Como é a rotina na prisão mais segura dos EUA, lar de terroristas e espiões, que deve abrigar o traficante El Chapo
Narcotraficante mexicano, que já escapou de duas prisões de segurança máxima no passado, foi sentenciado nesta quarta-feira à prisão perpétua mais 30 anos.
Apelidada de "Alcatraz das Montanhas Rochosas", em referência ao mítico presídio da Califórnia, a penitenciária onde o traficante mexicano Joaquín Archivaldo Guzmán Loera, o "El Chapo", deve cumprir sua pena de prisão perpétua é a mais segura dos Estados Unidos e lar de alguns dos mais notórios criminosos do país, como Ted Kaczynski (o Unabomber), Terry Nichols (responsável pelo atentado de Oklahoma, em 1995) e Dzhokhar Tsarnaev (autor do atentado na Maratona de Boston, em 2013).
Aberta em 1994 em uma região remota nas montanhas do Estado do Colorado, a Supermax, também chamada de ADX Florence, é uma penitenciária federal de segurança máxima projetada para abrigar os presos "mais violentos" e que representam maior risco de fuga, segundo o Federal Bureau of Prisons (BOP), agência do Departamento de Justiça responsável pelo sistema federal de prisões.
A ADX Florence tem capacidade para 490 presos do sexo masculino e é parte do Complexo Penitenciário Federal de Florence, que inclui outras duas prisões. Quase todos os 376 detentos atualmente alojados na penitenciária, vários deles cumprindo múltiplas sentenças de prisão perpétua, passam 23 horas por dia isolados em celas individuais, com pouquíssimo contato humano.
El Chapo foi sentenciado nesta quarta-feira (17) à prisão perpétua mais 30 anos adicionais, depois de ter sido condenado em fevereiro por todas as dez acusações criminais contra ele, entre elas a de liderar uma organização criminosa e distribuir toneladas de cocaína, heroína e outras drogas. Durante os três meses de julgamento, os jurados ouviram relatos de testemunhas sobre assassinatos cometidos ou ordenados pelo líder do cartel de Sinaloa.
O BOP, que é a agência responsável por determinar onde o condenado deverá cumprir a pena, ainda não confirmou o destino final de El Chapo, mas analistas apostam que ele deverá cumprir sua pena na ADX Florence.
O narcotraficante bilionário já escapou de duas prisões de segurança máxima no México. Em 2001, teve ajuda de guardas e deixou a prisão escondido em um cesto de roupas sujas. Recapturado em 2014, fugiu de novo em 2015, desta vez por um túnel cavado em sua cela. Mas especialistas dizem que é impossível escapar da ADX Florence.
"É a prisão mais segura do planeta. Foi projetada especificamente para alojar os criminosos mais perigosos do mundo", diz à BBC News Brasil o advogado de defesa criminal e ex-promotor federal Duncan Levin.
Segundo Levin, a ADX Florence foi projetada especificamente para evitar fugas e também para impedir os detentos de ferir os guardas ou uns aos outros. O objetivo é que tenham o mínimo possível de interação humana.
"É um dos lugares mais desoladores da Terra. É desprovido de qualquer sinal externo de vida", ressalta Levin. "Todas as prisões são deprimentes. Mas esta é despida de humanidade."
Isolamento completo
Os detentos ficam em celas individuais de cerca de 7m², equipadas com cama, mesa e banco, todos feitos de concreto, além de um móvel que é combinação de pia e vaso sanitário e de um chuveiro de acionamento automático (no qual é preciso apertar um botão para que a água corra, por apenas alguns segundos de cada vez). As camas de concreto são cobertas por um fino colchão e têm dispositivos para imobilizar os presos, se necessário.
As celas têm grossas paredes de concreto e portas sólidas de metal, com um pequeno espaço que é aberto para a passagem de comida ou medicamentos, além de uma segunda porta interna. Como estão localizadas em apenas um lado do corredor, mesmo nos poucos momentos em que a porta é aberta os presos não conseguem ver uns aos outros.
Cada cela tem uma janela vertical, de apenas 10 cm de largura, cujo ângulo permite aos presos ver apenas um pedaço de céu, e nada mais. Algumas celas têm rádio ou TV, com programação educacional, religiosa e filmes selecionados pela administração, transmitidos em circuito fechado.
Segundo a advogada Deborah Golden, da organização de defesa dos direitos de prisioneiros Human Rights Defense Center, que visitou a ADX Florence diversas vezes, a principal diferença entre a penitenciária e outras prisões de segurança máxima é que lá os detentos são deixados na cela o tempo inteiro, completamente isolados.
"Em uma prisão normal de segurança máxima, apesar de ser um ambiente controlado, as pessoas podem sair da cela, caminhar, participar de atividades. Mas a Supermax é muito diferente de outras prisões de segurança máxima. Há pouquíssima interação humana", diz Golden à BBC News Brasil.
Sem contato humano
As refeições são entregues pela abertura da porta externa da cela. As limitadas interações com guardas, psiquiatras e outros funcionários também ocorrem dentro da cela. Os presos podem sair de sua cela apenas para tratamento médico que não possa ser administrado no local, visitação e recreação.
O tempo de recreação é limitado a uma ou duas horas diárias, e somente em dias de semana. Em alguns dias, os detentos são levados sozinhos a um ginásio sem janelas, dentro da prisão. Em outros, cada preso é escoltado por no mínimo três guardas a uma área com paredes de concreto e abertura - protegida por grades - no teto, onde é colocado em uma espécie de jaula individual.
No máximo cinco detentos, um em cada jaula, ficam nesse espaço externo ao mesmo tempo. Eles podem ver e conversar uns com os outros, mas o único contato físico possível é tocar a ponta dos dedos. Para aqueles considerados mais perigosos, ou que cometeram alguma infração, a recreação é em outra área, composta de pequenos espaços de concreto, com vista para o céu, mas totalmente isolados.
Não há nenhum contato físico com os visitantes, que ficam separados por uma grossa camada de vidro e conversam por meio de um telefone. Os presos não têm acesso a email e podem fazer no máximo três ligações telefônicas de 15 minutos por mês.
"Tudo na a ADX Florence, desde a estrutura física, a maneira como as celas são projetadas e todo o resto, tem o objetivo de minimizar o contato humano. Basicamente, é projetada para destruir as pessoas mentalmente", diz à BBC News Brasil o diretor-executivo do Human Rights Defense Center, Paul Wright.
Presos famosos
Assim como a Alcatraz original, que até ser fechada, em 1963, abrigou criminosos famosos, como o gangster Al Capone, a ADX Florence é lar de alguns dos mais notórios prisioneiros dos Estados Unidos. Terroristas domésticos e internacionais, membros de gangues e espiões estão presos lá.
Ted Kaczynski, o ex-professor de matemática conhecido como Unabomber, autor de uma série de ataques a bomba que deixaram três mortos e mais de 20 feridos entre 1978 e 1995, cumpre oito penas consecutivas prisão perpétua. Terry Nichols, condenado por seu papel no atentado de Oklahoma, que matou 168 pessoas em 1995, cumpre 161 penas de prisão perpétua consecutivas.
Outros detentos famosos que cumprem prisão perpétua são Zacarias Moussaoui, membro da al-Qaeda que participou do planejamento dos atentados de 11 de setembro de 2001, Ramzi Yousef, responsável pelo atentado ao World Trade Center em 1993, e Eric Rudolph, autor de vários ataques a bomba, entre eles o do Parque Olímpico de Atlanta, durante os jogos de 1996.
Dzhokhar Tsarnaev, responsável pelo atentado a bomba na Maratona de Boston em 2013, aguarda execução. O ex-agente do FBI Robert Hanssen, acusado de atuar como espião para os russos entre 1979 e 2001, cumpre 15 penas consecutivas de prisão perpétua.
Também cumprem prisão perpétua na ADX Florence o "homem do sapato bomba", Richard Reid, que em 2001 tentou explodir um avião da American Airlines com uma bomba escondida no calçado, e o "homem-bomba da cueca", Umar Farouk Abdulmutallab, que tentou explodir um avião com uma bomba escondida na roupa íntima.
Problemas mentais
Mas apesar da longa lista de prisioneiros famosos, muitos dos detentos não foram sentenciados diretamente à ADX Florence por causa da gravidade dos crimes que cometeram.
Em relatório de 2018, o District of Columbia Corrections Information Council (CIC), órgão independente de fiscalização de condições de confinamento, disse que 90% dos detentos na época haviam sido transferidos para lá após problemas disciplinares em outras penitenciárias, como tentativas de fuga ou ataques contra guardas e outros presos.
Vários desses detentos sofrem de doenças mentais e, segundo críticos, o isolamento agrava esses problemas. "Depois de cerca de duas semanas em regime de isolamento, o cérebro humano muda, e fica muito difícil interagir com outras pessoas", afirma Deborah Golden, do Human Rights Defense Center.
Duncan Levin salienta que, em outras prisões federais, há situações em que os detentos são colocados na solitária, para serem isolados do resto da população ou para sua própria segurança.
"Na ADX Florence, todos estão no equivalente à solitária. A penitenciária inteira é uma solitária", ressalta.
"É um dos lugares mais sombrios do mundo. Um lugar para onde você espera nunca precisar ir, nem mesmo como visitante."
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