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Sergio Moro processa jornalista que o xingou de 'corrupto' no Twitter

Sergio Moro processa, na Justiça do Paraná, Glenn Greenwald, jornalista que coordenou série de reportagens sobre a Operação Lava Jato - Alexandre Meneghini/Reuters
Sergio Moro processa, na Justiça do Paraná, Glenn Greenwald, jornalista que coordenou série de reportagens sobre a Operação Lava Jato Imagem: Alexandre Meneghini/Reuters

Weudson Ribeiro

Colaboração para o UOL, em Brasília

31/03/2022 19h58

Depois de o Twitter ter sinalizado que, em descumprimento a uma decisão da Justiça do Paraná, não apagaria publicações em que o jornalista e advogado norte-americano Glenn Greenwald chama o ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro de "corrupto", a defesa do político decidiu protocolar nova ação na 17ª Vara Cível do Estado —desta vez, a petição tem como alvo Greenwald, e não mais a plataforma.

Ao todo, a defesa de Moro pede a exclusão de sete tweets em que o jornalista critica o ex-juiz.

Em nota ao UOL, a defesa de Moro disse que "desde o fim da Operação Lava Jato o descumprimento de decisões judiciais no país" tem se tornado "frequente" e afirmou que o Twitter se negou a cumprir decisão judicial proferida no início do mês para apagar os tweets de Glenn.

"É inusitado que o Twitter, mesmo depois de notificado formalmente, tenha se negado a cumprir determinação da Justiça para excluir publicações ofensivas do jornalista Greenwald contra Moro. O autor dos ataques contra Moro também tomou conhecimento, comentou e, igualmente, não cumpriu voluntariamente a decisão", disse.

Ao UOL, Glenn Greenwald afirmou que tomou conhecimento sobre o processo contra o Twitter por meio da mídia e disse que ainda não foi notificado sobre nova a representação, que o tem como alvo.

"Esse processo é nada menos que a tentativa [de Moro] de censurar um jornalista que quer criticá-lo. Como um político, ele é uma pessoa pública. Moro faz exatamente o que acusou o presidente Jair Bolsonaro [PL] de fazer. Ele não está só tentando me censurar, mas também intimidar qualquer outro jornalista que o chame de corrupto", disse Glenn. "Esse é o tipo de censura que uma democracia não pode tolerar."

Twitter diz que não vai se manifestar

Procurado pela reportagem, o Twitter afirmou que não se manifestaria sobre o caso. Em resposta à Justiça do Paraná, segundo documentos aos quais o UOL teve acesso, a plataforma recomendava que a ação fosse redirecionada pela defesa de Moro a Greenwald, que é o autor dos tweets.

"Tem-se pleno conhecimento do usuário responsável pela publicação do conteúdo reputado ilícito, Glenn Greenwald. Dessa forma, toda e qualquer ordem de remoção de conteúdo reputado ilícito deveria ter sido direcionada exclusivamente a ele", diz a plataforma na ação.

"No presente caso, não se revelam presentes a necessidade e utilidade da tutela jurisdicional direcionada ao Twitter", conclui o Twitter.

Justiça e defesa querem exclusão de 7 tweets

Após a primeira decisão, em que a Justiça do Paraná determinou a exclusão de uma mensagem de 28 de fevereiro, em que Glenn responde a um tweet de Moro chamando-o de corrupto, Greenwald desferiu uma série de críticas contra Moro.

Em uma das publicações, o jornalista destaca o fato de o ex-juiz ter sido pré-candidato à Presidência da República.

"Ele corre a um tribunal para exigir a censura das declarações de um jornalista. O fato de Moro ser um autoritário está estabelecido há muito tempo. Moro também é um covarde: ao invés me processar, e assim me permitir defender a declaração, ele preferiu apenas processar o Twitter", escreveu.

Considerando que as seis novas publicações de Glenn inserem-se nos mesmos fundamentos da primeira decisão, o juiz Austregésilo Trevisan, da 17ª Vara Cível de Curitiba, estendeu os efeitos da determinação inicial e deu 24 horas, sob pena de multa diária de R$ 10.000 para que o Twitter apagasse os posts. O prazo expirou hoje e os tweets continuam expostos na plataforma.

"Não cabe ao Twitter efetuar qualquer juízo de necessidade e utilidade da ordem judicial emanada por este juízo, devendo limitar-se ao seu estrito cumprimento. Assim, ante o descumprimento injustificado da decisão liminar, tem incidência a multa diária estipulada", escreveu Trevisan.

'Não é censura', diz defesa

Na petição protocolada na Justiça do Paraná, a defesa de Sergio Moro diz que a solicitação para que os tweets de Greenwald sejam deletados não se trata de censura.

"A liberdade de imprensa e do jornalismo é direito e princípio relevantíssimo não somente para Moro, mas também para a sociedade. A mácula à honra, contudo, não merece permanecer online nas redes sociais de Glenn que, agindo por vindita pessoal, indistintamente faz acusações despropositadas e xingamentos diretos à pessoa de Moro —totalmente desprovido de prova", diz.

De acordo com os advogados responsáveis pelo pedido, a pretensão de Moro é evitar a perpetuação de ofensa a seus direitos a imagem e honra.

"Não fosse suficiente a reincidência de Glenn na ilegal atribuição da pecha de 'corrupto' a Moro, ele passou a desafiar a autoridade da Justiça do Paraná e do Poder Judiciário como um todo, dizendo que não só não apagará o tweet cuja remoção foi determinada como que agora suas mentirosas manifestações deixarão de ser feitas apenas no Twitter", disse a defesa de Moro.

Glenn: Relação com A&M 'prova' corrupção de Moro

Ao UOL, Greenwald voltou a dizer que acredita na suposta corrupção de Moro e lembrou que o TCU (Tribunal de Contas da União) investiga as relações do ex-juiz com a consultoria norte-americana Alvarez & Marsal.

"Moro tem chamado Lula e Bolsonaro de corruptos, apesar do fato de que nenhum dos dois foram condenados de forma válida por corrupção. A evidência da corrupção política de Moro é esmagadora: ele recebeu lucro trabalhando como consultor numa companhia norte-americana que representa empresas implicadas na Lava Jato", disse.

Empresa que contratou Moro depois de o ex-juiz deixar o Ministério da Justiça em 2020, a A&M recebeu ao menos R$ 65,1 milhões de empresas envolvidas na operação Lava Jato. Esse valor é 78% de todo o faturamento por administração judicial que a companhia alega ter tido de 2013 a 2021.

Em nota, Moro disse que nunca prestou serviços a empresas envolvidas na Lava Jato: "Meu contrato era com a A&M disputas e investigações, e não com a parte da empresa responsável por recuperações judiciais, que tem outro CNPJ e cujas fontes de receita são diferentes".

Ao UOL, a Alvarez & Marsal afirmou que Moro foi contratado para compor uma unidade da empresa que não teve resultado incrementado por conta de projetos de reestruturação: "A A&M prestou todos os esclarecimentos solicitados pelo TCU de forma tempestiva e colaborativa, sendo que o parecer técnico do TCU demonstrou não haver nenhum tipo de conflito".

Glenn coordenou 'Vaza Jato'

Greenwald é jornalista e advogado. Ele, no Brasil, coordenou uma série de reportagens críticas à atuação da Lava Jato - Laycer Tomaz / Câmara dos Deputados - Laycer Tomaz / Câmara dos Deputados
Greenwald é jornalista e advogado. Ele, no Brasil, coordenou uma série de reportagens críticas à atuação da Lava Jato
Imagem: Laycer Tomaz / Câmara dos Deputados

O jornalista Glenn Greenwald coordenou, no site Intercept Brasil, a série de reportagens conhecida como "Vaza Jato", que revelou troca de mensagens entre Moro e procuradores da Lava Jato.

Em fevereiro deste ano, o presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), ministro Humberto Martins, decidiu arquivar inquérito que apurava se procuradores da operação comandada por Moro em Curitiba tentaram intimidar e investigar ilegalmente os ministros do tribunal.

Na avaliação de Martins, não ficou configurada a existência de condutas criminosas por parte dos procuradores.

Segundo as conversas, integrantes da força-tarefa em Curitiba discutiam pedir à Receita Federal uma análise patrimonial dos ministros que compõem as turmas criminais do STJ, sem autorização prévia do STF.

Após o arquivamento, o ex-juiz comemorou. "A grande verdade é que com todo o circo da Farsa Jato, eles nunca conseguiram demonstrar que um inocente sequer foi condenado na Lava Jato ou que alguém foi incriminado injustamente", disse o ex-ministro.

O inquérito foi instaurado por Martins em fevereiro do ano passado com base nos diálogos divulgados pelo Intercept.