Defesa de Bolsonaro apela ao 'vai que cola' sobre o uso eleitoral do 7/9
O TSE deve condenar Jair Bolsonaro pelo uso eleitoral das comemorações do Bicentenário da Independência, em 7 de Setembro do ano passado, reforçando sua inelegibilidade. Em julgamento retomado, nesta quinta (26), os ministros irão se debruçar sobre uma justificativa involuntariamente cômica apresentada pelos advogados do ex-presidente, que pedem a absolvição com base em um pedaço de pano.
Tal como aconteceu com a palestra que deu a embaixadores para atacar o sistema de votação, no Palácio do Alvorada, motivo da primeira condenação, Bolsonaro é acusado de também se beneficiar de dinheiro público para fins eleitorais neste caso.
Nas ações, a defesa abraçou o argumento de que havia "clara diferenciação, com bordas cirúrgicas limpas e delimitadas" entre as atividades oficiais e os comícios eleitorais. Ou seja, entre o momento de celebração oficial e de ato eleitoral. E, detalhe, uma das "provas" seria que Jair ostentava a faixa presidencial nas atividades oficiais e não estava com ela no comício.
"Após o encerramento do evento, [Jair] se dirigiu ao local e, sem a faixa presidencial, discursou, na fase posterior do evento oficial, somente para aquelas pessoas que se deslocaram para o local e se dispuseram a ouvir", afirmaram os advogados.
Sim, foi isso mesmo o que você leu. Com faixa, presidente da República Federativa do Brasil, sem faixa, candidato à reeleição. Ignorando que o presidente e o candidato à reeleição continuavam a mesma pessoa, beneficiando-se da estrutura e do público oriundos do ato oficial com o presidente.
Quando tratei disso pela primeira vez, dei o nome de "Defesa Clark Kent": com óculos, um pacato jornalista do Planeta Diário, sem óculos, o todo-poderoso Super-Homem, último filho de Krypton.
A defesa ainda diz que "não existiu qualquer aproveitamento, intencional ou não, da estrutura do 7 de Setembro para fins eleitorais", concluindo-se que houve, "ao fim e ao largo do evento oficial, simplesmente, uma singela demonstração da força política de Bolsonaro".
As celebrações do Bicentenário foram cirurgicamente pensadas para servirem às necessidades do presidente, que se aproveitou de uma data cívica especial para sobrepor um comício. Pessoas que estavam interessadas em ver a festa também tiveram que participar de uma micareta eleitoral. O ato serviu para produzir imagens que foram usadas largamente na campanha para mostrar que ele tinha apoio popular.
Não só isso. O procurador-geral Eleitoral, Paulo Gonet, destacou que Bolsonaro usou as Forças Armadas, atores da celebração do 7 de Setembro, para a sua campanha.
"O quadro do 7 de Setembro de 2022 expunha à população a imagem dessa finalidade que a ordem jurídica quer evitar, entre o agente político em campanha à reeleição e as Forças Armadas. A associação do candidato com o referido apoio das Forças Armadas se revela de sensível gravidade para a regularidade das eleições', afirmou.
E sobre a questão da faixa presidencial, Gonet foi incisivo, chamando o teatro de "aparatosa audácia":
"A retirada da faixa presidencial quando do breve deslocamento do palanque oficial para o eleitoral, em Brasília, nessas circunstâncias, assume medidas de aparatosa audácia. O gesto diz mais do que se queria fazer crer do que daquilo que se estava a realizar. A ênfase no gesto mostra que o candidato sabia que não poderia estar na condição de Presidente da República no palanque de finalidade eleitoral. O gesto, afinal, se desvaneceu, diante do conjunto dos comportamentos e dos fatos ocorridos no mesmo dia", disse.
Por essa lógica, bastaria Bolsonaro estar despido da faixa presidencial para não ser considerado um crime de responsabilidade as ações e omissões que tomou na pandemia de covid-19 e que levaram a mais de 700 mil mortos.
Ele foi presidente de 1º de janeiro de 2019 a 31 de dezembro de 2022 (mesmo tendo fugido para a Flórida um dia antes). E terá que responder por todos os atos nesse período.