Chapa de médicos derrotada cita SMS e questiona eleição do CFM em São Paulo

Médicos pedem a impugnação do processo que elegeu o infectologista Francisco Cardoso para representar o estado de São Paulo no CFM (Conselho Federal de Medicina), em mais um capítulo da disputa política dentro da entidade.

O que aconteceu

Chapa da pediatra Melissa Palmieri, que ficou em segundo lugar na eleição, questiona o resultado. No pedido, os médicos mostram um relatório da apuração e dizem haver uma divergência entre o número de eleitores e a quantidade de votos computados.

Comissão Nacional Eleitoral do CFM rejeitou pedido nesta sexta-feira (9). Na decisão, o presidente da comissão, Aldemir Humberto Soares, disse que os médicos com inscrições em diferentes estados podem votar em todos eles, então não há irregularidade nos números.

Palmieri recorreu da decisão. Para ela, é imprescindível que haja uma auditoria que mostre quantos médicos com inscrições em conselhos regionais distintos votaram, para que as chapas possam verificar o resultado. "É um direito de todas as chapas e de todos os médicos eleitores requerer a manifestação das mesmas, até porque contratadas e custeadas foram pelo CFM, ou seja, pelos médicos, que são os maiores interessados", disse.

Para Cardoso, o pedido de impugnação é uma tentativa de "criar uma falsa narrativa de suposta fraude eleitoral, que não ocorreu". "A vitória foi alcançada exclusivamente através do convencimento legítimo e democrático, que repercutiu diretamente na quantidade de votos totais", afirmou ele à reportagem.

Mensagens sem identificação pedem voto

Candidatura de Palmieri já havia pedido suspensão da chapa de Cardoso antes da eleição por propaganda irregular. As regras do processo dizem que é proibido fazer campanha 24 horas antes do início da votação, o que a chapa vencedora teria descumprido.

SMS sem identificação teria sido enviado no dia anterior à eleição, orientando voto na chapa 2, de Cardoso. "Chapa 02 SP liderando! Continuem votando! Hoje é o último dia. Não deixe a esquerda ter chance, apoie a chapa 02", diz o texto.

Médicos teriam recebido SMS de número sem identificação orientando voto em eleição para o CFM em São Paulo
Médicos teriam recebido SMS de número sem identificação orientando voto em eleição para o CFM em São Paulo Imagem: Reprodução
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Esta não seria a primeira mensagem apócrifa da campanha. Em julho, médicos relataram ter recebido torpedos orientando voto na chapa 2 por ser "a única anti-Lula". Cardoso negou a autoria do disparo, e disse que nenhum de seus conhecidos recebeu a mensagem.

"Nunca pratiquei propaganda irregular", disse o conselheiro eleito. "Para quem se intitula como defensor da ciência e da democracia, parece-me muito estranho esse questionamento incisivo em relação à integridade das urnas e à vontade popular. Democracia é quando eu venço e ditadura é quando os outros ganham?".

Cardoso ficou conhecido por defender o uso de medicamentos para tratamento precoce da covid-19 na CPI da Covid no Senado. "De todos os remédios testados, o que apresentou inicialmente o melhor desempenho foi a cloroquina e sua prima farmacológica, a hidroxicloroquina", disse ele em sessão em junho de 2021 — contrariando a OMS, que concluiu que o medicamento não funciona contra a doença e pode causar efeito adverso.

Chapa 2 publicou fotos e vídeos nas redes sociais com apoio do dono das lojas Havan, Luciano Hang. "Precisamos de pessoas que defendam a vida e a autonomia médica", diz na propaganda o empresário, que apoiou o governo de Jair Bolsonaro (PL).

Médico disse que não esconde seu posicionamento político. "Sou conhecido por ser o único [candidato] que não apoia o atual governo", disse. "Um exemplo: o presidente da República trabalha para todos, não só para quem o elegeu, mas isso não quer dizer que ele não possa ter um posicionamento. É a mesma coisa."

Eleição em São Paulo virou caso de polícia. Em julho, o CFM informou que acionou a PF para apurar mensagens nas redes sociais que imitavam comunicados institucionais pedindo voto. Segundo o conselho, os conteúdos usavam a logomarca e a identidade visual do órgão sem autorização.

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Por que eleição no CFM importa

Resoluções da entidade regem atuação médica. Por exemplo, o CFM aprovou a proibição da assistolia fetal, procedimento usado em interrupções de gravidezes com mais de 22 semanas.

Restrição poderia dificultar o acesso a abortos nas situações previstas pela lei. A norma foi suspensa pelo STF após ação do PSOL, que argumenta que ela é inconstitucional. A medida ainda será analisada no plenário da Corte.

Decisões anteriores também geraram polêmica. Em 2022, o CFM restringiu a prescrição de CBD medicinal, e em 2021, foi alvo de uma ação da Defensoria Pública da União após permitir uso de medicamentos sem comprovação científica no tratamento de pacientes com covid.

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