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Vídeo viral de Boris Johnson pressionado esquenta campanha a 3 dias de eleição no Reino Unido

Ao ser questionado por jornalista, primeiro-ministro se recusa a ver foto de menino sendo tratado em chão de hospital - PA Media
Ao ser questionado por jornalista, primeiro-ministro se recusa a ver foto de menino sendo tratado em chão de hospital Imagem: PA Media

10/12/2019 12h01

A três dias das eleições gerais no Reino Unido, um vídeo controverso do primeiro-ministro, Boris Johnson, viralizou nas redes sociais e esquentou a reta final da campanha.

O vídeo mostra Johnson sendo questionado por um jornalista sobre a fotografia de um menino doente sendo tratado no chão de um hospital do serviço de saúde público britânico (NHS, na sigla em inglês). A princípio, ele se recusa a olhar a imagem e, na sequência, pega o celular do repórter e coloca no bolso.

"Tentei mostrar a @BorisJohnson a foto de Jack Williment-Barr. O garoto de 4 anos, com suspeita de pneumonia, obrigado a deitar em uma pilha de casacos no chão de um hospital de Leeds. O primeiro-ministro pegou meu telefone e o colocou no bolso", tuitou o repórter Joe Pike, da rede de televisão ITV News, ao divulgar o vídeo nas redes sociais.

Após ser pressionado, Johnson tira o telefone do bolso, olha a imagem e devolve o aparelho ao jornalista.

O vídeo, que já teve mais de 9 milhões de visualizações, foi um prato cheio para a oposição, que vem batendo na tecla da saúde desde o início da campanha - enquanto o primeiro-ministro tenta manter o foco no Brexit, o processo de saída do Reino Unido da União Europeia.

O líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn, principal adversário de Johnson, retuitou a postagem do vídeo logo na sequência, com a seguinte mensagem:

"Ele simplesmente não se importa."

'Eleição ainda não acabou'

As eleições gerais, marcadas para 12 de dezembro, vão eleger o novo Parlamento Britânico e, por consequência, o primeiro-ministro que governará o país.

A antecipação do pleito, que deveria ocorrer apenas em 2022, é mais uma tentativa de acabar com o impasse que se arrasta há meses sobre o Brexit.

Enquanto os trabalhistas prometem "um foco incansável" no serviço de saúde se saírem vitoriosos das urnas; os conservadores tentam manter o foco no Brexit e no "risco" de haver outro resultado inconclusivo, o que levaria ao chamado Parlamento em suspenso (hung Parliament), em que nenhum partido tem vantagem significativa para formar governo o que é resolvido através da formação de coalizões.

Neste contexto, a reação do primeiro-ministro no vídeo deu fôlego ao discurso da oposição, que acusa o Partido Conservador de colocar a vida de pacientes em risco ao não prover os recursos necessários para o sistema de saúde.

"Não tenha dúvida: os conservadores de Boris Johnson causaram essa crise privando nosso NHS do financiamento necessário. Não é de se admirar que ele não consiga olhar para a foto", tuitou Corbyn.

"Os Conservadores tiveram nove anos para financiar nosso NHS adequadamente. Não acredite neles quando dizem que vão fazer isso agora", acrescentou.

Ao longo da campanha, os trabalhistas vêm acusando os conservadores de querer colocar o NHS "à venda" por meio de um acordo bilateral de livre-comércio que estaria sendo negociado com os EUA para depois do Brexit - o que os conservadores classificam como acusações "absurdas".

O Partido Conservador, de Johnson, vem liderando as pesquisas de intenção de votos.

Mas, para a jornalista Laura Kuenssberg, editora de política da BBC, o episódio mostra que a eleição ainda não acabou:

"A história, a reação estranha e desajeitada do primeiro-ministro, proporcionaram a oportunidade perfeita para os trabalhistas atacarem uma das vulnerabilidades dos conservadores, justamente no momento em que eles estavam tentando fazer uma grande jogada para os eleitores que tradicionalmente votaram no Partido Trabalhista por gerações", avalia.

"E os acontecimentos de hoje são a explosão de qualquer complacência que possa estar sendo construída no quartel-general dos conservadores, um lembrete, mesmo nesta reta final, de que a eleição ainda não acabou."

O que acontece no vídeo

O vídeo em questão é o registro de uma entrevista de Boris Johnson, que estava em campanha em Grimsby, na Inglaterra, ao jornalista Joe Pike, da ITV News.

O repórter pede várias vezes ao primeiro-ministro para olhar a foto do menino Jack, publicada inicialmente na capa do jornal britânico Daily Mirror, em seu celular.

Johnson afirma que ainda não tinha visto a foto, mas se recusa a ver a imagem, embora continue sendo questionado por Pike.

Por fim, ele pega o telefone do jornalista e coloca no bolso, dizendo: "Se você não se importa, vou te dar uma entrevista agora".

Pike rebate:

"Você se recusa a olhar para a foto. Você pegou meu telefone e colocou no bolso, primeiro-ministro. A mãe dele diz que o NHS está em crise. Qual é a sua resposta para isso?"

Só então Johnson tira o telefone do bolso e olha para a tela.

"É uma foto terrível, terrível. Peço desculpas, obviamente, à família e a todos aqueles que têm experiências terríveis no NHS", declarou.

"Mas o que estamos fazendo é apoiar o NHS e, no geral, acho que os pacientes no NHS têm uma experiência muito, muito melhor do que essa pobre criança teve."

"É por isso que estamos fazendo grandes investimentos no NHS, e só podemos fazer isso se colocarmos o Parlamento para funcionar, se acabarmos com o impasse atual e avançarmos".

Na sequência, o primeiro-ministro pede desculpas por pegar o telefone e devolve o aparelho ao repórter.

"Vi algumas coisas bem estranhas em quase 20 anos cobrindo política, mas nunca vi nada parecido com isso", afirma Laura Kuenssberg, editora de política da BBC.

"Não foi apenas uma forma bizarra de reagir a perguntas legítimas, o verdadeiro risco para Johnson é que deu a impressão de que ele não queria, e talvez não conseguisse, entender ou ter empatia com a situação da família em questão", acrescentou.

Falsa acusação de agressão

Em resposta ao incidente, o secretário de Saúde, Matt Hancock, foi enviado ao hospital em Leeds, no Reino Unido, para conhecer a família do menino e apurar o que havia acontecido, na tentativa de conter a situação.

Mas o episódio acabou sendo agravado pela aparente tentativa dos conservadores de desviar o foco da crise, acusando um ativista trabalhista de agressão.

Vários manifestantes, que protestavam do lado de fora do hospital, gritaram palavras de ordem quando Hancock e sua equipe saíram da unidade.

Foi quando começaram a surgir rumores de que um assessor do secretário tinha levado um soco de um ativista de esquerda.

Logo depois, no entanto, as acusações acabaram se revelando falsas, uma vez que imagens de vídeo foram divulgadas mostrando o assessor sendo acidentalmente atingido no rosto, quando passa pelo braço estendido de um manifestante.

Para o Partido Trabalhista, a acusação de agressão foi uma tentativa dos conservadores de desviar o foco da crise para a oposição:

"Isso nunca aconteceu. Os conservadores inventaram isso para desviar sua atenção de uma criança deitada no chão do hospital; o que foi reproduzido pela imprensa que não se preocupou em verificar se era verdade", tuitou Jeremy Corbyn.

A história por trás da foto

A mãe do menino Jack afirmou, por sua vez, que não quer que o tratamento do filho seja usado como "jogo político".

Em reclamação formal ao órgão regulador da imprensa no Reino Unido (Ipso, na sigla em inglês), ela disse que deu permissão inicialmente a dois jornais para usar a imagem de Jack, mas ? agora que a história viralizou e foi reproduzida por outros veículos ? ela quer impedir qualquer publicação adicional da foto ou sobre seu filho.

Na carta, ela diz que as ações da imprensa estavam "causando sofrimento significativo" a Jack e sua família.

O menino foi internado na semana passada na Enfermaria Geral de Leeds após ficar doente por seis dias, conforme contou sua mãe ao jornal Daily Mirror.

Segundo ela, Jack foi atendido assim que chegou, recebendo um leito e oxigênio, mas algumas horas depois precisou ceder a cama para outro paciente - e Jack ficou mais de quatro horas sem leito.

A mãe contou que fez então uma cama improvisada para o filho no chão do hospital com casacos - foi quando tirou a foto.

Ela disse ao jornal que os médicos e enfermeiras eram "pessoas adoráveis", mas que estava "irritada com a falta de financiamento e a falta de leitos", acusando o governo de "fracassar com nossas crianças".