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Sem UTI e agora sem insumos: interior do AM vive drama para tratar covid-19

Município de Santo Antônio do Içá contrata helicóptero para levar testes para Manaus: "a gente gasta o que não tem", diz secretário - Divulgação / Secretaria de Saúde de Santo Antônio do Içá
Município de Santo Antônio do Içá contrata helicóptero para levar testes para Manaus: "a gente gasta o que não tem", diz secretário Imagem: Divulgação / Secretaria de Saúde de Santo Antônio do Içá

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

24/04/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Municípios localizados na floresta amazônica enfrentam dificuldades para receber materiais e insumos para a saúde pública
  • Cidades sofrem pela falta de estrutura para tratar casos mais graves, e os pacientes precisam ser transferidos de avião para Manaus
  • Secretários municipais pediram ajuda a políticos, para que consigam apoio do Ministério da Defesa na entrega de insumos
  • O Ministério da Defesa, porém, informa que não recebeu essa solicitação
  • Governo do Amazonas diz que "tem prestado todo o auxílio necessário aos prefeitos no enfrentamento da pandemia"

Sem acessos por meio terrestre, municípios do Amazonas localizados na floresta amazônica estão enfrentando uma série de dificuldades para receber materiais e insumos para a saúde pública, o que dificulta o enfrentamento da covid-19 em meio à pandemia. Além disso, as cidades sofrem pela falta de estrutura para tratar casos mais graves, e os pacientes precisam ser transferidos de avião para Manaus. Os relatos são de dias dramáticos.

"Aqui falta tudo, inclusive sangue para os demais procedimentos. As logísticas ficaram comprometidas pela falta de lancha", diz Francisco Ferreira Azevedo, secretário de Saúde de Santo Antônio do Içá, município que registrou o primeiro caso de um índio diagnosticado com o novo coronavírus, em 1º de abril.

Segundo o boletim estadual divulgado ontem, o Amazonas registrou mais 409 casos de covid-19 em apenas 24 horas, totalizando agora 2.888 casos. Também foram confirmadas mais 28 mortes pela doença, subindo para 234 no total.

A maioria das cidades do interior do estado depende do transporte fluvial para o carregamento de insumos, mas agora ele está suspenso por determinação do governo do estado. Para conseguir enviar exames para análise em Manaus, é preciso fretar voos, que são caros — o valor aumentou nesse período de pandemia.

Segundo o presidente do Cosems (Conselho dos Secretários Municipais de Saúde) do Amazonas, Januário Cunha, "o estado perdeu o controle da situação".

"Estamos com sérios problemas aqui no interior. Por exemplo, estamos sem saber quando vamos receber os insumos por parte do estado. Temos pouquíssimos EPIs (equipamentos de proteção individual) e teste rápidos. Além disso, temos dificuldade de logística de levar vacinas e imunoderivados", afirma Cunha.

Por conta da dificuldade, o presidente do Cosems conta que pediu ajuda a políticos paraenses em Brasília, para que consigam apoio do Ministério da Defesa na entrega de insumos. "A gente precisa de mais celeridade. Por isso, estamos pedindo o auxílio das Forças Armadas para os municípios não ficarem desabastecidos."

Entretanto, contatado pelo UOL, o Ministério da Defesa, que coordena a Operação Covid-19, informa que não recebeu solicitação de municípios do estado do Amazonas para transporte de insumos.

A pasta diz que, desde o dia 16 de março, foi instituído um "Gabinete de Crise" para articular e monitorar as ações interministeriais de enfrentamento ao novo coronavírus. "Todas as demandas recebidas pelo Ministério da Defesa, dentro da Operação Covid-19, são analisadas individualmente para planejamento e execução, sendo que, de acordo com a solicitação, podem ser encaminhadas ao Gabinete de Crise, que determina a melhor forma de atendimento", explica.

Tribos vulneráveis

Sem ajuda para logística, os municípios sofrem devido à ausência de uma série de produtos. Em Santo Antônio do Içá há um agravante, já que as tribos indígenas precisam de cuidados especiais, e não há leitos de terapia intensiva.

"Não temos respiradores, bomba de infusão, entre outros equipamentos necessários para este momento. Já tivemos 12 casos confirmados de covid-19, inclusive em indígenas", alega o secretário Azevedo.

Em Amaturá também há preocupação com os indígenas. "Estamos isolados em relação à logística, seja ela de barco, lancha ou avião. Estamos à mercê da sorte, sem vacina, sem insumos, sem equipamentos adequados para atendermos qualquer caso grave", relata a secretária de Saúde do município, Nazaré Silva. "Aqui temos ainda 50% de população indígena altamente vulnerável. Agora está ficando sem oxigênio."

Estado diz que auxilia prefeitos

Em nota ao UOL, o Governo do Amazonas afirma que "tem prestado todo o auxílio necessário aos prefeitos no enfrentamento da pandemia".

"Os municípios do Amazonas já receberam até aqui 389,5 mil itens de EPIs, como máscaras, luvas, álcool, aventais e gorros desde o final do mês passado. Além dos EPIs, foram enviados kits para coleta de amostra biológica de pacientes suspeitos."

O governo diz ainda que a primeira parcela do Fundo de Fomento ao Turismo, Infraestrutura, Serviços e Interiorização do Desenvolvimento do Amazonas do ano de 2020, no valor de R$ 23,4 milhões, também já começou a ser liberada aos municípios do interior, para que o dinheiro seja aplicado em ações de combate à pandemia do novo coronavírus.

"O Estado também dispõe de seis aeronaves para UTI Aérea, três delas exclusivas para atender casos de coronavírus. Cada aeronave está equipada com todo o aparato necessário para realizar os atendimentos e tem capacidade para transportar até dois pacientes. Além disso, nos municípios de acesso terrestre, foram colocadas ambulâncias exclusivas para a remoção desses pacientes de covid-19", finaliza.