Discreta, Rosa Weber assumirá STF em período turbulento do tribunal
Marcado para o próximo dia 2 de outubro, o primeiro turno das eleições terá importância dobrada para a ministra Rosa Weber, do STF (Supremo Tribunal Federal). Além de completar 74 anos nessa data, a magistrada estará na presidência da Corte em um dos períodos mais turbulentos de sua história, sob ataques de parte do eleitorado e incerteza quanto ao futuro da democracia brasileira.
A iminente exposição pública de Weber é estranha à personalidade discreta da ministra, que não dá entrevistas e raramente faz declarações fora dos autos. Os holofotes, contudo, não são novidade para ela: em 2018, a ministra esteve duas vezes no centro das atenções, sofreu ameaças e tomou decisões cruciais para os rumos do país.
A primeira dessas ocasiões ocorreu em abril daquele ano, quando o Brasil caminhava para as eleições com uma dúvida primordial: se o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), recém-condenado em segunda instância na Operação Lava Jato, seria preso e retirado do páreo contra o então deputado do PSL Jair Bolsonaro (hoje no PL), que despontava nas pesquisas.
No final de março, quando Lula pediu ao Supremo um habeas corpus para não ir à cadeia, as cartas no tribunal estavam marcadas. Já se sabia que cinco ministros votariam a favor do petista e outros cinco negariam a petição. A única dúvida era sobre a posição de Weber.
A pressão sobre a ministra, que já vinha crescente, aumentou um dia antes do julgamento devido a uma publicação no Twitter em que o então comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, afirmou que os militares compartilhavam o "repúdio à impunidade" da população e que estavam atentos "às suas missões institucionais".
No dia seguinte, após ler um voto que teve amplo acompanhamento nas redes sociais, Weber negou o pedido de Lula e selou sua prisão, dias mais tarde. A ministra argumentou que, apesar de ser contrária à prisão em segunda instância, seguiu a orientação do tribunal, que autorizava, à época, a execução da pena nessas condições.
Os meses se passaram e, em junho, a ministra recebeu a missão de presidir o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) durante o pleito daquele ano, que oporia Bolsonaro ao ex-ministro Fernando Haddad (PT), substituto de Lula na disputa.
Desde antes do primeiro turno, Weber teve que exercer um papel que seria herdado por seus sucessores no cargo: rebater os ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral. Apesar de ter dado frequentes declarações em defesa das urnas, Weber não escapou de críticas sobre uma suposta "falta de energia" na resposta do TSE, que não cobrou provas das alegações de fraude.
Weber, todavia, teve que lidar não apenas com as falas do futuro presidente. Às vésperas do segundo turno, um eleitor enviou uma mensagem a ela afirmando que Bolsonaro já estava "matematicamente eleito" e, se perdesse, a população iria às ruas. "Experimente deixar que isso aconteça", dizia o texto à ministra.
Outro eleitor, um coronel reformado do Exército, publicou um vídeo em que chamava Weber de "salafrária" e "corrupta" por ter se reunido com representantes do PT para tratar dos supostos disparos de mensagens em massa pela campanha de Bolsonaro. Os ataques levaram a PF (Polícia Federal) a reforçar a segurança de Weber e a abrir um inquérito para apurar as ameaças.
Apoio dos colegas
Para integrantes do Supremo ouvidos pelo UOL, parte deles em caráter reservado, Rosa Weber não deverá fugir ao seu estilo após assumir o Supremo, em posse marcada para o dia 12 de setembro. A cerimônia, que originalmente seria no dia 10, foi adiada para evitar a proximidade com os atos de 7 de setembro.
Segundo os interlocutores, a ministra buscará afastar o STF do centro das discussões políticas e tentará "submergir" o tribunal durante sua gestão, que será mais breve que a dos antecessores. Como completará 75 anos em outubro de 2023, ela terá pouco mais de um ano no cargo até se aposentar compulsoriamente.
Ministros consultados pelo UOL avaliam que a postura discreta de Weber pode ser benéfica, para evitar colisões desnecessárias com o Planalto durante as eleições. Mas também é dito que a ministra, assim como o atual presidente Luiz Fux, não tem manejo político para articulações políticas, o que pode levar dificuldades à Corte.
A avaliação geral, porém, é que a seriedade dela fará bem ao tribunal.
A ministra Rosa é seríssima, discreta, extremamente competente e equilibrada. Prudente nas decisões e no uso das palavras. Considero uma sorte para o Brasil tê-la à frente do Supremo neste momento
Luís Roberto Barroso, um dos ministros mais próximos de Rosa Weber no STF
Trabalho até na praia
Pessoas próximas de Rosa Weber, em âmbito profissional e familiar, descrevem a ministra como estudiosa, austera e quase obsessiva com o trabalho. O advogado e pecuarista José Roberto Weber, irmão mais velho de Rosa, contou ao UOL que ela costumava trabalhar até na praia, durante as férias, quando ainda era juíza do trabalho no Rio Grande do Sul.
Quando ela ainda morava aqui, a gente passava os verões juntos. Íamos com a nossa mãe, os sobrinhos, minha mulher e os meus filhos. Ela levava processos para despachar na praia! Chegava com um carrinho cheio de processos. E a gente brincava: mas o que é isso? Vem para a praia para trabalhar?"
José Roberto Weber, irmão de Rosa Weber
Nascida em Porto Alegre, em 2 de outubro de 1948, Weber é filha de um médico pneumologista e de uma pecuarista. Ela é casada com Telmo Candiota da Rosa Filho, procurador aposentado do RS, e tem dois filhos, Demétrio (jornalista) e Mariana (produtora cultural).
Formada em direito pela UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), assim como o irmão, a ministra cursou o primeiro grau e o antigo ginásio em escolas tradicionais da capital gaúcha.
"Ela estudou sempre em colégios diferenciados de Porto Alegre, onde a aula era de manhã e de tarde, então não sobrava muito tempo para hobbies. Ela não tinha pendores artísticos, nem esportivos, e levava uma vida muito caseira. O negócio dela era estudar", descreve José Roberto.
Indicada por Dilma
Os irmãos foram contemporâneos na faculdade e José Roberto conta ter estudado com Ellen Gracie, primeira mulher a assumir uma cadeira no STF, décadas mais tarde. Foi justamente a vaga dela que Rosa Weber ocupou, em 2011, após ser escolhida pela então presidente Dilma Rousseff entre mais de dez candidatas.
Sabatinada pelo Senado, Weber fez algumas das raras referências sobre seu passado na audiência, em novembro daquele ano. Aos congressistas ela contou que o pai havia morrido cedo, aos 62 anos, mas que mãe, "uma gaúcha de fibra inquebrantável", não só estava bem de saúde aos 94 anos como ainda dirigia.
A mãe, Zilah Bastos Pires, morreu em janeiro último aos 104 anos. A ministra, que atuou por mais de 35 anos na Justiça do Trabalho, foi acionada por uma ex-cuidadora da mãe, que pedia mais de R$ 1 milhão em um processo trabalhista.
No ano passado, para encerrar o processo, a família fechou um acordo e aceitou pagar R$ 450 mil, com a condição de que a antiga funcionária reconhecesse que "jamais houve qualquer relacionamento dela" com Rosa e José Roberto. O UOL pediu ao gabinete da ministra que comentasse o caso, mas não teve resposta até a publicação da reportagem.
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