Número real de mortos no Brasil por covid-19 pode estar perto de 2.000
Resumo da notícia
- Pasta divulga atualização retroativa de mortos e números chegam a dobrar
- Falta de testes e fila para análise das amostras ajudam a justificar déficit
- Mortes levam até duas semanas para se tornarem estatística
Quando o Ministério da Saúde divulga, todos os dias, as mortes pelo coronavírus, há sempre uma certeza: o número é (bem) menor do que o atual porque traz dados defasados. Como os exames para detectar covid-19 demoram a ser processados, muitas pessoas já morreram por efeito do vírus, mas ainda não estão nas estatísticas.
No sábado, ao anunciar 1.124 mortes no país, o ministério divulgou mais 68 óbitos na contagem oficial. Mas dados da própria pasta mostram que somente 13 pessoas das contabilizadas ontem haviam de fato deixado de respirar na data. Os 55 restantes morreram nos dias anteriores, mas só ontem saiu a confirmação de que a covid-19 foi a causa da morte — um padrão que tem se repetido nas últimas semanas.
Para entender o tamanho desse efeito, o UOL avaliou outra estatística divulgada diariamente pelo Ministério da Saúde: o número de óbitos na data em que de fato as pessoas morreram. A análise dos dados sugere uma proporção: até duas semanas atrás, eram cerca de duas pessoas mortas de fato para cada morte oficial.
O boletim deste sábado (11), por exemplo, trazia uma morte de 17 de março — 25 dias atrás. Esse é, entretanto, um caso extremo. O prazo para que a maior parte dos pacientes fatais entre para a estatística do Ministério da Saúde tem sido de 10 a 14 dias.
Observando o gráfico inserido nesta reportagem, pode-se entender o efeito prático:
- 17 de março, o ministério anuncia 1ª morte por covid-19 no país; na realidade, havia 6 mortos
- 18 de março, o ministério anuncia 4 mortes; hoje, sabe-se que havia 11
- 19 de março, 6 mortes contabilizadas; mas a realidade eram três vezes o dado oficial: 18 mortes.
Mais do que discrepâncias pontuais, a diferença entre dado oficial e mortes causadas pela covid-19 se revela um padrão.
Em 22 de março, por exemplo, o dado oficial confirmava 25 mortes, que foram hoje atualizadas para 51. Os 34 óbitos de 23 de março já chegaram a 78.
Para entender como novas mortes vão sendo alocadas no dia em que ocorreram, a reportagem comparou os levantamentos dos dias 8 e 11 (ou seja, quarta e sábado). Foram incluídas nesse período:
- 1 nova morte para os dia 17, 18, 20, 21, 24, 27 e 29 de março;
- 2 novas mortes para o dia 26;
- 3 novas mortes para o dia 23;
- 4 para o dia 30;
- 5 para o dia 28;
- 6 para o dia 2;
- 8 para os dias 31 e 1º de abril.
Quanto mais perto se chega da data, maiores são as inclusões: nos dias 3 e 4, foram 22 novas mortes alocadas em cada; 20 no dia 5, 24 no dia 6, 28 no dia 7 e 50 no dia 8.
A diferença diminui à medida que o levantamento se aproxima das datas atuais, provavelmente não porque estão morrendo menos pessoas, mas porque ainda há muitas mortes por computar nos estados e municípios. Além do atraso nos exames, há ainda um outro fator: 191 mortes que já compõem as atuais 1.124 divulgadas pelo governo não foram incluídas no boletim que leva em conta a data em que elas ocorreram porque ainda estão "em investigação".
Por tudo isso, se o número de mortes não tiver desacelerado abruptamente, na contramão de todos os outros índices crescentes, o número total de mortos pelo coronavírus provavelmente está muito mais perto de 2.000 do que de 1.000.
Por que demora tanto?
O Ministério da Saúde afirma que o atraso ocorre por conta da demora no processamento dos resultados de exames. A pasta só é notificada por estados e municípios após a confirmação dos testes de laboratório, que podem ficar prontos dias após a morte dos pacientes com suspeita de contaminação pelo novo coronavírus.
Não só faltam testes para todos os casos suspeitos, como há demora no processamento do material recolhido. Apenas em São Paulo, até 1º de abril, havia se formado uma fila de 16 mil exames que o estado não havia conseguido processar. Dentre eles, 201 eram de pacientes que morreram. Na última terça, o IAL (Instituto Adolfo Lutz) — laboratório de referência da rede pública paulista — havia processado apenas 24% do total de exames recebidos.
Há ainda outros motivos que indicam mais óbitos por coronavírus do que informam os balanços oficiais: a explosão de hospitalizações por insuficiência respiratória grave; uma resolução que determina que não sejam feitas autópsias para confirmação da morte em casos suspeitos devido a risco de contaminação; e o número de registros de mortes suspeitas em cartórios, que é maior que o dado oficial.
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