Joaquim Barbosa toma posse e é primeiro presidente negro do Supremo Tribunal Federal
Primeiro negro a ocupar o cargo de ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim Barbosa tomou posse nesta quinta-feira (22), por volta das 15h30, como presidente da Suprema Corte, cargo mais alto do Judiciário brasileiro. Ele assume o lugar deixado pelo ministro Ayres Britto, que se aposentou obrigatoriamente por ter completado 70 anos no último dia 18.
Ao ler seu discurso de posse, o ministro Joaquim Barbosa elogiou a evolução do Brasil e fez uma reflexão sobre o papel dos juízes na sociedade brasileira. "O bom magistrado é aquele que tem consciência de seus limites. Não basta ter boa formação técnica, humanística e forte apego a valores ético. O juiz deve velar para que suas convições íntimas não contaminem sua atividade", afirmou.
A cerimônia de posse ocorre no plenário do STF, onde Barbosa senta-se ao lado da presidente da República, Dilma Rousseff. Também tomou posse o ministro Ricardo Lewandowski, como vice-presidente do tribunal.
Barbosa foi empossado pelo decano da Corte, ministro Celso de Mello, e assinou o termo de posse. Em seguida, Barbosa concedeu a palavra ao ministro Luiz Fux para o discurso de saudação em nome da Suprema Corte.
"[Barbosa é] Paradigma de coragem e honradez", afirmou Fux. "Traz em si a retidão da alma." "O drama do juiz é a solidão. Raramente encontra espíritos do mesmo nível", disse ainda Fux sobre o novo presidente do STF.
Em seguida, discursou o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que enfatizou a união dos diversos órgãos do Judiciário brasileiro. "Precisamos todos trabalhar juntos para dar continuidade ao aprimoramento de nosso sistema de Justiça", disse Gurgel.
O presidente da OAB, Ophir Cavalcante, elogiou a atuação de Barbosa em casos de corrupção. "Quem infringe a lei deve responder por seus atos", disse Cavalcante, lembrando que Barbosa ajudou a acabar com o estigma da impunidade.
Perfil de Joaquim Barbosa
Mineiro de Paracatu, Joaquim Benedito Barbosa Gomes, 58, chegou ao Supremo em 2003, nomeado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Estudou direito na UnB (Universidade de Brasília) e possui mestrado e doutorado pela Universidade de Paris. Na sua tese de doutorado, publicada na França em 1994, escreveu sobre a Suprema Corte no sistema político brasileiro.
É professor licenciado da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro). É fluente em francês, alemão, inglês e italiano.
Antes do STF, integrou o Ministério Público Federal por 19 anos (1984-2003). Ocupou ainda diversos cargos no serviço público: foi chefe da Consultoria Jurídica do Ministério da Saúde (1985-88), advogado do Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados) (1979-84), oficial de chancelaria do Ministério das Relações Exteriores (1976-1979), tendo servido na Embaixada do Brasil em Helsinki, Finlândia.
Repercussão
Antes do início da cerimônia, o ator Milton Gonçalves, um dos convidados, disse que “ele [Barbosa] tem que ser lembrando pela capacidade, pelo raciocínio, por aquilo que ele empregou na juventude, na adolescência para se tornar um homem dessa importância. Óbvio que, como negro, sou copartícipe, sou parceiro dele, mas ele está lá por mérito, por mérito, só isso”.
Para a ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Luiza Bairros, o fato de um negro assumir o posto de comando da mais alta Corte do país não deve ser considerado o mais importante, mas é símbolo de um novo Brasil. “Sem dúvida o simbolismo desse momento, para um país que se reconheceu como racista há tão pouco tempo, não pode ser negado”.
"É um momento histórico para o Brasil. Acho que o Brasil inteiro, de alguma forma, está presente aqui, se não fisicamente, de coração, em alma, e em solidariedade ao ministro Joaquim Barbosa, que é hoje o símbolo maior da altivez e independência do Poder Judiciário", afirmou o senador Aécio Neves (PSDB-MG).
Os familiares de Barbosa presentes à cerimônia disseram estar "envaidecidos e orgulhosos" do parente agora famoso.
À noite, as três entidades nacionais de juízes --AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil) e Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho)-- vão oferecer um jantar em homenagem a Barbosa em um clube em Brasília.
Popularidade
A posse coincide com o momento em que o ministro está em evidência na mídia por conta do julgamento do mensalão, do qual é relator. O julgamento, que resultou na condenação de figurões petistas, elevou Barbosa à categoria de celebridade nacional a ponto de haver uma campanha nas redes sociais para que saia candidato à Presidência da República em 2014. A popularidade é tamanha que o rosto do ministro irá estampar máscaras no Carnaval de rua do Rio de Janeiro em 2013. Barbosa, porém, rejeita tanto o papel de herói quanto o eventual ingresso na política.
Adorado pela opinião pública como exemplo ético e de alguém que subiu na vida, Barbosa, filho de um pedreiro e de uma dona de casa, será o 55º presidente do Supremo. No seu mandato de dois anos, caberá a ele definir a pauta do plenário e presidir o CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Ele continuará como relator da ação penal do mensalão
Gestão
Uma das prioridades da sua gestão, ao menos no início, deverá ser dar atenção aos processos com repercussão geral, que são aqueles cujas decisões do STF impactam os processos em outras instâncias. Com o julgamento do mensalão, desde o início de agosto, o plenário do tribunal deixou de julgar outras ações, causando o acúmulo de mais de 600 processos na fila e atravancando mais de 400 mil ações em instâncias inferiores.
Postura diplomática
Para especialistas em recursos humanos ouvidos pelo UOL, porém, a postura mais aguerrida de Barbosa se deve ao seu papel de relator e, como presidente, o ministro precisará ser mais diplomata. “Barbosa é uma pessoa muito bem preparada e faz sentido que, como relator, que se debruçou anos sobre um caso, defenda o seu ponto de vista, mas a presidência definitivamente exigirá dele outro tipo de postura”, avalia Leila Nascimento, presidente da ABRH (Associação Brasileira de Recursos Humanos)
Barbosa também deverá seguir a linha do ex-ministro Cezar Peluso no sentido de ampliar a transparência ao Judiciário. Uma das medidas do novo presidente deverá ser liberar os nomes completos dos investigados em processos. Hoje, mesmo que a ação não corra sob segredo de justiça, aparecem apenas as iniciais do investigado no sistema de busca do STF. Outro desafio irá colocar à prova a capacidade diplomática de Barbosa. Ele terá de negociar o reajuste salarial de juízes e servidores do Judiciário com a presidente Dilma Rousseff e parlamentares.
Embora na sua produção intelectual uma das questões caras tenha sido o tema das ações afirmativas --Barbosa publicou um livro sobre o tema em 2001--, ainda não há sinal de que pretenda tomar alguma medida ligada à causa negra.
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