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Carolina Brígido

REPORTAGEM

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Inquérito contra Lava Jato provoca conflito entre STF e STJ

Humberto Martins, presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça) - José Cruz/ABr
Humberto Martins, presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Imagem: José Cruz/ABr

Colunista do UOL

09/04/2021 04h00

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Dois quilômetros separam o STF (Supremo Tribunal Federal) do STJ (Superior Tribunal de Justiça) em Brasília. Hoje, é como se um muro tivesse sido erguido entre as duas Cortes. Ministros do STJ ouvidos pela coluna estão revoltados com a ministra Rosa Weber, do STF - que, na semana passada, suspendeu a tramitação de um inquérito polêmico aberto pelo presidente do tribunal vizinho, Humberto Martins. Foi dele a decisão de mandar apurar suposta tentativa de intimidação e investigação ilegal de ministros da Corte por ex-procuradores da Lava Jato.

Um ministro do STJ disse à coluna que a decisão de Rosa Weber humilhou o tribunal. "Esse inquérito é, na visão da maioria dos ministros, imprescindível. Pelas notícias que tivemos, houve tentativa de pressão de alguns ministros e isso precisa ficar esclarecido. A lógica que permeou o inquérito das fake news (do STF) é de que era preciso preservar a independência dos ministros. A lógica é a mesma para o inquérito do STJ. Não tem sentido garantir a independência do julgador no Supremo e não garantir no STJ. A decisão da ministra Rosa Weber apequenou o STJ", reclamou.

Martins determinou a abertura do inquérito sozinho, sem que a Procuradoria-Geral da República (PGR) tivesse solicitado. Até aí, nada diferente do que o STF fez há dois anos, quando o então presidente, Dias Toffoli, mandou abrir inquérito para apurar fake news e ataques contra os ministros do Supremo.

No comparativo entre os dois inquéritos, há uma diferença crucial: Toffoli delegou a relatoria ao ministro Alexandre de Moraes. No STJ, Martins entregou a tarefa a si mesmo. O presidente do STJ, por acaso, foi um dos alvos dos procuradores da Lava Jato. Isso irritou ministros do STJ, que preferiam ver o caso conduzido por alguém sem interesses pessoais nas investigações.

Outro fator de desaprovação entre ministros da Corte é que Martins anunciou que determinaria diligências no inquérito, como buscas e apreensões, antes de ter tomado as providências. No Supremo, Moraes ganhou o respeito dos colegas por conduzir o caso das fake news de forma assertiva, sem dar declarações públicas sobre o assunto. A comparação rendeu a Martins a alcunha de "Alexandre de Moraes de Sucupira" entre os colegas do STJ.

"O presidente (do STJ) errou na mão. Ele deveria ter designado outro ministro como relator. Ele falou demais antes de agir. Foi o contrário do Alexandre de Moraes, que agiu e não falou nada", comentou um integrante do STJ.

A decisão de Rosa Weber será levada ao plenário do Supremo para julgamento. Ministros do STJ têm conversado com integrantes do Supremo para tentar negociar uma solução para pacificar o ânimo entre as duas cortes. A bandeira branca seria erguida se o plenário do STF autorizasse a retomada do inquérito contra os ex-procuradores da Lava Jato. Em troca, o presidente do STJ se comprometeria a entregar a relatoria do caso para outro ministro.

Nos bastidores do STF, a expectativa é de que esse julgamento dividirá o plenário. A interlocutores, o próprio Moraes indicou que não vê problemas com a tramitação do inquérito no STJ. Gilmar Mendes estaria no mesmo time. Por outro lado, Luís Roberto Barroso comentou com pessoas próximas que votaria pela suspensão do inquérito do STJ.

O argumento técnico para frear as investigações do STJ é o de que o Regimento interno do tribunal, que prevê a abertura de inquéritos sem pedido da PGR, não tem força de lei. Enquanto isso, a norma interna do Supremo, que diz o mesmo, tem status de lei. Esse detalhe jurídico pouco importa. Para ministros do STJ, se o Supremo mantiver a decisão de Rosa Weber, vai alimentar a guerra entre as duas cortes.