'Ápice da balbúrdia': a queda de braço entre STF e Congresso sobre emendas
O ministro do STF Flávio Dino liberou neste domingo (29) parte das emendas parlamentares que estavam bloqueadas pelo STF. Mesmo permitindo a movimentação dos recursos, o ex-governador do Maranhão manteve críticas à maneira como as emendas são distribuídas e disse que, ao examinar as petições, verificou "o ápice de uma balbúrdia", mantendo o embate entre Congresso e Judiciário.
O que aconteceu
A queda de braço entre Dino e as casas parlamentares se arrasta desde agosto e não deve findar com a liberação deste domingo. Ele continua demonstrando desagrado com a maneira como os recursos são empenhados e reiterou a necessidade de ajustes para 2025. Para o ministro, é preciso rever as "emendas de comissão" —emendas coletivas destinadas às comissões permanentes, assinadas pelos seus respectivos líderes.
"O ápice de uma balbúrdia quanto ao processo orçamentário", afirmou Dino sobre petições enviadas pela Câmara dos Deputados. Ele manteve o bloqueio de parte das 5.449 indicações das emendas de comissão, que equivalem a um montante de R$ 4,2 bilhões. Na decisão publicada neste domingo (29) o ministro ainda apontou "inconsistências" e "contradições" sobre a obrigatoriedade dessas emendas.
Dino quer transparência nas indicações, destino e finalidade das emendas. Para o ministro, a distribuição de recursos para as comissões atribuindo a totalidade dos pedidos aos 17 líderes de bancadas, e não aos deputados específicos, abre espaço para questionamentos sobre a má utilização de recursos públicos. "Somente o pensamento iliberal, que se nutre e é nutrido pela antipolítica, se beneficia com práticas orçamentárias tumultuadas ou ímprobas", afirma o ministro.
Ademais, a um parlamentar é enaltecedor a conquista de recursos em favor dos seus representados, portanto não há amparo jurídico, nem justificativa lógica, para que um ato nobre fique escondido pela opacidade do que se convencionou chamar de 'Orçamento Secreto'. Salvo a insuportável hipótese de perpetração de desvio de finalidade conducente à má utilização de recursos públicos, por exemplo visando exclusivamente benefícios patrimoniais privados.
Ministro do STF Flávio Dino
AGU defendeu "interpretação mais segura" da decisão de Dino. No documento publicado nesta segunda-feira (30), a Advocacia-Geral da União afirma que há uma "dúvida razoável" se a decisão do ministro de liberar a execução de parte dos recursos alcança as emendas de comissão tratadas no ofício dos líderes. Portanto, orienta o governo a manter a suspensão dos pagamentos até que seja feito um esclarecimento judicial.
Ele bloqueou recursos em agosto e exigiu mais transparência. A medida foi avaliada por parlamentares como "tentativa de controle de atos concretos da Administração Pública e do Poder Legislativo". Os pagamentos de emendas parlamentares foram liberados pelo ministro no dia 2 de dezembro, contanto que os repasses respeitassem critérios de rastreabilidade. A decisão ocorreu após a Câmara e o Senado debaterem projeto de lei que regulamenta as emendas parlamentares.
Após liberação, o pagamento foi autorizado pelo Executivo. Contudo, Flávio Dino alega que a Câmara não identificou nas emendas de comissão os parlamentares que solicitaram verba, e pediu que a PF (Polícia Federal) abrisse um inquérito para apurar irregularidades nos trâmites que envolvem os repasses.
A PF abriu, na terça-feira (24), um inquérito para investigar a liberação do valor das emendas. Dino afirmou, ainda, que a requisição do inquérito se tornou necessária após identificar contradições nas petições da Câmara. "Sublinho que não se descarta que se cuide meramente de interpretações defeituosas, de erros administrativos ou de imposições políticas sobre qualificados e respeitáveis assessores da Câmara", reiterou o ministro. "Mas também pode haver outras tipificações, sobre as quais qualquer juízo de valor —neste momento processual— seria prematuro e incabível."
Câmara encaminhou documento ao ministro defendendo emendas de comissão. Na madrugada da última sexta-feira (27) um documento assinado pelo advogado da Câmara, Jules Michelet Pereira Queiroz e Silva, foi encaminhado para o ministro. A casa alega que houve transparência nas emendas e que não existe "tentativa de descumprimento" de decisões do STF. "A Câmara dos Deputados tem agido de maneira cooperativa e de boa-fé, em sincero diálogo institucional com os Poderes Executivo e Judiciário para aprimorar o processo de elaboração e execução orçamentária de maneira transparente e eficiente", diz Queiroz e Silva.
Ministro deu prazo de dez dias para que Senado se manifeste sobre as alegações da Câmara. Os recursos que podem ser movimentados até o dia 10 de janeiro, após a decisão de Dino, são provenientes de emendas parlamentares já depositadas nos fundos da Saúde. Outras emendas continuam bloqueadas. "Não se trata de interferência judicial na sagrada autonomia do Poder Legislativo, e sim de sua adequação à Constituição", alegou Dino, na decisão publicada neste domingo. "Este é um dever irrenunciável do STF: assegurar que não haja o império de vontades individuais ou a imposição de práticas concernentes ao constitucionalismo abusivo, de índole autoritária e apartada do interesse público."
Verifico o ápice de uma balbúrdia quanto ao processo orçamentário --certamente inédita. Com efeito, as citadas Petições contêm incoerências internas, contradições com outras peças constantes dos autos e --o mais grave-- confronto com a ordem jurídica pátria.
Ministro do STF Flávio Dino
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.