PT admite fragilidade parlamentar e mira governabilidade e Orçamento viável
O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tem duas prioridades claras na articulação com o Congresso durante o período de transição:
- resolver a questão orçamentária de forma a contemplar o projeto social proposto na campanha;
- e, ao mesmo tempo, garantir governabilidade numa composição parlamentar hoje desfavorável.
Lula tem encontro marcado com os presidentes Arthur Lira (PP-AL), da Câmara, e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), do Senado, na tarde desta quarta-feira (9), em Brasília. O petista está em busca de apoio à proposta que visa aumentar o Orçamento e de uma saída para amenizar a oposição no Legislativo.
Às vésperas de novas eleições para o comando das Casas, parlamentares lembram que, mesmo com a atual aliança de dez partidos, o novo governo precisa construir maioria no Parlamento para se viabilizar.
Na equipe de transição, já houve avanço para além da aliança, com o PSD —partido liderado pelo ex-ministro Gilberto Kassab— tendo um integrante entre os membros do conselho de transição governamental. É o deputado federal Antônio Brito (PSD-BA), líder do partido na Câmara.
Primeiro, o dinheiro. O desafio do governo eleito é abrir espaço fiscal para tentar garantir a manutenção do valor de R$ 600 do Auxílio Brasil —que deverá voltar a se chamar Bolsa Família— e o aumento do salário mínimo, entre outras promessas de campanha, sem cair em irresponsabilidade fiscal.
A proposta orçamentária enviada ao Congresso pelo governo Jair Bolsonaro (PL) em agosto, assegura um valor médio de R$ 405,21 no Auxílio Brasil e impõe cortes em programas sociais, habitacionais e no Farmácia Popular. Para cumprir o prometido, o governo Lula avalia combinar três instrumentos para abertura de espaço fiscal:
- a criação de uma "PEC da Transição", que concederia um dispositivo constitucional para furar o teto de gastos;
- o uso de emendas de relator, chamadas de RP9, de forma direcionada para áreas determinadas, como saúde e educação;
- e editar uma MP (medida provisória) com pedido de crédito extraordinário para investimentos futuros, com aval do TCU (Tribunal de Contas da União).
Nos dois primeiros casos, o governo precisa de apoio no Congresso, em especial no caso da PEC, que precisa ser votada em dois turnos nas duas Casas e será aprovada por três quintos dos votos de cada uma.
É esperado que Lula bata o martelo de qual modelo (ou de como combiná-los) nesta quarta. Pela manhã, o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), coordenador da equipe de transição, e o senador eleito Wellington Dias (PT-PI), vão se encontrar com o relator da Comissão Mista de Orçamento, o senador Marcelo Castro (MDB-PI), para definir os próximos passos.
Formação do bloco. Para além das pautas que serão debatidas entre os parlamentares e a equipe de transição, está a articulação de lideranças petistas nos corredores do Congresso para a formação dos blocos parlamentares para o ano que vem.
Esses blocos servem como base para a divisão dos cargos da Mesa Diretora da Casa pelos próximos dois anos e servem de parâmetro para a distribuição das vagas nas comissões pelos próximos quatro anos.
A federação do PT, composta pelo PV e o PC do B, soma 80 deputados. Mas a conta inicial feita pelos petistas inclui, ainda, as bancadas do PSOL, do PSB e do PDT, que elegeram, ao todo, 43 parlamentares, chegando à marca de 123 deputados.
Dos 513 deputados eleitos, o PL, legenda de Bolsonaro, conseguiu emplacar a maior bancada da Casa, com 99 parlamentares —23 a mais que a atual. Com isso, o partido terá quase um em cada cinco votos na Câmara.
Para ter governabilidade e aprovar propostas que exigem um número alto de votos, como as PECs (propostas de emenda à Constituição), são necessários 308 votos favoráveis. Por isso, aliados de Lula correm para formalizar a união com os "partidos democratas".
Aliança democrática e governabilidade. Parlamentares do PT ouvidos pelo UOL afirmam que, além do MDB (convidado ontem para participar do processo de transição), poderão ser procurados Podemos, PSDB e Cidadania.
Rachadas, contudo, essas legendas também já fizeram parte das contas do governo Bolsonaro para a aprovação de propostas, não como base aliada, mas como uma base "flexível", alinhada com o Executivo em pautas específicas, principalmente as econômicas.
Mas, segundo deputados petistas, isso não seria um impeditivo para ampliar o acordo e formar um "blocão". As negociações também serviriam na divisão das cadeiras nas comissões da Casa, por exemplo, para contemplar a vontade das legendas incluídas.
Para os parlamentares petistas, mais do que a formação de um bloco que "pacificasse" o Congresso, é preciso formar esta base viável para que os projetos planejados —e prometidos— vinguem.
O entorno de Lula lembra que de nada adianta um plano de governo bem feito se ele não conseguir ser executado. Para isso, eles apostam não só nas lideranças legislativas como no poder de articulação (ou "sedução", como chamam nos bastidores) do presidente eleito.
Reeleição de Lira. Questionados, deputados petistas evitam falar sobre as conversas sobre a eleição para a Presidência da Câmara no ano que vem. Lira já se colocou de maneira informal como candidato à reeleição, em fevereiro.
Eleito com o apoio de Bolsonaro, Lira tem o centrão —composto pelo PL, PP, União Brasil e Republicanos (que somam 187 deputados)— nas mãos. Mas a vitória de Lula mudou o cenário e, agora, o deputado alagoano busca um aceno do petista e evitar que o governo eleito lance um candidato concorrente na Câmara.
O PT avalia vantagens e desvantagens, e o assunto é no círculo mais próximo de Lula. O apoio de Lira —ou ao menos uma não oposição do deputado— é crucial para a aprovação tanto do aumento do Orçamento (seja qual for o instrumento escolhido) como para a governabilidade de Lula.
A hora da verdade. Apesar do silêncio, aliados de Lira admitem que o encontro com Lula hoje vai funcionar como termômetro de um potencial acordo para o ano que vem. Integrantes do PP veem com otimismo o eventual apoio de Lira à PEC da Transição, que viabilizaria o pagamento de R$ 600 do Auxílio Brasil no próximo ano.
Na avaliação de integrantes do PP, esse seria um primeiro gesto de Lira para Lula. E esperam, em troca, que avancem as conversas pela reeleição do deputado alagoano na chefia da Câmara. Ainda é ventilada a negociação também em torno de outros cargos da Mesa Diretora, inclusive a vice-presidência da Casa.
No Senado, há o mesmo impasse sobre o próximo presidente: Pacheco também quer se reeleger. Diferentemente da Câmara, entre os senadores acredita-se que Pacheco seja o nome comum entre o Centro e a esquerda — e teria o apoio de Lula, uma vez que trabalhou, mesmo que informalmente, pela sua vitória em Minas Gerais. Entre lulistas, o senador mineiro é praticamente consenso.
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