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Bolsonaro tem razão em críticas à política ambiental da Noruega?

Caça de baleias é criticada por ambientalistas, mas, diferentemente do desmatamento na floresta amazônica, está sujeita a regras rígidas e parâmetros legais - PA
Caça de baleias é criticada por ambientalistas, mas, diferentemente do desmatamento na floresta amazônica, está sujeita a regras rígidas e parâmetros legais Imagem: PA

Luis Barrucho - @luisbarrucho

Da BBC News Brasil em Londres

16/08/2019 14h16

Presidente brasileiro citou caça de baleias autorizada pelo país europeu, criticada por ambientalistas; mas, diferentemente do desmatamento na floresta amazônica, prática obedece a regras rígidas e parâmetros legais.

"A Noruega não é aquela que mata baleia lá em cima, no Polo Norte, não? Que explora petróleo também lá? Não tem nada a oferecer para nós. Pega a grana e ajuda a (chanceler alemã) Angela Merkel a reflorestar a Alemanha."

Foi assim que o presidente Jair Bolsonaro respondeu a uma pergunta sobre a decisão do governo norueguês de congelar os repasses ao Fundo Amazônia. O valor bloqueado chega a 300 milhões de coroas norueguesas (cerca de R$ 134 milhões). A Noruega é a maior financiadora do programa, destinado a ações de preservação ambiental e combate ao desmatamento.

De fato, a Noruega autoriza a caça comercial de baleias - ao lado da Islândia e do Japão, são os únicos países do mundo que ainda permitem a prática (o Japão autorizou oficialmente a caça apenas com objetivos "de pesquisa científica" nos últimos 30 anos, mas em junho voltou atrás na decisão e reautorizou a atividade).

Isso apesar da moratória internacional estabelecida em 1986 pela Comissão Baleeira Internacional (CBI).

Mas a prática, ainda que controversa e muito criticada por ambientalistas, é legal e sujeita a regras rígidas. Apenas um tipo de baleia, a minke, pode ser caçado. O animal tampouco é considerado uma espécie em perigo de extinção: de acordo com estatísticas oficiais, há 100 mil baleias minke nas águas do país. A Noruega reintroduziu a caça em 1993.

Mas Bolsonaro tem razão? Como funciona a caça de baleias na Noruega?

Mesmo autorizada pelo governo norueguês, a tradição de longa data vem perdendo força. Nos últimos anos, o número de baleias caçadas caiu, embora as cotas de caça tenham sido aumentadas pelo Ministério de Pesca do país.

No ano passado, por exemplo, a cota era de 1.278 baleias. Mas somente 454 foram efetivamente caçadas, um pequeno aumento em relação a 2017. Segundo o governo, essa cota é baseada em cálculos do comitê de ciência da Comissão Internacional de Caça de Baleias (IWC, na sigla em inglês), que garante a caça sustentável das baleias minke.

Parte da carne dessas baleias é vendida ou transformada em ração animal. Seu principal destino é o Japão, onde é considerada uma iguaria.

Há também cada vez menos interesse na atividade. Em 1950, 350 barcos se dedicavam à caça do mamífero na Noruega. No ano passado, contudo, apenas 11 baleeiras foram ao mar.

Pescadores dizem não conseguir alcançar as cotas anuais por causa da falta de capacidade das usinas de processamento de carne de baleia e do alto preço do combustível. As baleias se encontram em águas cada vez mais frias, se distanciando da costa do país, por causa do aquecimento global.

Segundo ambientalistas, outro fator que explica o declínio é o menor apetite dos consumidores.

"Somos contra a caça comercial de baleias em qualquer lugar do mundo. Ficamos satisfeitos que até Bolsonaro se oponha à caça de baleias e à exploração de petróleo no Ártico. Mas é absurdo ele usar o que acha que a Noruega deveria fazer melhor como desculpa para não fazer a coisa certa na Amazônia", diz à BBC News Brasil Frode Pleym, chefe do Greenpeace na Noruega.

Crise climática

"Com ou sem caça às baleias, estamos passando por uma crise climática. Bolsonaro e outros líderes mundiais têm que agir como líderes para enfrentá-la. Assim como a Noruega tem que parar com a exploração do petróleo no Ártico, Bolsonaro tem que impedir o desmatamento da Amazônia", acrescenta.

O IWC classifica a caça de baleias na Noruega de "desumana", uma vez que não proporciona "a morte sem dor, estresse ou sofrimento perceptível para o animal".

Brasil

Os barcos pesqueiros noruegueses matam as baleias com arpões equipados com granadas na ponta, uma invenção do século 19. Após penetrar no corpo do mamífero, o arpão libera ganchos, como um guarda-chuva, permitindo que o animal seja içado por um guindaste até a embarcação.

Mas o processo é lento e as baleias agonizam durante horas. "Quando a granada explode, provoca imenso trauma físico da baleia", diz a ONG Animal Welfare Institute, sediada nos EUA.

A caça às baleias foi proibida no Brasil por decreto em 1986. Em 2007, o Brasil se juntou a outros 30 países em um grande protesto diplomático contra a caça promovida pelo Japão.