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Número recorde de indígenas concorre ao Congresso em reação a Bolsonaro

Sônia Guajajara(PSOL), chefe da APIB, que concorre a uma vaga na Câmara dos Deputados - Por Amanda Perobelli e Pilar Olivares e Bruno Kelly
Sônia Guajajara(PSOL), chefe da APIB, que concorre a uma vaga na Câmara dos Deputados Imagem: Por Amanda Perobelli e Pilar Olivares e Bruno Kelly

Amanda Perobelli e Pilar Olivares e Bruno Kelly

22/09/2022 15h56

Por Amanda Perobelli e Pilar Olivares e Bruno Kelly

SÃO PAULO/RIO DE JANEIRO/MANAUS (Reuters) - Um número recorde de líderes indígenas, a maioria formada por mulheres, está concorrendo nas eleições de outubro, em uma reação contra as políticas do presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL).

Com o aumento da destruição da floresta amazônica, das invasões de terras indígenas e da violência contra seus povos durante o governo Bolsonaro, vários desses candidatos dizem que estão entrando na disputa política com um senso de urgência.

"Este ano é crucial para tentar combater o aumento da violência e dos assassinatos, o aumento do desmatamento", disse Sonia Guajajara (PSOL), chefe da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), que está concorrendo a uma vaga na Câmara dos Deputados. "Hoje, as mulheres estão assumindo muitas frentes de luta e liderando a luta dos povos indígenas no Brasil."

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) registrou 60 candidatos indígenas para a Câmara dos Deputados e o Senado este ano, incluindo 31 mulheres -- o maior número já registrado.

Muitos dizem que o principal objetivo da candidatura é desfazer as políticas de Bolsonaro, que parou de demarcar territórios indígenas e tem pressionado pela mineração e agricultura nas reservas existentes, que têm sido invadidas com violência por garimpeiros ilegais.

Bolsonaro defende que os indígenas deveriam adotar os costumes e atividades econômicas de não índios, e cita a proteção das reservas nativas como uma barreira ao progresso.

O Palácio do Planalto e a Fundação Nacional do Índio (Funai) não responderam a pedidos de comentários.

Por outro lado, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), líder das pesquisas para a eleição presidencial de outubro, prometeu novos financiamentos para conter o desmatamento e proteger os direitos indígenas, propondo um novo ministério para atender o quase 1 milhão de indígenas do país.

"Queremos um ministério com um ministro indígena... para fazer parte de um possível governo Lula", disse Guajajara à Reuters.

DIREITOS CONSTITUCIONAIS

Líderes indígenas também estão pressionando para bloquear legislação apoiada por Bolsonaro e a poderosa bancada ruralista para descartar novas reservas em terras que não estavam ocupadas por nativos em 1988, quando a Constituição foi promulgada.

Os indígenas dizem que o chamado marco temporal é ilegal porque seus direitos à terra são garantidos pela Constituição, mesmo que tenham sido despejados.

“Este marco temporal é como o governo entregará nossas terras para serem destruídas pela mineração ilegal, extração de madeira, grileiros e agronegócios”, disse Tereza Arapium (Rede), que concorre a uma cadeira na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro.

O desmatamento da Amazônia brasileira atingiu nível mais alto em 15 anos sob Bolsonaro, ameaçando o habitat de muitas das cerca de 300 comunidades indígenas do país, consideradas pelos ambientalistas como essenciais para proteger a floresta tropical.

"Ativismo ambiental é o que já fazemos com nosso modo de vida. Nós somos o próprio meio ambiente", disse Célia Xakriabá (PSOL), candidata a deputada federal por Minas Gerais.

Outra prioridade citada pelos candidatos indígenas é a reforma das instituições destinadas a proteger seus povos e territórios, juntamente com a biodiversidade da floresta.

Eles dizem que a Funai terá que ser reestruturada depois que o governo Bolsonaro destruiu a agência ao reduzir funcionários e substituir antropólogos por policiais e militares da reserva.

O primeiro deputado indígena do Brasil, o xavante Mario Juruna, foi eleito em 1982. Ele carregava um gravador porque dizia não confiar na palavra de brasileiros não indígenas.

Quase quatro décadas se passaram antes da eleição de mais um representante indígena no Congresso, uma mulher, Joenia Wapichana, do Estado de Roraima, em 2018.

Nos últimos anos, as mulheres têm assumido cada vez mais cargos de liderança nas comunidades indígenas, com mais caciques do sexo feminino comandando a luta para defender seus direitos.

"Acredito muito nessa potência, na força dessas mulheres, na capacidade delas para estarem no Congresso", disse Vanda Witoto (Rede), de Manaus, candidata a deputada federal.

Eles enfrentam um grande desafio em uma Câmara dos Deputados onde os interesses agrícolas e uma grande bancada evangélica têm domínio, frequentemente atacando os direitos indígenas, afirmou ela.

"Se for eleita, temos uma demanda gigantesca para frear todos esses projetos que hoje não visam mais demarcar terras indígenas, que abrem nossos territórios para mineração e agronegócio. A gente visa combater isso de frente", disse Witoto.

(Reportagem de Amanda Perobelli e Leonardo Benassatto, em São Paulo; Pilar Olivares, no Rio de Janeiro; e Bruno Kelly, em Manaus; Reportagem adicional de Anthony Boadle, em Brasília)