A gente tem que brigar pelo mínimo, diz carcereiro isolado por coronavírus
Resumo da notícia
- Agente penitenciário de SP está isolado com suspeita de coronavírus desde quarta-feira
- Em entrevista ao UOL, afirma que sintomas tiveram início após chegada de presos de SP
- Carcereiro diz que há álcool gel, máscaras e luvas, mas em pouca quantidade
- Governo cita que foi elaborado plano de contingência por conta do coronavírus
O agente penitenciário paulista José (nome fictício), de 43 anos, está desde anteontem (25) com determinação médica para ficar isolado por duas semanas, após apresentar sintomas do novo coronavírus.
Com 22 anos de carreira no presídio de Martinópolis, a 550 km de distância da capital, José está acostumado a lidar com um tipo de perigo. "Todos os presos são do PCC (Primeiro Comando da Capital). Lá, o cara olha no teu olho e diz que vai te matar", conta.
Com capacidade para abrigar 800 pessoas, Martinópolis tem atualmente 1.778 presos. José viu de perto a transformação do presídio. "Eu praticamente inaugurei a unidade. No início, lá tinha PCC, Seita Satânica e CDL (Comando da Libertação). Agora é só o PCC."
Desde sábado (21), José teve de encarar a realidade de um outro fator gerador de medo, além do PCC: a expansão do coronavírus dentro do sistema penitenciário paulista.
"Desde o dia 21, a unidade recebeu 22 presos que vieram de São Paulo. Um funcionário da unidade, que teve contato com um deputado estadual que testou positivo para o coronavírus, foi afastado depois de apresentar sintomas", diz.
Esse funcionário, segundo José, teve contato com oito presidiários. A direção da unidade determinou que esses oito homens fossem imediatamente isolados.
Desde então, José começou a ter dor no corpo, febre, dor de cabeça intensa e também incômodo ao redor dos olhos. Ele trabalhou até quarta-feira (25), quando também teve falta de ar.
"Corri para a Santa Casa de Presidente Prudente. Chegando lá, não deixaram nem eu entrar, fui atendido numa área já meio isolada porque estão com medo. Lá, o médico fez os procedimentos e disse para eu me isolar por 14 dias", afirma.
Após tomar medicamentos, hoje José está sem falta de ar e sem febre, apenas persiste a dor no corpo. "Eu ainda não sei se estou com coronavírus, são sintomas de uma gripe, mas enquanto isso não posso ver ninguém."
O agente, que mora sozinho, não pode visitar a mãe, de 85 anos, que também está isolada por pertencer ao grupo de risco.
Secretaria não divulga dados
De Martinópolis, José e outro carcereiro estão afastados sob suspeita de covid-19. Oficialmente, porém, a SAP (Secretaria da Administração Penitenciária) não revela quantos casos suspeitos, confirmados e descartados foram registrados nos presídios paulistas.
Nós, trabalhadores, estamos decepcionados. A gente tem que brigar pelo mínimo de segurança, para ter álcool gel, máscara, luva, o mínimo mesmo."
José (nome fictício), agente penitenciário paulista
Segundo José, esses itens estão disponíveis, mas em pequena quantidade e sem abranger todos os setores. "Na hora que você precisa, se você cobra, é até mal visto. Eu não queria estar aqui, eu posso morrer com isso, eu queria estar trabalhando. Só estou isolado porque fui obrigado. E talvez tenha pegado o vírus dentro do meu trabalho."
Outros funcionários da unidade, como pessoas acima de 61 anos ou que integrem grupos de risco, fizeram uso de licença-prêmio, que é quando o governo cede três meses a servidores assíduos no trabalho.
Plano de contingência
Por meio de nota, a SAP (Secretaria da Administração Penitenciária) informou que foi elaborado um plano de contingência para caso haja suspeita de contaminação de coronavírus em alguma unidade prisional do estado.
"Todo servidor com suspeita de diagnóstico da covid-19 está devidamente afastado sob medidas de isolamento em sua residência, conforme orientações do Comitê de Contingência do coronavírus, e a secretaria acompanha seu quadro clínico, fornecendo todo o suporte necessário para sua recuperação", diz a pasta.
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