Belo Monte é a gigante usina da discórdia, segundo Le Monde
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Anderson Barbosa/Fotoarena
Integrantes do Movimento "Xingu Vivo Para Sempre" faz vigília em Altamira (PA) para comemorar decisão da justiça de paralisar obras da hidrelétrica
O projeto da gigantesca barragem de Belo Monte, no rio Xingu, nos rincões do noroeste do Brasil, é uma notável metáfora das contradições de nossos tempos.
De um lado, o dinamismo da sexta maior economia do mundo, suas necessidades energéticas gigantescas, sua vontade de tirar do isolamento regiões mais pobres e de oferecer empregos a dezenas de milhares de brasileiros. Do outro, a proteção de tribos indígenas ameaçadas de serem expulsas dessas terras, onde elas vivem há tempos imemoriais, e a preservação da bacia amazônica, que não é somente o pulmão da América do Sul, mas sim de todo o planeta.
A história já dura trinta anos. No final dos anos 1980, as autoridades de Brasília tiveram de abandonar um primeiro projeto, devido à mobilização dos índios, das Igrejas e de defensores prestigiosos, como o cantor Sting.
Isso não desencorajou o consórcio público Norte Energia: aprovada por um decreto legislativo em 2005, iniciada efetivamente em 2011, a nova obra – orçada em US$ 13 bilhões – deverá inundar cerca de 500 quilômetros quadrados de terras e causar o deslocamento de 20 mil pessoas, em sua maior parte tribos indígenas. Até 2020, com uma produção de mais de 11 mil megawatts por ano, essa usina deverá ser a terceira maior do mundo, atrás da de Três Gargantas na China e a de Itaipu, na fronteira do Brasil com o Paraguai, e suprir 11% da demanda energética do país.
Em 2011, a Comissão Interamericana dos Direitos Humanos já havia pedido a suspensão do projeto, por considerar que as tribos indígenas envolvidas não haviam sido ouvidas. O governo não havia levado isso em consideração. Hoje, é o juiz de um tribunal regional que acaba de exigir, sob pena de multa, a suspensão das obras do complexo hidrelétrico pelas mesmas razões.
O julgamento foi comemorado pelos ativistas ambientalistas e pelos índios. Certamente o poder público entrará com novos recursos. Esse enésimo episódio judicial simboliza o dilema do governo brasileiro, que encontra dificuldades para conciliar as necessidades do desenvolvimento com as regras em matéria de meio ambiente e de direitos dos povos indígenas. Assim, o país reduziu drasticamente o desmatamento da Amazônia nos últimos anos, mas também se lançou em gigantescos projetos de infraestrutura, entre eles trinta usinas e estradas na Amazônia, para sustentar seu crescimento.
Já os índios não abandonam a luta. Cerca de 150 deles ocuparam recentemente um dos pontos da barragem, durante três semanas, para exigir que as autoridades cumpram as promessas feitas às suas comunidades. A Norte Energia aceitou fornecer veículos aos indígenas e construir escolas e postos de saúde. É pouco. Pouco demais, certamente. Mas, infelizmente, já se sabe como costuma terminar a fábula da panela de ferro contra a panela de barro.
Tradutor: Lana Lim