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Vazamento de diálogos, mortes na família, entrevistas: o que aconteceu com Lula durante o tempo na prisão

8.nov.2019 - Lula discursa para apoiadores em Curitiba após deixar a carceragem da PF - CASSIANO ROSÁRIO/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
8.nov.2019 - Lula discursa para apoiadores em Curitiba após deixar a carceragem da PF Imagem: CASSIANO ROSÁRIO/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

09/11/2019 08h32

Decisão do STF de proibir prisão de réus antes de esgotados todos os recursos da defesa beneficiou ex-presidente; Lula foi solto na tarde de ontem

Um ano e sete meses depois de ter sido preso em Curitiba, condenado por corrupção no caso do tríplex do Guarujá, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi solto nesta sexta-feira, após decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de barrar o início do cumprimento da pena de réus antes de esgotados todos os recursos.

A defesa de Lula pediu sua liberdade e, pouco depois das 16h, o juiz Danilo Pereira Junior, da 12ª Vara Federal de Curitiba, assinou o alvará de soltura.

A seguir, veja o que de mais importante aconteceu em relação ao caso do petista — e a ele próprio — durante o período de detenção na Superintendência da Polícia Federal na capital paranaense.

Vazamentos de conversas atribuídas a Moro e procuradores

No dia 9 de junho, a trajetória de Lula tomou um rumo inesperado. O site The Intercept Brasil publicou uma série de reportagens baseadas em conversas atribuídas ao procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, com membros deste grupo de investigadores do Ministério Público Federal e o então juiz federal Sergio Moro.

O veículo afirma ter recebido de uma fonte anônima o pacote de fotos, vídeos, áudios e mensagens enviados em conversas privadas e em grupos da força-tarefa no aplicativo Telegram entre 2015 e 2018.

Segundo diálogos divulgados pelo Intercept Brasil, Moro recomendou a Dallagnol em dezembro de 2015, fora dos autos, uma possível testemunha a ser ouvida em processo contra Lula. Nas conversas, o então juiz federal também fez críticas a um procedimento da Polícia Federal ligado a documentos da Odebrecht e à atuação da procuradora Laura Tessler em depoimentos, e sugeriu a mudança da ordem de fases da operação, antecipando pelo menos uma decisão judicial.

Em suas manifestações sobre o vazamento, Moro tem repetido que "não reconhece a autenticidade de supostas mensagens obtidas por meios 'criminosos', que podem ter sido editadas e manipuladas e que teriam sido transmitidas há dois ou três anos", e que "sempre se pautou pela aplicação correta da lei a casos de corrupção e lavagem de dinheiro". Ele tem afirmado também que, se verdadeiras, as mensagens não contêm ilegalidades.

Já o MPF defende a atuação da força-tarefa, afirmando que ela é "revestida de legalidade, técnica e impessoalidade". "Os procuradores da força-tarefa manifestaram aqui preocupação com possíveis mensagens fraudulentas ou retiradas do devido contexto", diz em nota.

A revelação dessas conversas levantou questionamentos sobre a imparcialidade de Moro quando julgava casos da operação e sobre a conduta da força-tarefa.

Como consequência, o vazamento influenciou processos em andamento e deu origem a uma série de investigações, concentradas na invasão dos celulares e nos supostos crimes ou desvios éticos cometidos por essas autoridades.

Lutos na família

Desde sua prisão, Lula só foi autorizado a sair da Superintendência da Polícia Federal em Curitiba duas vezes: a primeira, para um depoimento à juíza Gabriela Hardt (substituta de Sergio Moro na Vara Federal da capital paranaense), em novembro de 2018, e a segunda, em 1º de março deste ano, para comparecer ao velório e à cremação de seu neto Arthur, de sete anos, morto em decorrência de uma infecção.

Na ocasião, sua saída foi autorizada pela juíza Carolina Lebbos, da 12ª Vara de Execuções Penais do Paraná.

Lula chegou ao cemitério, em São Bernardo do Campo (SP), na manhã daquele dia, chorando e sob forte escolta de agentes federais e policiais militares, e ficou ali cerca de uma hora e meia.

Antes disso, Lula havia pedido autorização para sair temporariamente da prisão em 30 de janeiro, para comparecer ao velório de seu irmão Genival Inácio da Silva, o Vavá, mas o pedido foi negado por Lebbos sob a justificativa de dificuldades logísticas e de segurança.

Entrevistas à imprensa

A primeira vez que Lula foi autorizado pela Justiça a dar entrevista a jornalistas durante seu período na prisão ocorreu mais de um ano depois de ele chegar à carceragem da PF em Curitiba — e depois de uma batalha jurídica.

Em setembro de 2018, uma liminar concedida pelo ministro do STF Ricardo Lewandowski autorizou o pedido da Folha de S.Paulo para entrevistar o ex-presidente. A liminar foi cassada pelo ministro Luiz Fux, em decisão que seria revertida em abril deste ano pelo presidente da Corte, Dias Toffoli.

Na entrevista, concedida na sede da PF em Curitiba por duas horas à Folha de S.Paulo e ao El País, Lula falou sobre a rotina na prisão, os lutos vividos na cadeia pela morte do neto e do irmão, sobre o atual governo e sobre as acusações de corrupção contra si.

Na ocasião, afirmou: "Você pensa que eu não gostaria de estar em casa? Adoraria estar em casa com a minha mulher, com os meus filhos, os meus netos, os meus companheiros. Mas não faço nenhuma questão. Porque eu quero sair daqui com a cabeça erguida como eu entrei. Inocente. E eu só posso fazer isso se eu tiver coragem e lutar por isso."

Depois, Lula foi autorizado a conceder outras entrevistas. Em agosto, ele falou à BBC News Brasil sobre os processos contra ele, as esperanças que tinha de deixar a prisão e os vazamentos da Lava Jato.

Questionado se achava que toda a operação deveria ser anulada, respondeu que não. "Acho que a operação Lava Jato tem coisas que foram verdade, tem pessoa que confessou. Se o cara confessou que roubou, o cara é ladrão."

Em entrevista anterior, aos jornalistas Kennedy Alencar (transmitida pela BBC World News como parte de uma reportagem de 30 minutos sobre o ex-presidente) e Glenn Greenwald, do Intercept Brasil, o ex-presidente insistiu em sua linha de defesa sobre a condenação no caso do tríplex no Guarujá, questionando as evidências apresentadas contra si, e fez críticas ao governo de Jair Bolsonaro.

"A impressão que eu tenho é que ele não sabe lé com cré. A impressão que eu tenho é que ele não tem noção das coisas que ele fala. Ele não conhece nada de política externa, ele não conhece nada de economia. Ele faz questão de mostrar que não conhece", disse o petista. "O que se apresenta publicamente é um negócio incontrolável. Obviamente que pelo bem do Brasil eu espero que ele aprenda."