Rio Grande do Sul planeja 'cidades provisórias' para abrigar milhares de pessoas após enchentes
O governo do Rio Grande do Sul planeja criar pelo menos quatro "cidades provisórias" com estruturas temporárias na região metropolitana de Porto Alegre para abrigar milhares de pessoas que hoje lotam os abrigos espalhados pelo Estado assolado por enchentes.
O Rio Grande do Sul tem atualmente 77 mil pessoas vivendo em abrigos, a maior parte em locais improvisados como ginásios de esporte, escolas ou igrejas, que, em algum momento, terão que ser esvaziados. Mas, mesmo quando as águas baixarem, muitas delas não terão condições de voltar para casa devido aos estragos causados pelas enchentes que mataram ao menos 151 pessoas.
De acordo com o vice-governador do Estado, Gabriel Souza, a intenção é construir estruturas temporárias com dormitórios individuais e áreas comunitárias, como banheiros, cozinha, lavanderia, espaço para crianças e animais de estimação, para funcionarem enquanto os desabrigados não têm para onde ir.
A conta do governo do Estado, com base em outros eventos climáticos que deixaram parte da população desabrigada, é que a maior parte das pessoas que estão em abrigos não precisarão dessa estrutura, e que restaria cerca de 15% para esses locais. Mas o vice-governador admite que o número pode ser maior, dada a proporção das inundações.
"As pessoas ou vão voltando para casa ou vão pegando políticas como aluguel social dos governos, vão para casa de amigos, vão se virando, ou por conta do governo, ou por conta própria. Mas vai sobrar um saldo de pessoas que, infelizmente, não têm para onde ir e são obrigadas a ficar naquela condição", disse ele em entrevista à Reuters.
O governo do Estado procura áreas que não corram novo risco de alagamento nas cidades onde há mais desabrigados, que são Porto Alegre, Canoas, São Leopoldo e Guaíba. Nas três primeiras, disse Souza, já há espaços previstos. Em Guaíba, ainda não foi definido um local pela dificuldade de encontrar áreas disponíveis que não correm risco de inundação.
Essas quatro cidades concentram cerca de 51 mil dos 77 mil desabrigados, o que representaria, em uma avaliação otimista, quase 8 mil pessoas em necessidade desses abrigos temporários.
"A gente só vai saber ao certo quando tivermos a baixa das águas, porque hoje ainda a gente não consegue nem acessar muitas regiões mais densamente povoadas, porque simplesmente estão submersas as casas", disse o vice-governador.
Além dos desabrigados, as chuvas no Rio Grande do Sul também deixaram quase 540 mil pessoas desalojadas, que tiveram de sair de suas casas, mas não precisaram recorrer a abrigos.
Ajuda da ONU
Para ajudar nas estruturas provisórias a serem construídas no Rio Grande do Sul, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) já anunciou a doação de 108 unidades de uma estrutura normalmente usada em campos de refugiados.
"São aquelas casinhas que são modulares, podem ser montadas de distintas formas, seja para acolhimento de famílias ou de outros indivíduos, seja para conformarem, por exemplo, um espaço de atendimento, um espaço de apoio para voluntários", explicou Silvia Sander, oficial de proteção do Acnur.
O vice-governador gaúcho explica que o Estado está contando com a doação, mas não será o suficiente, então o governo deve contratar uma empresa que monta estrutura de eventos para montar as cidades provisórias.
O governo do Estado também irá colocar pessoas em aluguel social, onde houver imóveis disponíveis. E, em regiões como o Vale do Taquari, já atingida por enchentes em setembro do ano passado, estão sendo construídas casas temporárias, em uma estrutura de contêineres com banheiros.
"Na maior parte daquela região não tem casas para alugar", disse Souza.
A segunda etapa, encontrar moradia definitiva para essas pessoas, passa pelas medidas anunciadas pelo governo federal para tentar minimizar a falta de moradias que o Rio Grande do Sul enfrentará.
Uma das medidas será o pagamento de 5,1 mil reais a cada família que teve a casa afetada pelas enchentes, recursos para serem usados na reconstrução ou reformas necessárias. Já famílias de baixa renda que moravam em residências do programa Minha Casa, Minha Vida receberão novas casas.
As prefeituras do Estado também poderão acessar um sistema para colocar as estimativas de quantas casas precisam construir para repor o que foi destruído pela enchente, para que o governo federal possa mapear as necessidades e definir como será feito o atendimento, que inclui ainda a reforma de prédios públicos não utilizados, a suspensão de leilão de imóveis retomados pela Caixa e o Banco do Brasil para as famílias e a compra de imóveis usados.
"A gente precisa rapidamente de soluções e espero que consigamos aqui devido aos anúncios que o presidente fez ontem", disse o vice-governador.
A expectativa é que os desabrigados não precisem ficar mais que de quatro a seis semanas nessas estruturas provisórias, mas Souza lembra que, no Vale do Taquari, por conta da enchente de setembro do ano passado, ainda há pessoas vivendo em abrigos.
Acampado na beira de uma das principais estradas de acesso a Porto Alegre, Fernando Ayres da Silva tem certeza que não vai poder voltar a morar em sua casa sem uma reforma. A inundação chegou ao telhado da casa, e a estrutura não aguentou.
"Duas paredes já estão quase caindo, não vou poder voltar como está", disse.
Sua principal dúvida era justamente se o governo iria ajudar de alguma forma. Sem internet e nem mesmo um rádio, não sabia das promessas que vêm sendo feitas. "Espero que chegue alguma coisinha para a gente. Vai ser muito difícil começar tudo de novo."
(Reportagem de Lisandra Paraguassu, em Porto Alegre; Reportagem adicional de Laís Morais, em São Paulo)
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.