Acusado de corrupção, catarinense está preso há 9 meses na Bolívia
O catarinense Jean Carlos da Silva, 31, está preso na Bolívia há pouco mais de nove meses acusado de corrupção – crime que ele nega. O caso se soma a uma série de incidentes que ilustram o mau momento das relações entre Brasil e Bolívia.
Silva era representante no país da madeireira brasileira Global Forest, que tem sede em Curitiba (PR). Desde 8 de dezembro de 2012, ele está preso em La Paz, acusado por dois ex-empregados brasileiros da própria empresa de corromper 13 funcionários públicos locais.
O catarinense passou seis meses na cadeia de segurança máxima de Chanchocorro. Desde junho, está numa clínica onde, segunda sua mulher, Carla Roberta Lehmkuhl, tentou o suicídio duas vezes. Ela conta que o marido passa seus dias acorrentado à cama, aguardando o julgamento.
Na opinião do boliviano Miguel Blancourt, advogado da embaixada brasileira que está acompanhando o caso, a denúncia contra Silva foi uma retaliação dos dois ex-empregados da Global.
Ambos foram presos por desvio de verbas da empresa. Em seguida, acusaram o brasileiro de ter corrompido policiais, promotores e juízes no processo de desvio.
Foi dado início então a novo processo, contra 13 funcionários locais – os supostamente corrompidos -, mais Silva e a mulher dele. Com exceção de Silva, todos foram libertados.
O dono da Global, o empresário curitibano Anderson Rocha, 37, disse que se trata de uma “situação absurda”. “Eu é que fiz a denúncia contra os ex-funcionários que me roubavam. [Agora] Uma denúncia sem fundamento de dois condenados botou um homem inocente na cadeia, sem perspectivas de solução".
Rocha disse que se manteve em silêncio por muito tempo porque temia prejudicar Silva e a mulher. Ele conta que já pagou propina de US$ 50 mil para intermediários que supostamente obteriam a soltura de seu funcionário, sem sucesso.
“Tenho até medo de confessar isto, porque temo que aí sim não o soltem mais. Mas, se eu continuar pagando, vão continuar nos extorquindo. Eu pago a clínica, advogados, despesas, passagens. Já me pediram US$ 2 milhões para soltá-lo. Talvez eu devesse pagar, só para nos livrar disto de uma vez por todas”, disse ele.
O empresário diz ainda que mantém um estoque de madeira na sede da empresa na Bolívia avaliado em "cerca de US$ 2 milhões, o que acaba sendo o valor da propina que todos me pedem”. A Global exporta madeira para 57 países.
"Toda assistência"
O vice-cônsul brasileiro na Bolívia, conselheiro Pedro Maciel, disse que "estamos aguardando os procedimentos da Justiça local. Silva diz que é inocente e terá de esperar o fim do processo. Estamos acompanhando o caso dele com nosso advogado [Blancourt] mas por alguma razão as audiências dele sempre são canceladas. Não temos como prever uma solução".
O ex-ministro de Direitos Humanos da Bolívia, hoje ativista de DH na Comissão Andina de Juristas, Waldo Albarracin Sanches, disse nesta terça-feira (10), em La Paz, que Silva "não cometeu nenhum delito à luz da legislação boliviana. Não assaltou bancos, não traficou drogas, não matou ninguém. Ele é vítima da corrupção judicial do país. Digo mais: se só há um inocente nesta história toda, é Silva".
Sanches acompanhou a 16ª e última audiência da Justiça boliviana na última quinta-feira (5), na qual foi mais uma vez adiado o desfecho do caso de Silva. Nova sessão foi marcada para o próximo dia 17.
"Não tenho dúvida que são dois brasileiros [ex-colegas de Silva, em uma disputa comercial] que estão exercendo pressão econômica sobre os juízes para tomar dinheiro de Silva. Já fiz minha manifestação por escrito junto ao Judiciário para que ele seja solto imediatamente".
Em Brasília, o chefe do Departamento de Assistência a Brasileiros do Itamaraty, conselheiro Aloisio Gomide Filho, disse Silva está recebendo “toda assistência”. “Mas não podemos interferir nas decisões da Justiça boliviana”, afirmou o conselheiro.
Já o embaixador boliviano em Brasília, Jerjes Justiniano, não quis comentar as acusações. Por meio de sua assessoria, informou apenas que o caso compete ao Judiciário do seu país.
Apelos pelo Skype
Internado na clínica São Miguel desde junho, Silva conseguiu um smartphone e pelo Skype dispara pedidos de socorro a amigos e parentes em Blumenau (SC), de onde é natural.
“Me tirem daqui porque eu não aguento mais ser acusado de um delito que não cometi, em que não existe sequer uma prova que possa me manter na cadeia”.
O médico boliviano Fernando Urquizo disse que "o estresse cobra um preço da saúde dele". Conforme Urquizo, Silva apresenta graves problemas intestinais, de hipertensão e de depressão.
Na primeira tentativa de suicídio, em julho, tentou sufocar-se com toalhas, sendo salvo pela mulher. Na outra, tomando remédios que "estavam na minha gaveta", que não soube explicar quais eram. Eles não fizeram o efeito desejado.
Em Blumenau, a sobrinha Daiane Frafe disse que "a família está convencida que o processo o deixou desequilibrado".
Outros incidentes
No início de agosto, foram soltos os últimos dos 12 torcedores brasileiros que haviam sido presos por quatro meses, acusados de envolvimento na morte de um adolescente boliviano em uma partida de futebol entre Corinthians e San José em Oruro, na Bolívia.
Também no mês passado, o diplomata brasileiro Eduardo Saboia ajudou o senador boliviano Roger Pinto Molina a fugir para o Brasil, alegando questões humanitárias e de saúde.
Opositor do governo do presidente Evo Morales e acusado de corrupção, Pinto estava desde maio de 2012 asilado na Embaixada brasileira em la Paz. O caso acabou provocando a queda do ex-chanceler brasileiro, Antonio Patriota.
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