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#EleNão: as mulheres fazem resistência à liderança de Bolsonaro

27/09/2018 09h59

Rio de Janeiro, 27 Set 2018 (AFP) - O candidato de extrema direita Jair Bolsonaro encontra uma trincheira de resistência entre as brasileiras, que podem inclinar a balança contra ele e fazê-lo pagar, assim, por um histórico de comentários misóginos.

O lema é bem simples: "Ele Não, Ele Nunca". Teve início com um grupo no Facebook batizado "Mulheres unidas contra Bolsonaro", contra "o machismo, a misoginia e os preconceitos" e em poucas semanas reuniu cerca de três milhões de integrantes.

Com a hashtag #EleNão, milhares de mulheres confirmaram presença em protestos convocados para sábado, 29 de setembro, em 70 cidades do Brasil e em uma dezena de países, de Argentina até Portugal, Estados Unidos, Holanda ou Reino Unido.

Uma frente inesperada de oposição ao ex-capitão do exército, de 63 anos, que lidera as pesquisas para o primeiro turno de 7 de outubro.

"É um movimento muito amplo. Não é inclusive falando em quem tem que votar nem nada. Nós nos unimos numa questão: ele não! Bolsonaro não", explicou à AFP Linnesh Ramos, integrante do coletivo feminista Juntas!.

"Bolsonaro representa uma política que vai contra todos os direitos conquistados ao longo da história", completa.

Bolsonaro, deputado desde 1991, ganhou grande parte de sua fama com frases misóginas e homofóbicas, sua nostalgia da ditadura militar (1964-1985) e um discurso contrário ao que considera "ideologia de gênero".

Em 2014, afirmou à deputada Maria do Rosário que ela não "merecia ser estuprada por ser muito feita". No mesmo ano chamou uma jornalista de "idiota" e "analfabeta".

Recentemente justificou salários menores para as mulheres em relação aos homens. E seu candidato a vice, o general da reserva Antônio Hamilton Mourão, provocou mais polêmica ao afirmar que famílias sem pai e avô em áreas pobres são "fábrica de elementos desajustados".

- Evitar outro Trump? -A mobilização de sábado é "extremamente necessária", afirma Juciara Áwo, atriz de 35 anos do Rio de Janeiro. "O país está vivendo um momento de energia complicada e tem um candidato que apoia o fascismo, a homofobia, o racismo, o machismo".

A candidata a deputada federal pelo PSOL Taliria Petrone acredita que "a derrota deste setor vai acontecer pelas mãos das mulheres".

"Se chegar à presidência da República seria uma tragédia para o Brasil", disse à AFP.

"Não tenho notícia, registro, de uma mobilização tão ampla e tão permeável em relação às mulheres na história do Brasil", afirma Lígia Fabris Campos, professora de Direito na Fundação Getúlio Vargas (FGV).

A acadêmica vincula a mobilização à eleição de Donald Trump nos Estados Unidos. "Embora sejam diferentes em muitos aspectos, em relação a posturas, em relação às mulheres, eles são similares. Porque tanto na história das eleições dos Estados Unidos como na história das eleições do Brasil nenhum candidato abertamente e publicamente havia feito ou falado coisas claramente sexistas como os dois fizeram".

A professora afirmou que a diferença, em sua avaliação, é que as mulheres americanas não consideravam seriamente que Trump poderia ser eleito. "A partir da experiência nos Estados Unidos, as mulheres se mobilizam para evitar que aconteça o mesmo", explica.

- "Bolsonaro sim" -Enquanto o candito se recupera no hospital de uma facada que recebeu em 6 de setembro durante um comício em Juiz de Fora, os seus simpatizantes foram rápidos em responder à mobilização através da criação de grupos de "Mulheres com Bolsonaro" e "Mulheres com fibra e coragem não precisam de feminismo".

Entre os seus defensores Sara Winter, ex-integrante da filial brasileira da organização feminista Femen que agora renega o feminismo e aspira a tornar-se deputada com um discurso em favor da família, segurança e contra o aborto.

"Não há 'mulheres contra o Bolsonaro', há mulheres da esquerda contra o Bolsonaro", disse Winter à AFP. "As mulheres brasileiras devem votar no Bolsonaro porque é o único político sem acusações de corrupção, é o único que inspira medo no estuprador, que tem projetos para que o ambiente em que as mulheres vivem, trabalham ou a rua, seja um lugar mais seguro para as mulheres", afirmou.

O candidato propõe aumentar a pena para estupradores, estabelecer castração química e permitir o porte de armas para os "cidadãos de bem".

Como Sara, Lilian Queiroz acredita que a maioria das acusações contra o Bolsonaro são falsas. "A esquerda diz muitas coisas que não são verdadeiras, são falsas", assegurou.

O voto feminino (52% do total) certamente será essencial em uma eleição polarizada.

Segundo o Datafolha, apesar de metade das mulheres afirmar que não decidiu seu voto ou pretende votar em branco, 50% têm certeza de uma coisa: nunca votaria em Bolsonaro.

Uma resistência que pode ser decisiva no segundo turno de 28 de outubro, no qual, de acordo com as pesquisas atuais, Bolsonaro pode enfrentar Fernando Haddad, do Partido dos Trabalhadores (PT).