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Relator: Bolsonaro se viu 'como militar à frente das tropas' em reunião

Do UOL, em Brasília e em São Paulo

27/06/2023 21h00Atualizada em 27/06/2023 23h31

Relator do caso contra Jair Bolsonaro (PL), o ministro Benedito Gonçalves, do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), apontou uma "leitura distorcida" do então presidente em sua reunião com embaixadores em julho de 2022, às vésperas da campanha eleitoral.

O que aconteceu

Benedito disse que Bolsonaro "enxerga-se como militar em exercício à frente das tropas", enquanto discursava contra as urnas eletrônicas para os embaixadores no ano passado.

O relator ainda apontou uma "leitura distorcida" da competência privativa de Bolsonaro "para exercer o comando supremo das Forças Armadas".

Para o ministro, o ex-presidente demonstrou "uma perturbadora interpretação" de sua autoridade "suprema".

"As passagens deixam entrever um preocupante descaso com uma conquista democrática de incomensurável importância simbólica no pós-ditadura que é a sujeição do poderio militar brasileiro a uma máxima autoridade civil democraticamente eleita", apontou o relator.

Como está o julgamento

Em suas falas iniciais, Benedito Gonçalves defendeu a inclusão da minuta golpista no caso em julgamento e, em seguida, passou ao mérito do caso em si, que foi a reunião do então presidente com embaixadores para atacar o sistema eleitoral brasileiro.

O relator rechaçou a tese da defesa de que o evento não poderia ser considerado eleitoral por não ter ocorrido pedido de voto ou ter sido feito a eleitores em potenciais — uma vez que os diplomatas não votam nas eleições.

O ministro apontou que o evento foi transmitido pela TV Brasil, fato que "potencializou" a disseminação das inverdades proferidas por Jair Bolsonaro naquele evento. "O caráter eleitoreiro é apontado com a conexão da fala do primeiro investigado e sua estratégia à campanha à reeleição", afirmou.

Gonçalves também afirmou que houve "caráter eleitoreiro" naquela reunião, além do uso da máquina pública em benefício do então presidente e candidato à reeleição.

Em outro ponto, Benedito ressaltou que o ex-presidente confundiu seu papel constitucional de chefe das Forças Armadas e portou-se como um "militar à frente das tropas" naquele encontro.

O ministro citou as lives realizadas por Bolsonaro em 2021 e em 2022, e ponderou que "existe um flerte perigoso com o golpismo" no conteúdo dessas gravações.

Para Benedito, essas lives com ataques às urnas eletrônicas e a propagação de inverdades coaduna com a minuta golpista, de modo que tudo é parte de um mesmo contexto de caráter antidemocrático.

Por fim, Benedito Gonçalves proferiu seu voto em favor da condenação de Jair Bolsonaro, mas defendeu que o candidato a vice na chapa com ele, Walter Braga Netto, seja inocentado.

Após a leitura, a sessão foi suspensa e será retomada na próxima quinta-feira (29), com o voto do ministro Raul Araújo — recentemente, Bolsonaro expressou desejo de que Araújo peça vista, o que suspenderia o julgamento.

Principais pontos destacados pelo relator em seu voto:

  • Manutenção da minuta golpista encontrada na casa de Anderson Torres;
  • Rejeitou comparação do caso analisado hoje com o da chapa Dilma-Temer, julgado pelo TSE em 2017;
  • Rechaçou a tese de que o evento realizado por Bolsonaro com embaixadores não teve caráter eleitoral;
  • Apontou 'falsa simetria' ao comparar a reunião então presidente do TSE, Edson Fachin, com diplomatas em maio de 2022, e o encontro de Bolsonaro com representantes internacionais em julho do mesmo ano;
  • Afirmou que Bolsonaro foi pessoalmente responsável pela reunião com os embaixadores;
  • Disse que Bolsonaro "distorceu" sua competência como líder das Forças Armadas ao portar-se como "militar em exercício à frente das tropas.

Entenda o trâmite do julgamento

A primeira fase, da leitura do relatório e do parecer, foi concluída na semana passada.

Estamos hoje na segunda etapa: a leitura do voto de Benedito Gonçalves. O relator também pode abordar questões preliminares, que envolvem o andamento do processo, caso o tema tenha sido abordado por uma das partes.

Benedito Gonçalves informou que fez um resumo do relatório para dar celeridade ao julgamento, mas este primeiro dia deve ser ocupado pela leitura de seu voto.

Depois de Benedito, a ordem de votação é a seguinte: Raul Araújo, Floriano de Azevedo Marques, André Ramos Tavares, Cármen Lúcia, Nunes Marques e, por último, o ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE.

Qualquer ministro pode pedir vista e suspender o julgamento. Se isso ocorrer, o caso deve ser devolvido em até 60 dias para retomada da discussão.

*Participam da cobertura

Do UOL, em Brasília: Paulo Roberto Netto

Do UOL, em São Paulo: Ana Paula Bimbati, Beatriz Gomes, Fabíola Perez, Isabella Cavalcante e Tiago Minervino