Golpistas presos após atos de 8/1 reclamam de superlotação e comida ruim
Presos por participação nos atos golpistas de 8 de janeiro, quando foram vandalizadas as sedes dos três Poderes, em Brasília, homens e mulheres detidos no presídio da Papuda e na Colmeia reclamam das condições das penitenciárias, principalmente da comida e da superlotação das celas.
Relatos de detentos colhidos pelo UOL Notícias descrevem "refeições com larvas" e "comida péssima", apesar de advogados que defendem detentos relatarem o tratamento "normal" de um presídio.
Um relatório recente elaborado pela Defensoria Pública da União e pela Defensoria Pública do Distrito Federal, divulgado na sexta-feira passada (3), apontou que inspeções detectaram contêiner de congelamento em temperatura de conservação inadequada e presença de equipamentos e utensílios em mau estado de conservação, com ferrugens e incrustações.
Em nota, a Secretaria da Administração Penitenciária do Distrito Federal nega os problemas e diz que o "fornecimento de uma alimentação de boa qualidade, um dos aspectos contratuais a serem seguidos pelas Contratadas e fiscalizado pelo Poder Público, tem correlação direta com o princípio da dignidade da pessoa humana e outras normas de matriz constitucional".
A advogados, presos reclamaram que as celas são "muito pequenas". Eles narram situações em que havia oito colchões para dez ou 11 pessoas. Ainda expõem questões de higiene, porque as celas possuem um único banheiro. A maioria, no entanto, afirmou ter sido tratada com respeito por agentes penitenciários, apesar de um ou outro ser mais "curto e grosso", conforme relatou a defesa de detentos.
Segundo a pasta da administração penitenciária, a Penitenciária Feminina (Colmeia) dispõe de 1.028 vagas, mas há 838 na unidade. No Centro de Detenção Provisória 2 (Papuda), são 980 vagas, mas 1.428 pessoas estão custodiadas no local.
As críticas dos presos golpistas, infelizmente, são comuns em penitenciárias de todo o país. Guilherme Ziliani Carnelós, presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa, afirma que esse cenário não é exclusivo da Papuda e da Colmeia.
"Isso significa que o Estado não consegue prover aos detentos as condições mínimas de dignidade humana. Há superlotação e faltam banho quente, limpeza, produtos de higiene, luz do sol: o básico", disse, em entrevista ao UOL.
O 8 de janeiro trouxe um olhar extra para uma realidade que já é existente."
Guilherme Ziliani Carnelós, presidente do Instituto de Defesa do Direito de Defesa
"Com todo respeito, é uma enorme ironia do destino sabermos que é justamente o fato de essas pessoas estarem presas hoje que mobiliza a sociedade a rever as condições do cárcere. A comida estragada ou de má qualidade não é uma exclusividade dos presos da Papuda e da Colmeia", concluiu.
Um relatório do Tribunal de Contas da União apontou, em 2019, que o país gastou R$ 15,8 bilhões (R$ 24,8 bilhões, se o valor for corrigido pela inflação) para custear os sistemas prisionais em 2017 e precisaria investir ainda mais para acabar com a superlotação.
A precariedade da comida é comum em presídios, como mostra reportagem no TAB. Segundo o sociólogo Italo Lima, em entrevista a Ecoa, em alguns presídios, "a Defensoria Pública entra na Justiça para garantir a regularidade no abastecimento de água para presos".
"Refeições com larvas"
A Secretaria da Administração Penitenciária do Distrito Federal informou que são oferecidas quatro refeições diárias aos presos:
- Café da manhã: pão com manteiga ou margarina e um achocolatado;
- Almoço: 650 gramas, sendo 150 g de proteína, 150 g de guarnição, 150 g de feijão (90 g de grão e 60 g de caldo) e 200 g de arroz. Os custodiados ainda recebem um suco de caixinha;
- Jantar: 650 gramas, sendo 150 g de proteína, 150 g de guarnição, 150 g de feijão (90 g de grão e 60 g de caldo) e 200 g de arroz;
- Ceia: sanduíche e uma fruta.
A qualidade da comida é uma reclamação unânime e frequente conforme apurou a reportagem por meio dos advogados dos detidos.
Um relato vindo da Colmeia descreve um cenário pior: uma "tortura psicológica diária, com refeições muitas vezes com larvas, cabelos, mosca varejeira etc. Me alimento apenas de bolacha e Toddynho, por isso já perdi bastante peso e me sinto bastante fraca", afirmou.
"Há uma reclamação muito frequente de que a comida é 'impossível de comer'", afirmou o criminalista Hélio Junior, que defende alguns dos presos no 8/1. "São reclamações diárias."
Fiscalizações apontaram problemas
Em uma das fiscalizações no Complexo de Detenção Provisória (CDP) 2 da Papuda, a Defensoria apontou que, a cada nova inspeção, os mantimentos "parecem somente piorar". Um dos alimentos criticados pelos detentos era uma "linguiça de soja" que causava náusea "ao sentir o cheiro dela".
"Observou-se novamente a péssima qualidade das refeições disponibilizadas. A esmagadora maioria dos reclusos apontou que uma das proteínas fornecidas é absolutamente intragável, o que tem feito eles a jogarem fora, pois não conseguem comer", afirmou o relatório da Defensoria.
Colheram-se queixas sobre a qualidade da água que chega às celas, cuja aparência e sabor não agradam. Os detentos colocaram alguns pedaços de pano na torneira, no intento de filtrar a água, mas a medida não impediu que diversos deles tivessem diarreia e outras complicações intestinais."
Trecho de relatório da Defensoria Pública da União
Impasse com defensores públicos
As fiscalizações feitas pelas duas entidades não ajudaram na aproximação com alguns presos, que têm rejeitado serem atendidos pela Defensoria Pública.
Eles não apresentam motivos, mas não aceitam se reunir com esses defensores. Outros dizem que estão sendo atendidos por advogados particulares, mas não apontam a firma ou o nome deles. Com isso, ficam sem defesa e criam um impasse aos já denunciados pela PGR (Procuradoria-Geral da República).
Sem essas informações, os defensores não conseguem ter certeza de que esses detidos estão sendo devidamente atendidos. "É como se estivessem em um limbo", resumiu um defensor ao UOL, sob anonimato.
Esses pontos têm sido levados ao ministro Alexandre de Moraes, relator das investigações no Supremo. Se ficar comprovado que as pessoas estão sem defesa técnica, os processos devem ser enviados à Defensoria Pública obrigatoriamente.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.