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Guerra de Trump contra imprensa míngua quantidade de coletivas na Casa Branca

7.nov.2018 - Presidente Donald Trump aponta para o jornalista da CNN Jim Acosta enquanto uma funcionária tenta tirar o microfone do repórter durante uma coletiva de imprensa na Casa Branca após o resultado das eleições legislativas - Evan Vucci/AP
7.nov.2018 - Presidente Donald Trump aponta para o jornalista da CNN Jim Acosta enquanto uma funcionária tenta tirar o microfone do repórter durante uma coletiva de imprensa na Casa Branca após o resultado das eleições legislativas Imagem: Evan Vucci/AP

19/03/2019 10h00

Os holofotes perderam o brilho na sala de imprensa da Casa Branca, onde as entrevistas coletivas que antes eram diárias se transformaram em um evento quase mensal, um dos efeitos da batalha contra a imprensa do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e pelo seu empenho em ser seu próprio porta-voz.

O alerta correu pela Ala Oeste como fazem as notícias urgentes: pausou a digitação dos repórteres, interrompeu conversas e tirou os fotógrafos das suas cadeiras.

"Temos entrevista coletiva!", exclamou uma jornalista, segundos depois que o aviso oficial chegou às caixas de e-mail dos correspondentes na Casa Branca.

Essa cena, presenciada na semana passada pela Agência Efe, evidencia o caráter extraordinário de um ato que durante décadas fez parte da rotina diária de Washington, e que se diluiu na era de Trump, um presidente que ataca constantemente os meios de comunicação.

Quando a porta-voz da Casa Branca, Sarah Sanders, se aproximou do palanque na semana passada, completava um recorde de 42 dias sem dar uma entrevista coletiva. Não houve nenhuma em fevereiro. Foram uma em janeiro, outra em dezembro, uma em novembro e duas em outubro.

Assim como outras tradições presidenciais, o ritual da entrevista coletiva diária nunca se encaixou totalmente na Casa Branca de Trump, pouco interessado em delegar porta-vozes a missão de explicar os detalhes das suas ideias.

As tumultuadas entrevistas coletivas do primeiro porta-voz de Trump, Sean Spicer, convenceram muitos na Casa Branca de que essa prática fomentava a "hostilidade" dos jornalistas e inclusive lhes ajudava a brilhar, como no caso de Jim Acosta, da emissora "CNN".

Essa ideia se reforçou com a chegada ao cargo de Sanders, que diminuiu a duração das coletivas de imprensa, e alcançou seu zênite pelas mãos de Bill Shine, que em julho do ano passado se tornou diretor de comunicação de Trump.

"Sarah Sanders já não vai muito ao palanque porque a imprensa a aborda tão grosseira e incorretamente, que lhe disse para não se incomodar, que nossa mensagem será divulgada de qualquer forma", escreveu Trump em sua conta do Twitter em janeiro.

Shine deixou este mês a Casa Branca e isso gerou expectativas sobre uma possível mudança de rumo, mas Sanders as diminuiu durante sua entrevista coletiva na semana passada.

"Eu não notei nenhuma mudança", disse a porta-voz.

"(Trump) é o presidente mais acessível da história moderna. Quase todos os dias responde a perguntas, e quando não faz isso, às vezes respondo eu daqui. A cada dia respondemos a centenas de perguntas, e seguiremos fazendo assim. Às vezes será daqui, outras será de outras plataformas", concluiu.

A ausência de Sanders no palanque levou os jornalistas a fazer guarda na entrada da Ala Oeste para lançar perguntas aos funcionários americanos depois das suas entrevistas à emissora favorita de Trump, a "Fox News".

Mas esses encontros improvisados são curtos e inacessíveis para muitos repórteres, que não podem ficar o dia inteiro na Casa Branca.

Quando ainda aconteciam regularmente, muitos em Washington consideravam inúteis as entrevistas coletivas de Spicer e Sanders, porque ambos evitavam responder várias perguntas ou esclarecer o significado dos tweets de Trump.

No entanto, Olivier Knox, presidente da Associação de Correspondentes da Casa Branca, acredita que cortar as coletivas de imprensa representa uma perda de "transparência e prestação de contas".

"Há outros métodos para obter informação, mas as vigorosas trocas públicas que podem acontecer na sala de imprensa ajudam a ressaltar que, em uma república saudável, ninguém é poderoso demais para não ser questionado", declarou Knox em janeiro.

Mike McCurry, que foi porta-voz da Casa Branca entre 1994 e 1998 e abriu a sala de imprensa às câmeras de televisão, também lamenta a redução dessas oportunidades.

Essa decisão se deve ao fato de que Trump "acredita que pode construir uma realidade alternativa" e "não entende a importância de construir confiança no que o governo diz", opinou McCurry à Agência Efe.

"Isto terá consequências, haverá um preço a pagar. Por exemplo, há vezes que um presidente tem que dizer: 'Confiem em mim, isto é um problema sério'. Trump são será ouvido, acharão que é tergiversação ou mitologia trumpista", previu.