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Bolsonaro no Chile: De alinhamento ideológico e 'nova Unasul' a comércio, as razões de Bolsonaro para a visita

Marcos Correa - 1º.jan.19/Presidência da República/Reuters
Imagem: Marcos Correa - 1º.jan.19/Presidência da República/Reuters

Laís Alegretti - Enviada da BBC News Brasil a Santiago

21/03/2019 13h45

Presidente terá encontro com líderes de outros países da América do Sul marcado para sexta e para se reunir com o líder chileno, Sebastián Piñera, no sábado.

A escolha do Chile como primeiro destino de viagem na América do Sul do presidente Jair Bolsonaro é explicada pelo governo brasileiro com base em três motivações.

São elas: o alinhamento ideológico entre os dois presidentes, a oportunidade de reunir uma nova cúpula de países da América do Sul e o fato de o Chile ser o segundo principal parceiro comercial com o Brasil da região.

Essas foram as três razões apresentadas pelo porta-voz da Presidência, general Otávio Rêgo Barros, à BBC News Brasil.

Depois de abrir as visitas a chefes de Estado com a viagem aos Estados Unidos, o presidente Jair Bolsonaro chegou ao Chile na quinta-feira para um encontro com líderes de outros países da América do Sul na sexta-feira e para se reunir com o presidente chileno, Sebastián Piñera, no sábado.

Após a eleição de Bolsonaro, havia uma expectativa de que o Chile pudesse ser inclusive a primeira viagem internacional do presidente. Isso chegou a ser falado pelo hoje ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.

O economista e político Piñera foi um dos primeiros chefes de Estado, segundo o governo brasileiro, a telefonar para Bolsonaro após as eleições para felicitá-lo pela vitória e a confirmar presença na posse do novo presidente do Brasil.

Piñera voltou a ocupar o Palácio de La Moneda no ano passado, depois de vencer nas urnas o grupo de esquerda. Com a vitória dele, o Chile foi o primeiro país da região a romper a "onda" de governos de esquerda e de centro-esquerda.

O Itamaraty considera a visita de Bolsonaro ao Chile uma "oportunidade de inaugurar nova etapa do relacionamento bilateral e consolidar avanços obtidos em 2018".

Nova aliança na América do Sul

O esperado anúncio de um novo grupo de cooperação de países na América do Sul, o Prosur, pode significar uma mudança na organização do eixo de poder na região, de acordo com especialistas ouvidos pela BBC News Brasil.

A ideia é que a nova organização regional deixe para trás a Unasul, que ficou associada à era dos governos de esquerda na América Latina. Essa é uma forma de isolar ainda mais a Venezuela.

"É uma tentativa de criar um fórum de discussão dos países da América do Sul nessa nova era, que é uma era mais à direita ou de centro-direita", disse Vinícius Vieira, professor da FGV e doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Oxford.

O anúncio na capital chilena de uma aliança defendida fortemente por Piñera deve resultar, segundo especialistas, em uma força política maior do Chile e, ao mesmo tempo, em uma perda de protagonismo do Brasil.

"O encontro está sendo liderado pelo Chile e isso é um indicativo de que os demais players estão sendo um pouco ofuscados. É um indicativo de que o eixo de poder na América do Sul pode estar se deslocando do Atlântico para o Pacífico", afirmou Vieira.

Para o doutor em Relações Internacionais e professor da UnB Carlos Eduardo Vidigal, o Brasil deve se colocar em uma posição de liderança na América do Sul.

"O Brasil deve liderar qualquer processo de integração regional, e não o Chile. Pautar a política brasileira para a América do Sul ou para a América Latina pelo atual problema venezuelano não faz sentido em termos históricos", disse.

Comércio do Brasil e Chile

Vidigal, que é professor de História da América, diz que o Brasil e o Chile têm uma relação histórica de cordialidade e bom relacionamento, principalmente em termos políticos. Atualmente, segundo ele, um ponto interessante é que algumas empresas brasileiras têm criado sede em Santiago para usar os acordos de livre-comércio do Chile.

O Brasil tem cerca de US$ 4,5 bilhões em investimentos no Chile, especialmente nas áreas de energia, serviços financeiros, alimentos, mineração, siderurgia e construção. Ao mesmo tempo, o Brasil concentra mais de US$ 35 bilhões de investimentos externos do Chile, segundo dados do Itamaraty.

Em relação ao intercâmbio comercial dos dois países, contudo, Vidigal diz ver pouco espaço para avanços.

"É preciso tratar com cuidado a relevância do Chile para a economia brasileira em relação ao intercâmbio comercial. Acredito que já esteja saturado", afirmou Vidigal.

Segundo o governo brasileiro, o intercâmbio comercial foi de cerca de US$ 9,77 bilhões em 2018, o que representa um crescimento de 15% em relação ao ano anterior. O Chile compra do Brasil principalmente petróleo, carnes, automóveis e tratores. Ao mesmo tempo, o Brasil compra dos chilenos principalmente derivados de cobre, salmão e vinhos.

Vinícius Vieira aponta dois motivos pelos quais a relação comercial do Brasil com Chile não é mais intensa.

"A primeira questão é geográfica, já que não fazemos fronteira com o Chile e, por isso, não podemos usá-lo como rota para o pacífico. O outro ponto é que não temos complementariedade econômica, porque o Chile se inseriu na economia mundial fazendo acordos bilaterais e o que poderíamos vender mais a eles, eles já importam de outros mercados", explicou.

Bolsonaro chegará ao Chile na tarde desta quinta-feira, acompanhado pelos ministros Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Wagner Rosário (Controladoria-Geral da União). O chanceler Ernesto Araújo chegou antes a Santiago e tem reuniões com ministros de outros países da América do Sul. A ida ao Chile do deputado Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, também está prevista.


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O governo Bolsonaro teve início em 1º de janeiro de 2019, com a posse do presidente Jair Bolsonaro (então no PSL) e de seu vice-presidente, o general Hamilton Mourão (PRTB). Ao longo de seu mandato, Bolsonaro saiu do PSL e ficou sem partido até filiar ao PL para disputar a eleição de 2022, quando foi derrotado em sua tentativa de reeleição.