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Registro de filha de Cid é anterior à liberação de vacinação para crianças

Do UOL, em São Paulo

05/05/2023 04h00

Os registros de vacinação das filhas do tenente-coronel do Exército Mauro Cid indicam que elas teriam recebido a primeira dose da vacina contra covid-19 quando ainda não havia começado a campanha de imunização para crianças e adolescentes. Além disso, teriam tomado Jassen quando tinham menos de 18 anos, o que não é permitido.

O que aconteceu

18.jun.2019 - Mauro Cid, então ajudante de ordens, conversa com Bolsonaro após uma reunião no Palácio do Planalto - 18.jun.2019 - Adriano Machado/Reuters - 18.jun.2019 - Adriano Machado/Reuters
18.jun.2019 - Mauro Cid, então ajudante de ordens, conversa com Bolsonaro após uma reunião no Palácio do Planalto
Imagem: 18.jun.2019 - Adriano Machado/Reuters

Cid e as três filhas teriam tomado três doses da vacina em Duque de Caxias (RJ). De acordo com os registros, considerados fraudulentos pela PF, eles foram imunizados no Centro Municipal de Saúde da cidade. Segundo a PF, em dezembro de 2022, quando os dados das imunizações deles foram inseridos no sistema do Ministério da Saúde, as meninas tinham, 5, 14 e 18 anos. Cid é ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e foi preso pela PF na quarta-feira.

As doses teriam sido aplicadas nos dias 22 de junho, 8 de setembro e 19 de novembro de 2021. O registro mostra que o tenente-coronel e as três meninas tomaram duas doses da Pfizer e uma da Janssen cada um.

A caçula não tinha idade para ser vacinada. Quando supostamente tomaram a primeira dose, as filhas teriam, no máximo, 4, 13 e 17 anos. Acontece que a Anvisa só autorizou a aplicação da vacina da Pfizer em adolescentes a partir de 12 anos em 11 de junho de 2021, 11 dias antes da suposta primeira dose.

Além disso, Duque de Caxias só começou a vacinar jovens dois meses depois da suposta primeira dose. Segundo registro no site da prefeitura, a cidade só começou a vacinar adolescentes (com prioridade àqueles com deficiência e comorbidades) em agosto de 2021.

A filha mais nova não poderia ter recebido nenhuma das vacinas nas datas dos registros. A Anvisa só liberou o imunizante para crianças entre 5 e 11 anos em 16 de dezembro de 2021, nesta data ela ainda teria 4 anos. As primeiras crianças só foram vacinadas no Brasil em janeiro de 2022, quando a caçula já tinha as três doses registradas. Já para a faixa etária inferior (6 meses a 4 anos) o imunizante só foi liberado em setembro de 2022. A dose de reforço só foi recomendada para crianças neste ano.

Em outra inconsistência, as filhas também não poderiam receber o imunizante da Janssen. A Anvisa autorizou a vacina apenas em maiores de 18 anos. No dia 19 de novembro de 2021, quando há o registro de que as três tomaram Janssen, nenhuma delas era maior de idade.

Filhas não foram a Duque de Caxias nos dias dos registros. A PF também afirma que as filhas mais velhas do tenente-coronel estavam em Brasília nas datas em que elas supostamente tomaram as duas primeiras doses da vacina na cidade da Baixada Fluminense. A informação foi obtida a partir da análise de mensagens de Whatsapp, decorrentes da quebra de sigilo.

Para os investigadores, a informação "reforça os indícios de novas inserções falsos de vacinação contra a covid-19 no sistema SI-PNI do Ministério da Saúde".

O UOL entrou em contato com a defesa de Cid, mas não teve retorno até o momento.

Supostos dados de vacinação de Cid e das filhas  - Reprodução/PF - Reprodução/PF
Supostos dados de vacinação de Cid e das filhas
Imagem: Reprodução/PF

Cronologia do caso

  • 31 de março de 2021: A Anvisa aprova o uso emergencial da vacina da Janssen apenas em pessoas com 18 anos ou mais.
  • 11 de junho de 2021: Anvisa autoriza vacina da Pfizer para adolescentes a partir de 12 anos.
  • 22 de junho de 2021: Registro de vacinação indica que Cid e as três filhas tomaram a primeira dose da vacina em Duque de Caixas. O imunizante foi da Pfizer, mas a caçula tinha apenas 4 anos e ainda não poderia ter sido vacinada.
  • 21 de agosto de 2021: A Prefeitura de Duque de Caxias começa a vacinar adolescentes de 16 e 17 anos com comorbidades ou deficiência. Não há informações que as filhas de Cid se enquadram neste caso.
  • 8 de setembro 2021: Registro de que os quatro teriam tomado a segunda dose da Pfizer.
  • 19 de novembro de 2021: Registro de que os quatro teriam tomado a terceira dose, a agora da Janssen.
  • 16 de dezembro de 2021: A Anvisa libera a vacinação para crianças entre 5 e 11 anos.
  • 14 de janeiro de 2022: As primeiras crianças são vacinadas contra a covid-19 no país. Nesta data, a filha mais nova de Cid já teria tomado três doses do imunizante.
  • 5 de abril de 2022: A Anvisa aprova o registro definitivo da vacina da Janssen e mantém a liberação apenas para pessoas com 18 anos ou mais. O registro mostra que as três filhas do tenente-coronel, menores de idade, tomaram o imunizante, o que não é permitido.
  • 17 de dezembro de 2022: Os dados da vacinação da família são inseridos no sistema do Ministério da Saúde, mais de um ano depois das supostas imunizações.

Operação contra suposto dado falso de vacina

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e pessoas próximas a ele foram alvos de uma operação da Polícia Federal que mirou a inclusão de dados falsos sobre vacinação contra a covid-19 nos sistemas do Ministério da Saúde. Os policiais cumpriram 16 mandados de busca e apreensão e seis de prisão preventiva por determinação do ministro do STF Alexandre de Moraes.

A PF diz que os dados dos certificados de vacinação foram adulterados para permitir a entrada de Bolsonaro nos Estados Unidos, no fim do ano passado. Segundo as investigações, ele não se vacinou, mas possuía um certificado ilegal que indicava o oposto. A PF também apura se essas fraudes beneficiaram a filha dele, Laura, de 12 anos, e assessores e familiares deles que também viajaram aos EUA.

Bolsonaro foi alvo de mandado de busca e apreensão em sua casa, em Brasília. O celular dele foi apreendido e, segundo ele, o aparelho não possui senha. O ex-presidente disse que não houve adulteração de sua parte.