Justiça Eleitoral deve se ajustar ao tempo da política, diz advogado do PT

Ana Carla Bermúdez

Do UOL, em São Paulo

  • Luis Macedo / Câmara dos Deputados

    Eugênio Aragão é um dos advogados da campanha de Haddad

    Eugênio Aragão é um dos advogados da campanha de Haddad

Apesar de o Judiciário ter seu próprio ritmo, a Justiça Eleitoral deve fazer ajustes para se aproximar à velocidade da política. É a avaliação do advogado e ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, que compõe a defesa da campanha do PT, do candidato Fernando Haddad.

"Claro que a gente sabe que o tempo do Judiciário não é, nem sempre, o tempo da política. Mas, no caso da Justiça Eleitoral, o ajustamento ao tempo da política é quase que uma necessidade", disse Aragão em entrevista ao UOL, por telefone, nesta sexta-feira (19).

A entrevista foi concedida antes de o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) acatar um pedido do PT e decidir abrir uma ação para investigar suspeitas de uso ilegal do WhatsApp contra o partido por meio da compra de pacotes de disparos de mensagens.

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O pedido foi apresentado pelo PT nesta quinta (18), contra o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) e empresas, com base em reportagem do jornal "Folha de S. Paulo", do mesmo dia, que revelou um esquema de propaganda ilegal.

Em agosto, quando a Justiça Eleitoral barrou a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e determinou que ele fosse substituído até o dia 11 de setembro –antes, portanto, do prazo estabelecido para trocas para as demais chapas, que era até 17 de setembro--, os advogados do PT entraram com um recurso pedindo mais tempo para que o partido pudesse realizar a troca.

Eles pediam que a Justiça Eleitoral ampliasse o prazo de substituição até que o STF (Supremo Tribunal Federal) julgasse um outro recurso que tentava viabilizar a candidatura de Lula. O pedido foi negado pelo TSE.

Ao UOL, Aragão afirmou que ações como a que foi protocolada pelo PT contra Bolsonaro, com base na reportagem da Folha, fazem parte de uma tática de "tiro longo", e não de "tiro curto".

"Nós sabemos que AIJEs [Ações de Investigação Judicial Eleitoral] demoram muito tempo para serem instruídas e julgadas, portanto isso não é um tiro curto, é um tiro longo. Pode demorar um ano, dois anos [para a conclusão das investigações]", disse.

Isso significa, basicamente, que mesmo depois das eleições [a ação] ainda vai ter repercussão. Uma eleição não extingue a punibilidade de ninguém
Eugênio Aragão, advogado da campanha de Fernando Haddad

Aragão também repudiou as declarações de Bolsonaro de que ele processaria Haddad por não ter apresentado provas ao acusá-lo de envolvimento com o suposto esquema de distribuição de fake news.

"O Haddad não fez nada mais do que reproduzir uma notícia de jornal", disse.

"Ele não é o único que está falando isso. Se o Bolsonaro quiser processá-lo, vai ter que processar todo mundo que colocou essa versão na boca", pontuou, afirmando que caso o pesselista resolva processar apenas Haddad, ele estaria ferindo o princípio da indivisibilidade –o que invalidaria a ação.

Investigação contra filho de Bolsonaro

Os advogados da campanha petista prometem entrar com um pedido para que a PGR investigue o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), filho de Bolsonaro, também com base na reportagem publicada pela Folha.

Segundo Aragão, o pedido é para que Flávio Bolsonaro seja investigado por organização criminosa, lavagem de dinheiro, caixa dois, falsidade ideológica e estelionato.

Nesta sexta, Flávio Bolsonaro afirmou ter sido banido pelo WhatsApp. A empresa confirmou a expulsão da conta do filho de Bolsonaro, mas disse que o bloqueio foi feito há alguns dias, por ter sido detectado "comportamento de spam".

Também nesta sexta, o WhatsApp enviou notificou extrajudicialmente as agências Quickmobile, Yacows, Croc Services e SMS Market determinando que elas parassem de enviar mensagens em massa e de usar números de celular obtidos pela internet.

Fernando Souza/AFP
Além de Bolsonaro, PT quer que TSE investigue o filho dele, Flavio

Dificuldades

Aragão foi um dos participantes de uma reunião realizada na manhã desta sexta com a presidente do TSE, ministra Rosa Weber, para tratar da campanha do segundo turno e a possibilidade de influência das fake news sobre a eleição. A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, também estava presente.

"A nossa preocupação com a velocidade da prestação jurisdicional foi claramente exposta à presidente Rosa Weber", disse Aragão.

Advogados que atuam ao lado de Aragão na defesa do PT junto ao TSE pontuam que a Justiça Eleitoral tem feito esforços para lidar com a atual situação das campanhas, mas ainda esbarra em dificuldades técnicas.

Estão em discussão, por exemplo, medidas para que se padronizem regras de entendimento sobre o que constitui uma notícia falsa, de cunho difamatório, para evitar decisões contraditórias entre os ministros.

Na quarta-feira (17), a ministra Rosa Weber propôs que, antes do ajuizamento de ações na Justiça Eleitoral, as campanhas se reúnam com ministros do TSE para decidir sobre a retirada ou não de conteúdos reclamados pelo adversário.

"Nós temos carta branca do candidato para fechar essas tratativas desses pactos de forma rápida e imediata", disse o advogado Ângelo Ferraro, sócio do escritório junto a Aragão.

Aragão afirmou ainda que a exigência da campanha do PT é para que se trate com urgência o "risco" representado pela disseminação de notícias falsas pelo WhatsApp.

Para isso, Aragão defende que o aplicativo apresente um "plano de contingência" que impeça a circulação de notícias falsas e também que a empresa colabore com as autoridades na identificação das fontes dessas notícias.

"Quem comete esse tipo de crime se esconde covardemente no anonimato. E quem tem que quebrar esse anonimato, para nós, é o WhatsApp. Portanto, a Justiça tem que exigir isso do grupo WhatsApp", afirmou.

Colaboração internacional

Aragão também não descartou uma possível cooperação entre o Ministério Público e o departamento de Justiça dos Estados Unidos para que a distribuição de fake news seja investigada.

"Nós acreditamos que a partir da atuação no [âmbito] eleitoral e no criminal a gente pode capilarizar a atuação da Justiça, e eventualmente também pensar até em cooperação internacional. Afinal de contas, o WhatsApp está nos Estados Unidos. Nós sabemos que muitas mensagens foram impulsionadas a partir de contas dos Estados Unidos", disse.

"Então, isso pode eventualmente exigir uma cooperação internacional entre o MP e o departamento de Justiça norte-americano", pontuou.

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