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Por que o policial morto a facadas por autor de ataque em Londres não estava armado?

Keith Palmer, policial morto no ataque em Londres - Divulgação
Keith Palmer, policial morto no ataque em Londres Imagem: Divulgação

23/03/2017 14h22

O policial Keith Palmer, de 48 anos, fazia parte do corpo de segurança do Parlamento britânico, quando, na tarde desta quarta-feira, foi esfaqueado por um homem que, momentos antes, havia atropelado dezenas de pessoas. Ele não estava armado. Por quê?

Para os brasileiros, que estão acostumados a ver a polícia andando com revólveres amarrados à cintura, o episódio causa surpresa. Principalmente porque cabia a Palmer controlar o vai e vêm de pessoas na entrada do Palácio de Westminster, sede das duas câmaras parlamentares do Reino Unido (Câmara dos Comuns e Câmara dos Lordes) e mais famoso por abrigar o principal cartão-postal da cidade, o Big Ben.

Ocorre que, como Palmer, a imensa maioria dos policiais britânicos (com exceção da Irlanda do Norte) não anda armada. Do efetivo total de 124.066 agentes que atuam na Inglaterra e no País de Gales, só 5,639 (4,5%) têm direito ao porte de arma - na Escócia, esse percentual é ainda menor (3%).

E, mesmo assim, só as disparam em último caso - foi o que aconteceu na quarta-feira, quando o suspeito foi morto a tiros pela polícia.

É claro que existem exceções, muitas delas, trágicas - uma das mais conhecidas foi a morte do brasileiro Jean Charles de Menezes, confundido com um dos responsáveis pelos ataques a Londres em 2005.

Entre março de 2015 e março de 2016, policiais da Inglaterra e do País de Gales atiraram apenas sete vezes, segundo dados do Ministério do Interior britânico, os últimos disponíveis.

No ano passado, cinco pessoas foram mortas pelas mãos da mesma polícia. Para efeitos de comparação, esse número superou os 3 mil no Brasil, de acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Reforço na segurança

Nesta quinta-feira, a primeira-ministra do Reino Unido, Theresa May, anunciou um reforço na segurança, com mais policiais armados nas ruas do país.

Em meio à crescente preocupação com atentados, a decisão parece dividir opiniões.

Um levantamento recente feito com 13 mil pessoas pelo programa de TV This Morning, da emissora local ITV, indicou que oito em cada dez britânicos são a favor de os policiais passarem a andar armados, principalmente por causa da ameaça representada pelo grupo autodenominado Estado Islâmico, que reivindicou o ataque desta quarta-feira.

Mas nem sempre foi assim. Uma pesquisa realizada em abril de 2004 - portanto, antes dos ataques terroristas de 2005 - mostrou uma disputa mais acirrada. Na ocasião, 48% da população apoiava o uso de armas de fogo pela polícia, enquanto 48% eram contra.

Já os policiais discordam. Muitos deles temem ser processados caso apertem o gatilho, mesmo que os suspeitos ofereçam riscos à população.

Um levantamento feito em 2006 junto a mais de 47 mil integrantes da polícia revelou que 82% deles eram contra andar armado em serviço, apesar de metade ter dito que "correu sério risco de morte" nos três anos anteriores.

Vídeo flagra momento em que mulher cai de ponte durante ataque em Londres

Reuters

Histórico

Além do Reino Unido, poucos países seguem o exemplo britânico - entre eles, estão Irlanda, Nova Zelândia e Noruega.

Armar os policiais, dizem os opositores da polícia armada, minimizaria o princípio de "policiamento por consenso", em vez da ameaça ou do uso da força.

Por esse conceito, a polícia deve prestar contas, em primeiro lugar, ao público, e não ao Estado.

Tal lógica de segurança está associada às bases históricas da Justiça criminal britânica, como explicou à BBC Peter Waddington, professor de política social da Universidade de Wolverhampton.

"Grande parte das diretrizes do nosso policiamento foi concebida no início do século 19", afirmou ele, em entrevista publicada em 2012.

"Quando Robert Peel criou a Polícia Metropolitana (conhecida como Scotland Yard), havia um medo muito grande dos militares - o público temia que a nova força fosse opressora", acrescentou.

Nesse sentido, segundo Waddington, uma polícia que não carregasse armas de fogo rotineiramente - e se vestisse de azul, em vez de vermelho, cor associada à infantaria - era parte de um esforço para distingui-la do Exército.

Apesar de alguns policiais poderem carregar revólveres antes de 1936, daquela data em diante somente aqueles treinados, e no posto de sargento ou superior, tinham o direito ao porte. E mesmo assim, só se apresentassem um bom motivo para isso.

Proteção

Mas isso não quer dizer que a polícia britânica não tem meios de se proteger. Cada força policial tem sua própria unidade com poder de carregar armas de fogo.

Além disso, policiais treinados andam com tasers - armas de eletrochoque - desde 2004, apesar da polêmica envolvendo seu uso.