Câmara de SP decide analisar CPI contra padre Júlio somente após o carnaval

A Câmara Municipal de São Paulo decidiu hoje que analisará somente após o carnaval a instalação ou não de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) que mira a atuação do padre Júlio Lancellotti e de ONGs que atuam na região conhecida como cracolândia.

O que aconteceu

A decisão foi tomada em reunião com a presença de líderes de diferentes partidos.

"Denúncias são gravíssimas", afirmou presidente da Câmara. O vereador Milton Leite (União Brasil) propôs ao colega Rubinho que a Casa aguarde o depoimento de uma suposta vítima à Arquidiocese de São Paulo.

Autor do pedido de CPI afirmou que denúncias de abuso estariam relacionadas à atuação das ONGs. Isso justificaria a investigação por parte dos vereadores dos supostos casos. "Tenho recebido no meu gabinete quase que diariamente pessoas que trazem denúncias relativas a essa pessoa, esse sujeito", afirmou Nunes.

Oposição se coloca contra abertura da CPI. Os vereadores Elaine do Quilombo Periférico (Psol) e Eliseu Gabriel (PSB) questionaram a forma como o pedido de comissão foi feito (sem citar o padre) e a pertinência de que a Câmara avaliasse a questão, que pode não ter ligação com os assuntos da cidade.

Vereadores de SP se reúnem para definir pautas da Câmara Municipal
Vereadores de SP se reúnem para definir pautas da Câmara Municipal Imagem: Saulo Pereira Guimarães - 6.fev.2024 / UOL

A arquidiocese afirma que investiga o padre. Em nota divulgada nesta segunda (5), a entidade católica informou que segue "em busca da verdade" a respeito de denúncia recente contra Lancellotti. Segundo a Folha, um suposto assédio sexual praticado contra um ex-coroinha em 1987 teria impulsionado a apuração.

Imputações são "completamente falsas", afirma o padre. Em nota divulgada ontem, o religioso disse que "as acusações estão imbricadas em uma rede de desinformação, que mascara eventuais interesses de setores do poder político e econômico" e disse ter "plena fé que as apurações conduzidas pela Arquidiocese esclarecerão a verdade dos fatos".

Câmara tem 45 pedidos de CPIs na fila. O avanço ou não de cada um deles depende do colégio de líderes, que define o que entra e o que não entra na pauta da casa. Atualmente, há três comissões em curso: uma relativa à Enel, outra à violência na cidade e uma terceira ligada aos roubos e furtos de fios e cabos.

Continua após a publicidade

Nota da Arquidiocese deixou cenário incerto

Vereadores não acreditavam em instalação da comissão. Até o começo da tarde desta segunda (5), membros da Câmara não acreditavam que a CPI fosse ser instalada. Entretanto, a divulgação da nota da Arquidiocese de São Paulo deixou o cenário incerto em relação a isso nas últimas horas.

"Acho que não deve ir para frente", disse o prefeito de São Paulo sobre comissão. Há cerca de um mês, Ricardo Nunes (MDB) afirmou que a falta de apoio na Câmara, dentre outros fatores, deve enterrar a comissão.

Nos bastidores, comenta-se que uma CPI liderada pela situação colocaria o prefeito na posição de "perseguidor" de quem acolhe os mais pobres. É um papel especialmente desconfortável para Nunes, em um ano no qual ele busca a reeleição.

Relembre o caso

ONGs que atuam na "cracolândia" são alvo do pedido de CPI. Protocolado em dezembro por Rubinho Nunes, o documento pede que se inicie uma investigação sobre a oferta de "alimentos, utensílios para uso de substâncias ilícitas e tratamento de dependentes químicos" por organizações nessa região.

Continua após a publicidade

Após protocolar o pedido, o vereador afirmou que vai mirar também no padre Júlio. Isso não está especificado no texto do requerimento. Após a informação vir à tona, alguns vereadores decidiram retirar o apoio à proposta.

"Todos sabiam do conteúdo", diz Rubinho, sobre o requerimento para abertura de CPI. O pedido foi protocolado com mais de 19 assinaturas, o mínimo previsto, segundo o regimento interno.

Conservadores usam vídeo para acusar padre de pedofilia. No começo do mês, vieram a público imagens nas quais um homem identificado como Lancellotti (o que não foi confirmado em nenhum momento) troca mensagens pelo celular com um suposto jovem (que não aparece na gravação) e se masturba em uma chamada de vídeo. O caso foi divulgado pela revista Oeste, publicação de viés conservador.

Autor do pedido de CPI vai pedir afastamento do padre à igreja. Nos próximos dias, o vereador Rubinho Nunes (União Brasil) deve enviar à Arquidiocese de São Paulo uma solicitação de que Lancellotti seja afastado de suas funções por conta das denúncias dos supostos abusos.

O que dizem os vereadores

Senhor Lancellotti é uma figura em torno da qual as ONGs gravitam e recentemente vieram a público denúncias de abuso sexual ligadas a ele. Tenho recebido no meu gabinete quase que diariamente pessoas que trazem denúncias relativas a essa pessoa. Por algumas denúncias vincularem as ONGs às situações de abuso, entendo que isso estaria dentro do escopo dessa CPI.
Rubinho Nunes (União Brasil), vereador e autor do pedido de CPI

Continua após a publicidade

Entendo que as denúncias são gravíssimas. Tanto que tomei as providências, como sempre faço. Estamos enviando à Roma, assim como enviei para arquidiocese. Mas acho que a gente tem que preservar qualquer um porque é uma acusação muito grave, que exige muita cautela e prudência.
Milton Leite (União Brasil), vereador e presidente da Câmara Municipal de SP

Investigar alguém que é uma pessoa pública sem absolutamente nenhum objeto é uma punição. Devemos tratar com muita responsabilidade acusações como essa. O Psol já se manifesta absolutamente contrário pela forma como isso foi apresentado.
Elaine do Quilombo Periférico (Psol), vereadora

Nós não somos conselho tutelar ou ministério público e acho que estamos entrando em terreno movediço. Não tem cabimento a Câmara fazer isso. É imoral, contra-producente e muito ruim para a Câmara Municipal ficar discutindo essas coisas. Nós somos vereadores e temos que tratar da vida da cidade.
Eliseu Gabriel (PSB), vereador

Deixe seu comentário

Só para assinantes