Entenda as suspeitas contra Milton Ribeiro, preso pela PF
Um esquema para liberação de verba coordenado por dois pastores sem cargos públicos que envolveu até suspeita de propina em ouro está no centro das denúncias que, na manhã de hoje, culminaram em uma operação da Polícia Federal que prendeu Milton Ribeiro, ex-ministro da Educação do governo Jair Bolsonaro (PL).
De acordo com as primeiras denúncias, publicadas pelo jornal O Estado de S. Paulo, prefeitos relataram a existência de um balcão de negócios no MEC (Ministério da Educação) tocado pelos pastores Gilmar Santos —também preso na operação de hoje— e Arilton Moura.
No esquema, a liberação de verba pública ganhava prioridade se os gestores fossem indicados pelos religiosos e pelo Centrão, conjunto de partidos que apoia o governo Bolsonaro e que administra o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação).
Ribeiro nega as denúncias (leia abaixo).
Quem são os pastores?
Moura é braço direito de Santos e assessor de assuntos políticos da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil. Gilmar Santos, que preside a convenção, também é líder do Ministério Cristo para Todos, em Goiânia.
Quem teria aberto as portas do Executivo aos dois é o deputado João Campos (Republicanos-GO), pastor da Assembleia de Deus Ministério Vila Nova.
Já em 2019, a dupla foi recebida por Bolsonaro duas vezes. Pelo menos desde janeiro de 2021, eles negociariam diretamente com prefeituras a liberação de verbas para a construção de creches, escolas, quadras e fornecimento de tecnologia para educação.
Como o ministro caiu?
Apesar da pressão política que as denúncias provocaram, Ribeiro só deixou o cargo em março, quando acabou pedindo demissão depois que a Folha de S.Paulo revelou um áudio em que o ex-ministro admitia que o governo priorizava as prefeituras que negociavam com os pastores. Os gestores poderiam, inclusive, retribuir a verba com a "construção de igrejas".
Ribeiro ainda afirmou na gravação que a demanda era pedido direto de Bolsonaro, que chegou a declarar que colocaria "a cara no fogo" pelo ex-ministro. Hoje, o presidente mudou o tom.
O Milton, coisa rara eu falar aqui, eu boto a minha cara no fogo pelo Milton. Minha cara toda no fogo pelo Milton."
Jair Bolsonaro, presidente
A gravação
"Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar", afirmou o ministro na conversa revelada pela Folha.
Na reunião estariam prefeitos, os dois religiosos e lideranças do FNDE. Na ocasião, o ministro falou sobre o orçamento da pasta, cortes na educação e sobre a liberação de recursos para essas obras.
Porque a minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar."
Milton Ribeiro, ex-ministro da Educação
Milton Ribeiro fala, então, em uma contrapartida: "O apoio que a gente pede não é segredo, isso pode ser [inaudível] é apoio sobre construção das igrejas".
1 kg de ouro em propina
Como desdobramento do mesmo esquema, o prefeito da cidade Luis Domingues (MA), Gilberto Braga (PSDB), disse ao Estado de S. Paulo que um dos pastores pediu R$ 15 mil e 1 kg de ouro para autorizar a liberação de verbas para obras de educação na cidade.
Já para a Folha, o prefeito de Piracicaba (SP), Luciano Almeida (União Brasil), disse que ouviu como condição para receber dinheiro a sugestão de bancar no município um evento com a presença do próprio Ribeiro em agosto do ano passado. Ao recusar o pedido, Almeida afirmou que o encontro acabou não acontecendo.
Ribeiro na Bíblia
No dia em que pediu demissão, Ribeiro admitiu no Twitter que chegou a autorizar a confecção de exemplares da Bíblia com a sua imagem para doação em um evento religioso.
Ribeiro afirmou no tuíte que desautorizou a distribuição dos livros em outros eventos, o que não aconteceu. As bíblias teriam sido distribuídas em um evento do MEC em Salinópolis, no Pará, em encontro de Ribeiro com prefeitos, secretários municipais e os pastores.
A prisão de Ribeiro
Ribeiro acabou preso hoje preventivamente pela PF, em Santos, durante a operação "Acesso Pago", cujo objetivo é justamente investigar a prática de tráfico de influência e corrupção para a liberação de recursos públicos do FNDE.
O mandado enumera os crimes de corrupção passiva, prevaricação, advocacia administrativa e tráfico de influência. Determina ainda que o ex-ministro seja levado para a Superintendência da Polícia Federal em Brasília, com audiência de custódia ainda na tarde de hoje.
A operação cumpriu 13 mandados de busca e apreensão e quatro mandados de prisão, distribuídos pelos estados de Goiás, São Paulo, Pará e Distrito Federal.
A PF abriu dois inquéritos para investigar o esquema. Um deles foi autorizado pela ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) Cármen Lúcia, que atendeu a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras.
Aras argumentou que o ex-ministro "em momento algum negou ou apontou falsidade no conteúdo da notícia veiculada pela imprensa, admitindo, inclusive, a realização de encontros com os pastores nela mencionados".
O que disse Ribeiro ao deixar o MEC?
Em sua carta de demissão, o ex-ministro nega irregularidades ao dizer ter "plena convicção de que jamais realizei um único ato de gestão na minha pasta que não fosse pautado pela correção, pela probidade e pelo compromisso com o erário".
Ele disse que deixava o ministério para preservar o governo Bolsonaro.
"Decidi solicitar ao presidente Bolsonaro a minha exoneração do cargo, com a finalidade de que não paire nenhuma incerteza sobre a minha conduta e a do Governo Federal, que vem transformando este país por meio do compromisso firme da luta contra a corrupção", escreveu.
Meu afastamento é única e exclusivamente decorrente de minha responsabilidade política, que exige de mim um senso de país maior que quaisquer sentimentos pessoais."
Milton Ribeiro, ex-ministro da Educação
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