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Presidente colombiano enfrenta protestos e críticas por manejo da crise

07.mai.2021 - Manifestantes participam de um protesto em Bogotá, contra a desigualdade nos sistemas públicos de educação e saúde - REUTERS/Luisa Gonzalez
07.mai.2021 - Manifestantes participam de um protesto em Bogotá, contra a desigualdade nos sistemas públicos de educação e saúde Imagem: REUTERS/Luisa Gonzalez

09/05/2021 12h02

Com as ruas ardendo contra seu governo, Iván Duque parece errático e desconectado de uma Colômbia em crise, de acordo com analistas. Centenas de milhares de pessoas saíram às ruas para protestar contra seu governo desde 28 de abril.

O país, empobrecido pela pandemia e com a violência de volta depois do pacto de paz com a poderosa guerrilha das FARC, voltou sua frustração para o presidente de 44 anos.

Em 2019, um movimento estudantil sem precedentes deu o primeiro aviso ao presidente. Desde então, exige uma mudança no rumo político.

Após décadas de estigmatização da contestação social - então ligada à insurgência armada - os jovens perderam o medo da mobilização, assim como os sindicatos, caminhoneiros e indígenas.

Embora em sua maioria pacíficos, os protestos nos últimos dias deixaram pelo menos 26 mortos e mil feridos entre manifestantes e agentes.

A força pública está na mira, até mesmo da comunidade internacional, pela repressão aos manifestantes. Enquanto isso, o governo se protege na retórica do vandalismo, da infiltração de grupos armados, de ataques coordenados contra a polícia.

Duque "transmite uma imagem de estar desconectado da realidade", disse à AFP Jairo Libreros, analista político da Universidade Externado.

Após quatro dias de pressão nas ruas, Duque retirou o projeto de reforma tributária que punia a classe média e que gerou protestos. No dia seguinte, o ministro da Fazenda renunciou. E uma semana após o início das mobilizações, o presidente cedeu ao diálogo, embora primeiro tenha convidado os que não foram às ruas.

Para Sandra Borda, analista da Universidad de Los Andes, é "uma conversa entre eles e eles próprios".

Diante da persistência da contestação, o governo implantou 47,5 mil soldados em todo o país, para "garantir a tranquilidade".

A comunidade internacional denunciou em uníssono as agressões das forças de segurança durante as manifestações.

Essa decisão "foi como atear gasolina à fogueira, uma medida pouco assertiva que confirma a desconexão que existe entre a Presidência e problemas que são eminentemente sociais", indica Libreros.

Números questionados

Desde o início da pandemia no país, em março de 2020, Duque apareceu diariamente na televisão. O espaço tornou as coletivas de imprensa e entrevistas menos frequentes.

É "um espaço bolha, (...) um círculo fechado", sem espaço para debate, comenta Yann Basset, especialista da Universidad del Rosario.

Em meio ao caos da agitação que se seguiu aos protestos, a confusão também reina sobre os números.

Em Cali, por exemplo, sete pessoas morreram segundo a prefeitura e 15 segundo o Ministério Público. Já para a ONG Temblores, foram 47 mortes no total, 35 delas naquela cidade.

"As entidades que deveriam se encarregar de garantir a segurança das pessoas (...) são todos órgãos de segurança que o governo cooptou e onde colocou amigos próximos do presidente", diz Borda.

Os dados aumentaram a desconfiança nas instituições. E para a analista Laura Gil "os vídeos (de abusos policiais) são tão contundentes que os números não importam".

"Com a militarização das cidades e os abusos da polícia (...) perdeu o apoio da comunidade internacional", acrescenta.

Duque ignorou especialistas, acadêmicos, adversários e até aliados quando o alertaram sobre o inconveniente de um aumento dos impostos em meio à pandemia.

"Todos o avisaram que não era politicamente viável", explica Basset. "Isso mostra bem a incapacidade do governo de interpretar a situação".

A iniciativa buscava aumentar o ICMS sobre alguns produtos e ampliar a base de contribuintes, em um país onde 42,5% da população é pobre e 16,8% desempregada.