e servidores do governo federal no enfrentamento à pandemia e, por isso, não sugere indiciamentos.
O documento ainda traz críticas à CPI — Rogério diz que houve dificuldade de acesso a documentos sigilosos, tratamento duro dado a advogados de depoentes e "ameaças de prisão e prisão ilegal".
Embora alguns convocados tenham tido a prisão cogitada na CPI, o ex-diretor de logística do Ministério da Saúde Roberto Dias foi o único detido, por algumas horas, após mentir ao colegiado em 7 de julho. A prisão dele foi anulada pela Justiça Federal em Brasília.
Marcos Rogério ainda reclamou da falta de uma investigação aprofundada de suspeitas de corrupção envolvendo verba federal em estados e municípios.
Este também deve ser o enfoque do relatório paralelo de Eduardo Girão, autor de um dos dois requerimentos que levaram à criação da CPI da Covid — o outro foi o senador Randolfe.
A CPI da Covid se debruçou mais sobre o Amazonas e o Distrito Federal, tanto por motivações políticas de senadores na comissão como pelas suspeitas estarem mais ligadas a apurações já em andamento no âmbito federal.
Alguns governadores chegaram a ser convocados, mas, após decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que acabou desobrigando o governador do Amazonas, Wilson Lima, de comparecer, o entendimento foi estendido aos demais mandatários estaduais.
Já Luis Carlos Heinze deve se debruçar em seu parecer, como fez ao longo dos trabalhos da comissão, na defesa de medicamentos que compõem o kit covid, como cloroquina e ivermectina — ineficazes contra a covid-19.
O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) escreveu um relatório à parte e o protocolou na CPI em 15 de outubro. Isso porque ele considerou haver pontos com viés político, e não técnico, no texto oficial de Renan — que já levou em consideração alguns pontos defendidos pelo colega. Ainda assim, não está descartado que Alessandro apresente um voto em separado.
Relatórios sobre os estados
A senadora Soraya Thronicke (PSL-MS) elaborou um relatório focado em suspeitas de irregularidades em Mato Grosso do Sul com base em documentos recebidos pela CPI. No entanto, seu texto servirá como complemento ao de Renan, informou a assessoria da congressista, e não trata das questões gerais investigadas pela comissão.
O mesmo deverá ser feito pelos senadores Izalci Lucas (PSDB-DF) e Eduardo Braga (MDB-AM) em relação a suspeitas no Distrito Federal e no Amazonas, respectivamente.
Lira decide sobre impeachment
Parte do relatório final da CPI será enviada à Presidência da Câmara dos Deputados, a quem caberá analisar a sugestão de punir Bolsonaro por crimes de responsabilidade cometidos durante a pandemia.
Arthur Lira (PP-AL), que comanda a Câmara, decidirá se acata ou não os argumentos apresentados para a abertura de um processo de impeachment — cenário improvável neste momento, pois o governo conta com o apoio dos deputados do "centrão". Além disso, Lira já se manifestou contrário ao pedido.
CPI não indicia, e sim sugere o indiciamento
O relatório final a ser votado pela CPI contém as principais conclusões da comissão, que durou seis meses, sugestões de aprofundamento de investigações e recomendações de indiciamento. A ideia de parte dos senadores é criar um observatório para acompanhar as consequências do trabalho do colegiado.
A CPI não tem prerrogativa constitucional para punir ninguém. Segundo o artigo 58 da Constituição Federal, a comissão tem "poderes de investigações próprios das autoridades judiciais" para "apuração de fato determinado e por prazo certo" (90 dias prorrogáveis por mais 90).
Papel do Ministério Público
Caberá ao Ministério Público promover a "responsabilidade civil ou criminal dos infratores" se concluir que há elementos mínimos que justifiquem o processo e o eventual oferecimento de denúncia.
Caso um investigado tenha foro privilegiado em âmbito federal, situação que inclui o presidente da República, por exemplo, o foro proporcional é o STF.
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