Covid-19: ritmo de aumento de casos coloca Brasil em patamar preocupante?
Resumo da notícia
- Ministério da Saúde aponta que o país está chegando à fase crítica da pandemia do novo coronavírus
- O crescimento do número de casos está ocorrendo conforme o esperado, mas o ministério admite que pode haver erros na coleta de dados
- Outra preocupação do ministério é que o Brasil terá pelo menos três epidemias simultâneas: coronavírus, influenza e dengue
- Especialistas dizem que os dados justificam a preocupação e que o isolamento social é uma medida necessária
Em quase 20 dias, o Brasil viu o número de casos do novo coronavírus ser multiplicado por cem. Desde 11 de março, pacientes são diagnosticados com a covid-19 todos os dias. Mas, se no começo a quantidade deles crescia na casa das dezenas, o aumento passou para as centenas nos últimos dias.
O Ministério da Saúde aponta que o país está chegando à fase crítica da pandemia. E especialistas consultados pelo UOL dizem que os dados justificam a preocupação.
"A previsão é de que vamos ter 30 dias muito difíceis. Não vamos começar a reduzir os casos em 30 dias", disse o secretário executivo da pasta, João Gabbardo dos Reis, em pronunciamento à imprensa anteontem (26). O primeiro caso no país foi anunciado em 26 de fevereiro.
Para a equipe da Saúde, a pandemia tem um ciclo natural. "E ela só vai começar a reduzir o número de casos quando nós tivermos pelo menos 50% da população já com contato com a doença", comentou Gabbardo.
"Dentro do esperado"
De acordo com a última atualização do governo federal, o Brasil possui 3.904 casos da doença, que já causou a morte de 111 pessoas. "Acho que os números estão aproximadamente dentro do que a gente esperava", afirmou o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, na quarta-feira (25).
O ministério tem usado como referência as situações de Itália, França e Alemanha. Os três países europeus têm grande número de casos, mas se diferenciam pela quantidade de mortes. A Itália tem a maior taxa de letalidade desse grupo, cerca de 10%, enquanto a Alemanha, a menor: quase 0,6%. Na França, a taxa está em torno de 6%.
A comparação com esses países considera a situação a partir do dia em que cada um contabilizou seu centésimo caso:
Casos registrados em 11 dias a partir do 100º paciente:
- Itália: 3.726
- Brasil: 2.312
- França: 2.181
- Alemanha: 1.456
"E o Brasil segue, até o dia 11 após o centésimo caso, dentro da média [esperada para o número de casos]", apontou Gabbardo, em pronunciamento à imprensa. O Brasil chegou à marca no dia 26 de março.
Dificuldades com números
O ministério admite que pode haver diferenças com o número real de casos de coronavírus no Brasil, devido à forma como o dado é repassado. "Ainda temos uma dificuldade muito grande com o registro da informação", disse o secretário de Vigilância Sanitária da pasta, Wanderson de Oliveira.
"Ainda tivemos que fazer, por um bom tempo, coleta de dado por telefone, ligando estado por estado. É muito complexo, o risco de erro é muito grande", comentou Oliveira. Ele espera que o novo sistema implementando em razão da pandemia seja um legado para a rede nacional de vigilância epidemiológica.
Covid-19 e influenza juntos
Para o secretário de Vigilância Sanitária, haverá uma diferença no caso do Brasil, em comparação com os principais focos do novo coronavírus. "Na China e na Itália, os surtos de influenza aconteceram antes dos picos de coronavírus. No Brasil, a curva de coronavírus vai acontecer no momento do pico de influenza. Então, nós vamos ter uma tempestade perfeita."
Por isso, Wanderson prevê que o "número de casos vai aumentar significativamente" e lembra que o Brasil terá pelo menos três epidemias simultâneas: coronavírus, influenza e dengue. Por isso, ele pede que a população se vacine contra influenza.
O ministério diz que, nas últimas 13 semanas, 11.257 pessoas foram internadas com síndrome respiratória aguda grave. Delas, 391 estavam com coronavírus.
Projeção depende
Hoje, o governo trabalha com a tese de que, a cada três dias, o número de casos dobre no país, o que daria uma média de crescimento diária de 33%. De acordo com Gabbardo, o dado brasileiro está abaixo dessa projeção, ficando em cerca de 31%.
O secretário executivo, porém, diz que projetar o número de casos no Brasil depende de duas variáveis: transmissão da doença e quantidade de testes. "Quanto mais testes nós fizermos, maior vai ser a identificação do número de casos. Essa é uma questão óbvia", observou Gabardo. "Vamos fazer o possível para ter o menor número possível de casos. E vamos fazer o possível para ter o menor número de óbitos."
Para o médico infectologista Fernando Bellissimo, professor da USP (Universidade de São Paulo), o ritmo de crescimento da pandemia no Brasil é motivo de preocupação. "Mas não há indícios concretos de que ela vá se comportar aqui como se comportou na Itália", pontua.
Bellissimo acredita que, como o exemplo dos italianos mostra, se houver medidas preventivas, "tenho esperança de que a nossa curva epidêmica seja mais suave do que a deles".
Isolamento necessário
O Ministério da Saúde também admite que a perspectiva no Brasil poderia ser pior. "Se nós não tomássemos nenhuma medida, a expectativa de crescimento seria muito maior", comentou o secretário executivo Gabbardo. A pasta tem recomendando o isolamento social, principalmente para pessoas com sintomas da covid-19 e quem teve contato com elas.
"Essas medidas que estão sendo tomadas, de isolamento social, a gente torce para que impacte. Se impactar, pode ser que a gente consiga desacelerar isso", avaliou o Diretor da Sociedade Paulista de Infectologia, Evaldo Stanislau, que atua no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
Mas a expectativa do ministério é que, com o aumento do número de testes, haverá um natural crescimento na quantidade de casos. Atualmente, o Brasil tem capacidade para produzir 6.700 testes por dia. A meta é produzir de 30.000 e 50.000 testes por dia.
"Como ainda estamos ampliando a nossa capacidade [de testes], estamos focando nos casos sintomáticos", disse Gabbardo.
Segundo Stanislau, a quantidade de testes pode ser um fator para, mais adiante, o Brasil decidir sobre o fim de medidas de isolamento. "A gente pode, talvez, fazer o movimento de ampliar a testagem para ser mais cirúrgico. Mas, no momento, não há nada mais a fazer do que o isolamento social. O extremo 'fecha tudo', nesse momento, é o extremo do bom senso, do equilíbrio", finaliza o infectologista.
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