Toffoli rejeita pedido de Bolsonaro para investigar Moraes no STF
O ministro Dias Toffoli, do STF (Supremo Tribunal Federal), rejeitou nesta quarta-feira (18) a ação movida pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) contra o ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news. Em sua decisão, o ministro afirmou que nenhum dos atos do magistrado apontados por Bolsonaro constitui crime.
"Os fatos descritos na 'notícia-crime' não trazem indícios, ainda que mínimos, de materialidade delitiva, não havendo nenhuma possibilidade de enquadrar as condutas imputadas em qualquer das figuras típicas apontadas", disse Toffoli.
- Leia a íntegra da decisão de Toffoli.
O ministro afirmou ainda que as alegações apresentadas pelo presidente da República também não têm o "condão de tornar Moraes suspeito", ou seja, impedido de votar ou participar de julgamentos ligados a Bolsonaro, e que decisões e atos adotados no inquérito das fake news já teriam sido apreciados pelo plenário do Supremo.
De fato, o Estado democrático de Direito impõe a todos deveres e obrigações, não se mostrando consentâneo com o referido enunciado a tentativa de inversão de papéis, transformando-se o juiz em réu pelo simples fato de ser juiz"
Dias Toffoli, ministro do STF
Bolsonaro apresentou ontem uma queixa-crime contra Moraes no STF acusando o ministro de abuso de autoridade na condução do inquérito. Em cinco pontos, o presidente diz que a investigação é "injustificada" e critica o sigilo da apuração.
Dentro do STF, o arquivamento da ação movida por Bolsonaro já era esperado, independentemente de qual ministro que fosse sorteado relator da ação. A ação, porém, caiu com Toffoli, que foi o responsável por instaurar o inquérito das fake news em 2019 e distribuir a investigação a Moraes.
Internamente, os ministros avaliavam que não havia chance do processo de Bolsonaro contra Moraes prosperar.
Mais cedo, o presidente do STF, Luiz Fux, saiu em defesa de Moraes, afirmando que o magistrado conduz com "extrema seriedade e competência" o inquérito das fake news.
Desde 2019, também o ministro Dias Toffoli, para enfrentar não só a desinformação, mas digamos assim, verdadeiros ataques ao STF, ele instaurou aqui o inquérito que esteve e está em ótimas mãos na relatoria de Vossa Excelência, ministro Alexandre de Moraes, que tem conduzido os trabalhos com extrema seriedade e competência, que reconheço em público"
Luiz Fux, presidente do STF
Ao falar sobre a investigação, Fux não citou Bolsonaro ou a nova investida do Planalto contra o Supremo, mas destacou a competência de Moraes e a necessidade do sigilo na investigação para garantir os trabalhos de investigação. Moraes acompanhou o discurso ao lado de Fux.
"Muitos talvez não saibam, mas é importante que se tenha a exata noção de como esse trabalho do inquérito é importante para o STF, no qual veio a lume notícias de atos preparatórios de terrorismo contra o Supremo Tribunal Federal", disse Fux. "Daí a necessidade de ter sido o processo sigiloso, de ter algumas notícias serem fornecidas desta maneira genérica."
Instaurado em 2019 e conduzido por Moraes, o inquérito das fake news se tornou uma fonte de eterna preocupação no Palácio do Planalto. Inicialmente mirando aliados bolsonaristas, a investigação englobou o próprio Bolsonaro no ano passado após o presidente fazer uma live afirmando que apresentaria provas de "supostas fraudes" nas urnas.
A transmissão, porém, apenas divulgou boatos já desmentidos pelo TSE, que apresentou uma queixa contra Bolsonaro a Moraes. O ministro incluiu o presidente no inquérito em agosto de 2021.
Bolsonaro acusou Moraes de "abuso de autoridade"
A ação movida por Bolsonaro contra Moraes é uma nova escalada do presidente contra o ministro, que no próximo semestre presidirá o TSE (Tribunal Superior Eleitoral). O presidente acusava Moraes de cometer "abuso de autoridade" na condução do inquérito.
A primeira razão seria a "injustificada investigação no inquérito das fake news, quer pelo seu exagerado prazo, quer pela ausência de fato ilícito". O presidente passou a ser investigado depois de colocar em dúvida a segurança do processo eleitoral em live realizada em julho de 2021.
O segundo seria o fato de o ministro "não permitir que a defesa tenha acesso aos autos" do processo, que está em segredo de Justiça. A terceira alegação da defesa de Bolsonaro é que "o inquérito das fake news não respeita o contraditório".
O quarto motivo apontado é que Moraes teria decretado, contra outros investigados no processo, medidas cautelares que não estão previstas no Código de Processo Penal, contrariando o Marco Civil da Internet.
Por último, a defesa diz que, mesmo depois de a PF ter concluído que Bolsonaro não teria cometido crime em sua live, em que questionou a segurança das urnas eletrônicas, Moraes "insiste em mantê-lo como investigado".
Escalada em ataques
A ação de Bolsonaro contra Moraes vem na esteira de uma escalada constante de ataques do Planalto contra o ministro. No ano passado, durante manifestação com teor golpista no feriado de 7 de Setembro, o presidente chamou Moraes de "canalha" e disse que não iria cumprir decisões proferidas pelo magistrado.
"Dizer a vocês, que qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou, ele tem tempo ainda de pedir o seu boné e ir cuidar da sua vida. Ele, para nós, não existe mais", disse Bolsonaro a apoiadores, na Avenida Paulista. "Dizer a esse ministro que ele tem tempo ainda para se redimir, tem tempo ainda de arquivar seus inquéritos. Sai, Alexandre de Moraes. Deixa de ser canalha".
Relator não somente do inquérito das fake news, Moraes também é o relator de outras investigações que miram aliados do Planalto, como o das milícias digitais antidemocráticas e a live em que o presidente associou a vacina contra covid-19 ao HIV.
O ministro também foi o responsável pelo voto da maioria que condenou o deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) a oito anos e nove meses de prisão por ameaças a integrantes do tribunal.
A atuação " linha-dura" de Moraes nos inquéritos desperta sinal de alerta no Planalto, especialmente quando o ministro assumir a presidência do TSE, em agosto. É dado como certo que o estilo de Moraes no Supremo deverá ser o mesmo no comando da Corte Eleitoral.
No ano passado, em outra tentativa frustrada de atacar o ministro, Bolsonaro protocolou um pedido de impeachment contra Moraes no Senado, em uma iniciativa inédita. Assim como na ação movida anteontem no Supremo, o Planalto acusava o ministro de agir como "ator político" e criticava as decisões do magistrado nas investigações. O pedido, porém, foi arquivado pelo presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
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