Grampo pega vereador do Podemos cobrando propina de pagodeiro do PCC
No rastro de fraudes em licitações sob influência do PCC, que infiltrou uma quadrilha em prefeituras e câmaras municipais do interior e da Grande São Paulo, os investigadores da Operação Muditia, do Ministério Público estadual, grampearam mensagens que revelam a suposta combinação de propina entre o suposto cabeça do esquema, o cantor de pagode Vagner Borges Dias, o Latrell Britto, e o vereador Flávio Batista de Souza (Podemos), o Inha, de Ferraz de Vasconcelos. Os diálogos mostram detalhes sobre o acerto de valores e também como o pagamento seria feito.
Até a publicação deste texto, a reportagem do Estadão buscou contato com as defesas de Inha e de Latrell, mas sem sucesso. O espaço está aberto para manifestação.
Inha foi preso na semana passada. Ele está no Centro de Detenção Provisória (CDP) de Mogi das Cruzes — onde tem recebido a visita de servidores graduados da prefeitura e da Câmara de Ferraz. Exerce seu terceiro mandato de vereador. Já foi vice-prefeito (2008-2012) e secretário municipal de Transportes (2014-2016), período em que, segundo a oposição, brecava qualquer projeto de licitação para concessão de transportes.
Uma conversa que reforça as suspeitas sobre o vereador data de junho de 2020. Após ligação de Inha, o pagodeiro diz: "Verdade, tinha esquecido. Pega 7 aqui, ficam faltando 500 que mando mês que vem". Antes, Latrell Britto teria encaminhado ao vereador o valor de R$ 267 mil, referentes, segundo a Promotoria, a montantes pagos mensalmente pela Prefeitura por contratos de serviços de limpeza — Latrell é dono da Vagner Borges Dias ME.
"Os valores repassados ao agente político são claro percentual do contrato das empresas investigadas com a prefeitura", ressaltaram os promotores ao pedirem à Justiça autorização para abertura da Operação Muditia.
O cálculo do repasse é descrito pelo próprio Latrell Britto em uma mensagem interceptada, destacam os promotores. O suposto operador fala em 7% de propina. Os investigadores cruzaram os valores descritos na conversa e identificaram que o montante citado pelo pagodeiro correspondia a exatos 7% do valor das notas pagas pela prefeitura à sua empresa.
A Operação Muditia, aberta no último dia tal, levou à prisão de três vereadores: Flávio Batista de Souza (Podemos), o Inha, de Ferraz de Vasconcelos; Luiz Carlos Alves Dias (MDB), o Luizão Arquiteto, de Santa Isabel; e Ricardo Queixão (Podemos), de Cubatão.
A força-tarefa mobilizou 27 promotores de Justiça e 200 policiais militares. Por ordem da juíza Priscila Devechi Ferraz Maia, da 5ª Vara Criminal de Guarulhos foram capturados 13 alvos. A investigação aponta fraudes que superam R$ 200 milhões e envolvem, além de políticos, servidores de gestões municipais, inclusive procuradores e secretários.
"Nas palavras de Vagner, a movimentação é verdadeira operação para assegurar, mensalmente, após a cobrança do vereador, a parcela escusa do contrato repassada aos agentes políticos", diz o MP.
Os grampos mostram a operacionalização dos repasses, em diferentes meses. Em uma ocasião, ainda em junho de 2020, Vagner questiona Inha se ele conseguiria pegar a propina em seu escritório. Em outro diálogo, em outubro daquele ano, o suposto cabeça do esquema pede a uma funcionária de seu escritório que "separe 17 mil para o Inha".
A funcionária de Latrell enviou ao vereador até uma imagem do cofre do chefe, para prestar contas do valor retirado.
De acordo com os investigadores, os pagamentos se repetem e se acumulam quando não são realizados, "com notável cobrança" do vereador de Ferraz. Os promotores dizem que a "ânsia" de Inha faz com que os investigados acertem o pagamento via Pix, em nome de terceiros.
Em outras mensagens que o MP interceptou, os promotores identificaram que o pagodeiro enviou uma planilha a Inha, após ser cobrado sobre a "finalização" do pagamento. A tabela, para a Promotoria, "atesta a vinculação dos pagamentos ao contrato de empresas investigadas com a prefeitura de Ferraz de Vasconcelos, como verdadeiro percentual de propina pagos aos agentes públicos".
Os investigadores constataram que as notas fiscais listadas na planilha encaminhada a Inha apresentam valores que "correspondem precisamente aos empenhos pagos para a empresa de Vagner".
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