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Bolsonaro ignora fake news e prega liberdade na internet em evento de Biden

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, em Brasília

10/12/2021 14h09Atualizada em 10/12/2021 15h41

Em discurso gravado e exibido na Cúpula Pela Democracia, evento capitaneado pelo governo americano do democrata Joe Biden, o presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou hoje (10) que a sua gestão trabalha para "forjar uma cultura de diálogo, liberdade e inclusão social".

Com um amplo histórico de acusações de promoção de mentiras e compartilhamento de notícias falsas nas redes sociais, o governante defendeu em seu discurso o respeito às "liberdades" individuais, de pensamento, associação e expressão, "inclusive na internet".

Bolsonaro não mencionou, por outro lado, o problema das fake news e dos casos de ofensas, calúnias e ameaças dirigidas a terceiros —crimes que têm mobilizado discussões em vários níveis da sociedade, em especial no Congresso Nacional e na cúpula do Judiciário.

Nos últimos dez anos, o Brasil foi o país da América Latina que mais regrediu em termos de liberdade de expressão, com campanhas de desinformação chanceladas pelo governo federal e ataques à imprensa que não eram vistos desde a ditadura militar (1964-1985).

A avaliação foi feita pela ONG Artigo 19, que publicou em julho de 2021 o Relatório Global de Expressão com dados de 2020 relativos a 161 países. Reportagem do UOL Confere com base nos dados coletados pela organização mostrou que o Brasil ficou em 86º lugar no ranking, sendo o país latino-americano que mais perdeu pontos frente ao relatório de 2019.

Pelo segundo ano consecutivo, foi observado como um local "restrito" à liberdade de expressão, classificação observada pela ONG como um alerta à democracia.

O vídeo com o discurso do presidente brasileiro é exibido na Cúpula Pela Democracia um dia depois de ele voltar a fazer críticas diretas ao ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), responsável por investigações em inquéritos relacionados a denúncias de fake news e organização de atos com pautas antidemocráticas (como intervenção militar e outras).

Ontem (9), em solenidade para comemorar o Dia Internacional Contra a Corrupção, Bolsonaro também criticou as engrenagens do Judiciário brasileiro e defendeu de forma entusiástica aliados que foram punidos pelo STF, como o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) —o parlamentar ficou preso por sete meses depois de publicar nas redes sociais vídeo com mensagens ofensivas e intimidatórias contra o ministro Edson Fachin.

"Doeu no coração ver um colega preso", disse, sem citar nomes. Silveira estava presente no evento.

"Temos aqui um parlamentar que ficou sete meses preso. Se coloquem no lugar dele", afirmou Bolsonaro. "Mas o que fazer? Será que queriam que eu tomasse medidas extremadas? Como é que ficaria o Brasil perante o mundo? Possíveis barreiras comerciais, problemas internos."

'Direito de se expressar e ser ouvido', prega Bolsonaro

No discurso exibido durante a Cúpula Pela Democracia, disse hoje Bolsonaro:

"Temos trabalhado com determinação para forjar uma cultura de diálogo, liberdade e inclusão social. Estamos empenhados em assegurar as liberdades de pensamento, associação e expressão, inclusive na internet."

"Algo essencial para o bom funcionamento de uma democracia saudável. Valorizamos o direito de todos de expressarem as suas opiniões e de serem ouvidos."

O presidente brasileiro também "reafirmou determinação em proteger e respeitar os direitos humanos e as liberdades fundamentais de todos os brasileiros, independentemente da origem, raça, sexo, cor, idade ou religião, sem qualquer forma de discriminação".

"A proteção dos direitos humanos é um valor inerente ao governo brasileiro e orientador de todas as nossas políticas públicas e programas sociais. A criação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos é resultado desse compromisso".

Alguns pontos abordados por Bolsonaro no discurso haviam sido antecipados em texto do colunista do UOL Josias de Souza, publicado na manhã de hoje. Segundo o jornalista, que teve acesso a documento do Itamaraty enviado à Casa Branca, "o governo brasileiro acusa a imprensa profissional de propagar inverdades e defende a liberdade de expressão na internet".

"A dificuldade de Bolsonaro de se exprimir não o credencia como defensor da liberdade de expressão. Ele é investigado no STF e no TSE por propagar mentiras. Empresas de tecnologia excluem rotineiramente conteúdo tóxico despejado por Bolsonaro nas redes sociais. O ministro Alexandre de Moraes acaba de inaugurar um inquérito sobre a live em que Bolsonaro associou a vacina anti-Covid ao vírus da Aids."