Lula ignorou 9 suspeitas contra Juscelino Filho, indiciado hoje pela PF

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ignorou nove denúncias reveladas por investigações jornalísticas contra seu ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil), indiciado hoje (12) pela Polícia Federal sob suspeita de corrupção e organização criminosa.

Desde janeiro de 2023, a imprensa revela casos de mau uso do dinheiro público pelo ministro. Uma delas motivou o indiciamento do ministro pelo suposto envolvimento em desvios da Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba).

O inquérito foi aberto a partir de uma série de reportagens reveladas pelo jornal O Estado de S.Paulo. Juscelino Filho colocou R$ 5 milhões do orçamento secreto na Prefeitura de Vitorino Freire (MA), comandada por sua irmã, Luanna Rezende (União).

O recurso foi usado para asfaltar uma estrada de terra que passa em frente às fazendas dele e de sua família, onde ele mantém uma pista de pouso. Ninguém além de sua família é beneficiado pela estrada, segundo atestou a CGU (Controladoria-Geral da União).

Em nota, o ministro afirmou hoje que "o indiciamento é uma ação política e previsível". Na avaliação de Juscelino Filho, a investigação "distorceu premissas, ignorou fatos e sequer ouviu a defesa sobre o escopo do inquérito" (leia abaixo a íntegra da nota).

É importante deixar claro que não há nada, absolutamente nada, que envolve minha atuação no Ministério das Comunicações, pautada sempre pela transparência, pela ética e defesa do interesse público.
Juscelino Filho, ministro das Comunicações

O UOL procurou a Secretaria de Comunicação da Presidência da República, mas não obteve retorno. O espaços segue aberto.

Outras reportagens levantaram suspeitas de ilegalidades e imoralidades na conduta do ministro:

Escondeu um patrimônio de R$ 2 milhões em cavalos de raça do TSE (Tribunal Superior Eleitoral);

Apresentou à Justiça Eleitoral, na campanha de 2022, dados falsos sobre viagens de helicóptero;

Usou um voo da FAB e diárias para ir a leilão de cavalos de raça. Após a revelação do caso, o ministro devolveu parte das diárias recebidas;

Empregou um piloto particular de aeronaves e o gerente do haras da família como funcionários da Câmara dos Deputados no gabinete de seu suplente Dr. Benjamim (União-MA). Após a revelação do caso, o piloto foi demitido.

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Entregou seu gabinete no ministério para o sogro despachar quando ele próprio estava fora de Brasília. A Comissão de Ética Pública da Presidência da República analisou o caso e disse que era "compreensível" Juscelino Filho liberar ministério para sogro. Recomendou, contudo, que Juscelino trabalhasse "com a mais absoluta atenção aos normativos";

Usou o fotógrafo oficial do Ministério das Comunicações em eventos particulares, promovendo a si mesmo, a irmã e um primo.

Após a chegada de Juscelino Filho ao cargo, o Ministério das Comunicações distribuiu retransmissoras de TV para um empresário do núcleo político do ministro.

Beneficiou prefeituras comandadas por sua irmã e um primo com doação de computadores, com um programa do ministério.

O senador Davi Alcolumbre (à esq.) e o ministro Juscelino Filho (à dir.) participaram da inauguração da Infovia 03 em Macapá em maio deste ano
O senador Davi Alcolumbre (à esq.) e o ministro Juscelino Filho (à dir.) participaram da inauguração da Infovia 03 em Macapá em maio deste ano Imagem: Kayo Sousa/Ministério das Comunicações

Indicado por Alcolumbre e apoiado por Lira

Juscelino Filho assumiu o ministério em janeiro do ano passado por indicação do senador Davi Alcolumbre (União-AP). Após a imprensa revelar os casos envolvendo o ministro, Lula convocou o auxiliar para uma única reunião para tratar das ilegalidades.

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Em março do ano passado, o presidente chegou a sugerir que poderia demiti-lo, caso não conseguisse explicar o uso do cargo para ir a leilão de cavalos em São Paulo. O ministro teve que devolver o dinheiro público que solicitou para cumprir agenda privada. Lula, no entanto, sucumbiu às pressões do centrão e manteve o ministro no cargo.

Além de Alcolumbre, Juscelino Filho também tem o apoio do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). O ministro já passou férias com o deputado em Alagoas e na Bahia. Ambos compartilham interesse por cavalos da raça Quarto de Milha.

O setor das Comunicações é estratégico para o país e atraiu atenção extra do centrão após o leilão do 5G. O edital da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) estabeleceu uma série de compromissos para as empresas vencedoras.

Como o UOL mostrou, Juscelino Filho tem tentando influenciar o uso de R$ 9,4 bilhões em recursos aportados pelas operadoras para o cumprimento das contrapartidas. Em janeiro, o ministro e o secretário de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, trocaram a cúpula de uma entidade que controla R$ 3,1 bilhões para levar internet para escolas.

Depois, Juscelino Filho tentou emplacar um ex-funcionário das Comunicações em outra entidade criada na esteira do leilão, com orçamento de R$ 6,3 bilhões. O aliado, que havia sido demitido da pasta pelo ministro em março, não conseguiu o cargo, pois a Comissão de Ética Pública da Presidência da República não analisou o pedido para que ele assumisse a função.

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As duas entidades estão com dinheiro em caixa para usar em obras e serviços públicos. A atuação independe do orçamento federal enxuto e sob disputa do Executivo e do Legislativo, por isso passaram a ser cobiçadas pelo centrão.

Ambas também são vistas como "vitrines" para apresentar "entregas" à população. Uma das entidades já trocou mais de 2 milhões de antenas parabólicas para a população de baixa renda e inaugurou no início do mês uma infovia —também chamada de "estrada digital"— de 624 km entre Belém (PA) e Macapá (AP).

Em defesa, Juscelino Filho cita Lava Jato

Por meio de nota, o ministro disse hoje que a investigação da PF "deveria ser um instrumento para descobrir a verdade", contudo, "parece ter se desviado de seu propósito original".

"Em vez disso, concentrou-se em criar uma narrativa de culpabilidade perante a opinião pública, com vazamentos seletivos, sem considerar os fatos objetivos", afirmou.

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Juscelino Filho também declarou que o inquérito "devassou" vida dele e de familiares, "sem encontrar nada". "A investigação revira fatos antigos e que sequer são de minha responsabilidade enquanto parlamentar", disse.

"No exercício do cargo como deputado federal, apenas indiquei emendas parlamentares para custear obras. A licitação, realização e fiscalização dessas obras são de responsabilidade do Poder Executivo e dos demais órgãos competentes."

O ministro também informou que, durante o depoimento à PF, "o delegado responsável não fez questionamentos relevantes sobre o objeto da investigação". De acordo com Juscelino, a oitiva foi encerrada "abruptamente após apenas 15 minutos, sem dar espaço para esclarecimentos ou aprofundamento".

"Isso suscita dúvidas sobre sua isenção, repetindo um modus operandi que já vimos na Operação Lava Jato e que causou danos irreparáveis a pessoas inocentes", afirmou o ministro.

"É importante lembrar que o indiciamento não implica em culpa. A Justiça é a única instância competente para julgar, e confio plenamente na imparcialidade do Poder Judiciário. Minha inocência será comprovada ao final desse processo, e espero que o amplo direito de defesa e a presunção de inocência sejam respeitados."

Quanto às reportagens sobre o voo da FAB, a inserção de dados falsos e o patrimônio em cavalos de raça, Juscelino Filho não se manifestou.

Sobre o piloto e o gerente do haras, declarou, na época, que o as nomeações foram feitas "em conformidade com as regras da Câmara".

Após a revelação sobre a atuação do sogro do ministro, o ministério exaltou as "qualificações profissionais - técnicas e acadêmicas" de Fernando Fialho.

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