STF adia mais uma vez julgamento sobre marco temporal de terras indígenas
O STF (Supremo Tribunal Federal) adiou mais uma vez o julgamento do chamado marco temporal para demarcação de terras indígenas. O recurso estava previsto para ser discutido no plenário no próximo dia 23, mas foi retirado de pauta pelo presidente da Corte, ministro Luiz Fux. A retomada do caso segue sem nova data.
Em nota, o tribunal informou que o julgamento foi retirado da pauta por "consenso entre os ministros".
No ano passado, o julgamento foi suspenso em duas ocasiões. A primeira foi em junho, quando o ministro Alexandre de Moraes retirou a discussão do plenário virtual e a enviou para o plenário físico. A segunda ocorreu em setembro, quando Moraes pediu vista (mais tempo de análise). O processo foi liberado pelo ministro em outubro.
A discussão tem sido acompanhada de perto tanto pelo Planalto quanto por lideranças indígenas, uma vez que a decisão do Supremo será de repercussão geral — ou seja, deverá ser seguida por todos os outros juízes do país ao avaliar casos semelhantes.
Em jogo está a tese do chamado marco temporal. Segundo ela, os povos tradicionais só poderiam reivindicar terras que ocupavam à época da promulgação da Constituição, em outubro de 1988.
Até o momento, o placar segue empatado em 1 a 1. O relator, ministro Edson Fachin, se posicionou contra um marco temporal para determinar se indígenas podem ou não reivindicar as terras, já que se trata de um direito fundamental destes povos.
"Autorizar, à revelia da Constituição, a perda da posse das terras tradicionais por comunidade indígena, significa o progressivo etnocídio de sua cultura, pela dispersão dos índios integrantes daquele grupo, além de lançar essas pessoas em situação de miserabilidade e aculturação", defendeu o ministro.
A divergência foi aberta pelo ministro Nunes Marques, indicado do presidente Jair Bolsonaro (PL) à Corte. Para ele, a tese do marco temporal "é a que melhor concilia os interesses em jogo" no tema e que as terras indígenas não podem ser demarcadas com base em "esbulhos ancestrais", ou seja, em desapropriações impostas aos indígenas em tempos remotos.
"Por um lado, admite-se que os índios remanescentes em 1988, e suas gerações posteriores, têm direito à posse de suas terras tradicionais, para que possam desenvolver livremente o seu modo de vida. Por outro, procura-se anistiar oficialmente esbulhos ancestrais, ocorridos em épocas distantes, já acomodadas pelo tempo e pela própria dinâmica histórica", disse.
A disputa é de grande interesse de ruralistas, uma das bases de apoio de Bolsonaro. O próprio presidente já declarou em diversas ocasiões se opor a uma decisão do STF que determine a revisão do marco temporal.
"[Se a revisão do marco temporal for aprovada] Acabou nossa economia, nossa segurança alimentar. Não é ameaça, é uma realidade. Só me sobra uma alternativa, ou melhor, duas alternativas. Pegar as chaves da Presidência e me dirigir ao presidente do Supremo Tribunal Federal e falar 'administra o Brasil'. Ou, a outra alternativa, não vou cumprir", afirmou Bolsonaro na sexta-feira passada (27).
Em janeiro, o presidente disse que Fachin "votou contra o Brasil" ao se posicionar contra o marco temporal. Em outra ocasião, afirmou que o ministro André Mendonça, também indicado pelo Planalto à Corte, votaria contra a tese.
Entenda o caso
A decisão do STF terá repercussão geral, ou seja, servirá para solucionar disputas sobre o tema em todas as instâncias da Justiça no país. A disputa opõe ruralistas, apoiados por Bolsonaro, e mais de 170 povos indígenas, que enviaram cerca de 6.000 representantes a Brasília para acompanhar o julgamento, segundo a Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).
O processo trata de uma briga judicial de 12 anos entre o governo de Santa Catarina e indígenas do povo xokleng, que reivindicam um território na região central do estado. Em janeiro de 2009, cerca de cem deles ocuparam uma área onde hoje está a reserva biológica do Sassafrás, uma área de proteção ambiental.
Por essa razão, a Fatma, órgão ambiental catarinense à época, pediu reintegração de posse na Justiça. A ordem foi concedida em primeira instância e confirmada pelo TRF4 (Tribunal Regional da 4ª Região), em Porto Alegre. A Funai (Fundação Nacional do índio), então, recorreu da decisão do TR4, e o caso chegou ao Supremo no final de 2016.
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