Topo

Esse conteúdo é antigo

Ex-juíza de Haia crê em punição de Bolsonaro: 'justiça tarda mas não falha'

Colaboração para o UOL

21/10/2021 11h57Atualizada em 21/10/2021 18h15

A ex-juíza do Tribunal Penal Internacional de Haia Sylvia Steiner, única brasileira que já atuou na corte, afirmou que é "otimista" e acredita que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) será punido por supostos crimes cometidos durante a gestão da pandemia da covid-19.

Ao UOL Entrevista, Sylvia traçou paralelos entre o mandatário do Brasil e o ex-presidente do Sudão, Omar al-Bashir, que foi condenado por crimes de guerra e contra a humanidade. "Falaram que ele (al-Bashir) nunca seria preso e, ao sair do cargo, ele está hoje preso no Sudão. A justiça tarda, mas não falha", falou.

A leitura do relatório da CPI da Covid, na quarta-feira (20), sugere que Bolsonaro seja indiciado por nove crimes. Para ela, "há provas suficientes para instauração de ação penal por crimes comuns e contra humanidade".

Julgamento em Haia

Sylvia reforçou que tudo dependerá do Tribunal, mais especificamente do novo procurador de Haia, examinar e acatar o relatório da CPI da Covid e, junta ou separadamente, outras duas denúncias contra Bolsonaro por genocídio.

Se a decisão do procurador for de escolher casos emblemáticos, acho que o nosso se encaixa. Não trata só de má gestão de saúde pública, mas utilização de estruturas do Estado para atingir determinadas populações. Se eu fosse escolher critério emblemático, esse é bastante para ser selecionado para investigação no Tribunal".
Sylvia Steiner

Sobre o processo de julgamento, a ex-juíza explicou que o Tribunal julga apenas pessoas e não impõe sanções ao país. "São processos que duram em média de 3 a 5 anos. Se há condenação, é pena de prisão de até 30 anos, dependendo do crime. Em excepcionalidade, é possível aplicar prisão perpétua", disse.

Assim, ela acha improvável que, "pela seriedade das acusações", o processo contra Bolsonaro, caso seja aceito para julgamento do Tribunal, se conclua enquanto ele ainda esteja no cargo de presidente.

Genocídio

Falar em genocídio, de forma generalizada e sem especificar as populações indígenas, pode não convencer em julgamento, segundo a análise de Sylvia.

A ex-juíza compreende a questão do genocídio viável "se juntarmos todos os aspectos de política anti-indigenistas implantados nesse governo, como medidas contra meio ambiente e falta de demarcação de terra".

O crime contra humanidade, resumindo, é a política utilizada para atingir parte da população civil. Pode ser ataque armado ou ataque por discriminação, pelas omissões que verificamos, descumprimento de decisões do STF [Supremo Tribunal Federal], mas faltou o que chamamos de elemento especial, que é a intenção de eliminar aquela população por essas condutas".
Sylvia Steiner

Análise nacional

Dentro do Brasil, o relatório da CPI da Covid será enviado para a PGR (Procuradoria-Geral da República), cujo chefe é Augusto Aras, e à Câmara dos Deputados, liderada por Arthur Lira (PP-AL).

Caso seja comprovado crime de responsabilidade na Câmara, deveria ser indicada a abertura de impeachment contra Bolsonaro. Mas, pela proximidade entre o presidente da República e Lira, críticos do governo não acreditam nessa possibilidade.

Segundo a ex-juíza, é urgente alterar a regra de que pedidos de impeachment sejam apreciados apenas pelo presidente da Câmara. O mesmo vale para a PGR: "Não se pode conceber que a iniciativa exclusiva de ação penal contra o presidente e ministros fique nas mãos de uma pessoa só, tem que ser no mínimo em um colegiado".