Núcleo de projeto com cargos secretos é identificado com nome de vereador
O site oficial da Fundação Ceperj (Centro Estadual de Estatísticas, Pesquisas e Formação de Servidores Públicos do Rio de Janeiro) identificou um núcleo do projeto Esporte Presente com o nome do vereador Pedro Gadelha (Cidadania), da cidade de Casimiro de Abreu, a 132 quilômetros da capital fluminense.
O Esporte Presente é um projeto que leva núcleos para a prática de atividades esportivas a diversas regiões fluminenses. Os espaços onde ocorrem as aulas de esporte recebem os nomes de locais como bairros, praças, ruas ou escolas, o que não ocorreu no caso de Casimiro de Abreu.
O caso reforça o uso político dos projetos da Ceperj, que vem sendo negado pelo órgão. Em redes sociais, o vereador se apresenta como aliado do líder do governo Cláudio Castro (PL) na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio), o deputado Rodrigo Bacellar (PL).
Na página da Ceperj, 18 alunos aparecem vinculados ao núcleo de número 400 do projeto (cada um também tem uma identificação numérica), ligado a Gadelha. Além da identificação oficial com o nome do vereador, o UOL também apurou que pelo menos duas pessoas que aparecem como alunas do projeto esportivo no site não sabem que estão matriculadas.
A assessoria de imprensa do governo do Rio não comentou o caso e enviou uma nota em que afirma que "entregou nesta sexta-feira ao Ministério Público um TAC (Termo de Ajuste de Conduta) para corrigir as falhas e dar total transparência aos importantes programas sociais vinculados à Fundação Ceperj". "Vale ressaltar que todas as determinações dos órgãos judiciais e de controle estão sendo cumpridas".
No mês passado, após pressão do MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) e do TCE-RJ (Tribunal de Contas do Estado do Rio), a Ceperj começou a divulgar os nomes dos contratados do "Esporte Presente".
Nessa lista, que foi colocada no site da fundação, o UOL localizou o nome de Gadelha. O órgão possui pelo menos 12 outros projetos cujas contratações ainda não foram divulgadas.
No início da tarde de sexta (5), a reportagem telefonou para Gadelha, que disse desconhecer a vinculação ao núcleo.. Ele pediu que fosse enviada uma cópia da página da Ceperj para que se pronunciasse novamente —o que foi feito prontamente—, mas não houve retorno.
Em um vídeo, de 1º de agosto, publicado em sua página no Facebook, o vereador afirmou que "foi através do governo do estado, com o apoio do deputado Rodrigo Bacellar, que nós trouxemos para o nosso município o 'RJ para Todos', que fez mais de 500 atendimentos aqui na cidade".
O projeto citado por Gadelha, que dá assistência a pessoas em situação de vulnerabilidade social, também está na lista daqueles que possuem contratações através de cargos secretos da Fundação Ceperj.
Uso político
O caso do vereador reforça os indícios de uso político dos projetos do órgão. Reportagem do UOL já havia mostrado que o governo do Rio de Janeiro padronizou uma tabela para sistematizar as indicações de cabos eleitorais de candidatos a deputado estadual e federal em cargos secretos do Casa do Trabalhador, da Ceperj.
Neste caso, a ponte para as indicações passaria pelo presidente estadual do Podemos e secretário de Trabalho, Patrique Welber.
Uma outra vertente de indicações politicas teria à frente o deputado Rodrigo Bacellar. O UOL revelou que até a namorada do irmão dele, Marquinho Bacellar, recebeu mais de R$ 22 mil em dinheiro vivo através dos cargos secretos. Marquinho Bacellar (Solidariedade) é vereador em Campos dos Goytacazes, no norte fluminense.
Na quinta-feira (4), Rodrigo Bacellar fez seu primeiro pronunciamento sobre as denúncias envolvendo a Ceperj, focando principalmente em ataques à imprensa.
"A gente tem que separar o joio do trigo para que o cidadão de bem não pague a conta por espetáculos midiáticos", disse ele, no plenário da Alerj.
Reportagens que o UOL vem publicando desde maio foram a base de ação do MP-RJ que culminou esta semana com a suspensão de pagamentos na "boca do caixa" e novas contratações sem transparência da fundação.
Bacellar disse que os projetos realizados pela Ceperj têm tido impacto social no estado e afirmou que, "de dez anos para cá, nunca se viu fazer tanto pelo Rio".
"Não tenho medo de crítica, não tenho medo de imprensa, não tenho medo de porrada porque eu não sou ladrão. Se o pecado do governo é gerar emprego, é levar comida para a boca de quem precisa, me condenem. Eu prefiro ser condenado a continuar político. Não vão me ver fazendo sacanagem como fizeram muitos conterrâneos meus, levando inclusive sacolas de dinheiro para casa".
O deputado foi procurado, através de sua assessoria de imprensa, para comentar a relação com o vereador Pedro Gadelha, mas não houve retorno.
Contratações suspensas
Na semana passada, o MP-RJ entrou com uma ação contra a Ceperj, que culminou na suspensão de novas contratações e pagamentos sem transparência, onde consta uma relação com mais de 27 mil nomes de pessoas que receberam pagamentos da fundação, enviada pelo Banco Bradesco.
Foi constatado que foram realizados saques em dinheiro vivo de R$ 226,4 milhões somente nos sete primeiros meses deste ano. O volume sacado em espécie nas agências onde os funcionários recebem seus pagamentos representa 91% de tudo o que a fundação pagou a eles em 2022 (R$ 248,9 milhões).
Na quinta (4), o governador Cláudio Castro anunciou a exoneração do presidente da Ceperj, Gabriel Lopes. Na sexta (5), foi a vez de Thiago Larangeira, que comandava o CEEP (Centro de Estatísticas, Estudos e Pesquisas), setor diretamente responsável pelos cargos secretos.
O que o UOL já revelou
Em reportagem exclusiva, o UOL mostrou em junho que o governo do Rio mantém ao menos 18 mil vagas de trabalho na Ceperj sem nenhuma transparência.
Levantamento feito com dados da Secretaria Estadual de Fazenda mostrou que Cláudio Castro aumentou em 25 vezes o orçamento da fundação desde que assumiu o cargo. Somente neste ano, o incremento chegou a R$ 300 milhões até junho.
Uma planilha elaborada pela Secretaria de Trabalho implica diretamente Castro no escândalo. O documento recebeu o nome de "governador" e tratava do orçamento para 9.000 cargos secretos. Procurada, a Secretaria de Trabalho afirmou que iria apurar se houve "um erro na confecção da planilha".
Após a revelação do UOL, o governo chegou a colocar o documento sob sigilo, mas voltou atrás.
Reportagem exclusiva também mostrou que polos do programa Casa do Trabalhador, o maior dentre os que têm folhas de pagamento secretas, estão sendo controlados por pré-candidatos do Podemos, partido presidido pelo secretário de Trabalho e Renda, Patrique Welber. A pasta afirmou que "as unidades do projeto são equipamentos públicos e não têm finalidade político-partidária".
A Ceperj usou um código genérico para esconder os beneficiados em R$ 284 milhões pagos aos cargos secretos.
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