Chefe de UTI do Emilio Ribas relata desafios: 'nunca vivenciamos isso'
Chefe da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, o médico Jaques Sztajnbok escreveu um relato para o jornal O Globo descrevendo o seu cotidiano no hospital de São Paulo desde que a pandemia do novo coronavírus chegou ao Brasil.
"Lidar com pacientes graves é o nosso dia a dia. Isso não mudou. Mas todos os pacientes agora têm a mesma situação. Nunca vivenciamos isso", disse Sztajnbok, que trabalha há 28 anos no hospital e já enfrentou epidemias como a do sarampo e da H1N1
Com a UTI 100% ocupada, o médico disse que ainda não enfrentou a situação de ter apenas um ventilador para dois pacientes. Porém, os pedidos de internação na unidade já estão sendo selecionados diante da lotação.
"Quando você tem uma vaga e cem solicitações de pessoas que você pode não estar vendo, mas cada ficha daquela é um paciente de São Paulo que está precisando, é uma situação ruim. E a escolha não é fácil", disse.
"Às vezes são três pacientes para a mesma vaga em uma solicitação. Você dá vaga para um e pensa no que aconteceu com os outros. Mas ainda imagina que ele está no sistema, está na rede, e que alguém vai achar uma vaga para esse. Você quer acreditar nisso. Mas, quando tudo fica cheio, acabamos não vendo", completou.
Sztajnbok ainda disse que já há um caso de médico afastado do trabalho no hospital por causa de covid-19 - além de outros dois que são do grupo de risco e não estão escalados. Isso faz com que exista a preocupação com a sobrecarga dos profissionais.
"No hospital já tem mais gente. A questão é saber quem vai ser o próximo. Só esperamos que não sejam todos ao mesmo tempo, porque não temos muita peça de reposição", disse.
O médico disse que está indo praticamente todos os dias ao hospital e que o exercício do ofício em situação crítica também permite momentos gratificantes. "Tem uns momentos que valem a pena. Hoje extubamos uma senhora de 71 anos, ela tinha quadro gravíssimo. Só de ventilação mecânica foram 14 dias. Teve alteração de função renal, e foi extubada hoje, conversou consciente, e estamos prevendo alta para ela amanhã. Foi incrível", disse.
Ele ainda relatou o cuidado que é preciso ter com os equipamentos de segurança, principalmente após horas de trabalho e que cada dia se trata de descobertas novas.
"Tratar desses pacientes é literalmente coisa para gente grande. Não é só o aparelho de ventilação que vai resolver o problema. Tem que ter intensivista bom, experimentado, para lidar com casos de complicação", disse, ressaltando ainda o esforço dos residentes.
Assim, dia a dia, ele diz que continuará exercendo o seu ofício em busca de desfechos positivos. "Especificamente nesses pacientes vibro quando vejo algo novo funcionando, quando há um desfecho bom em um cenário tão escuro. Parece que ganhamos a partida. Três altas hoje, 3 a 0 para a gente".
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