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MPF denuncia dono da Riachuelo por crimes contra a honra de procuradora trabalhista

A procuradora do trabalho Ileana Neiva Mousinho e Flávio Rocha, dono da Riachuelo - Reprodução/Youtube/Zanone Fraiss/Folhapress
A procuradora do trabalho Ileana Neiva Mousinho e Flávio Rocha, dono da Riachuelo Imagem: Reprodução/Youtube/Zanone Fraiss/Folhapress

André Carvalho

Do UOL, em São Paulo

13/10/2017 19h44

O empresário Flávio Rocha, dono das lojas Riachuelo, foi denunciado na terça-feira (11) pelo MPF/RN (Ministério Público Federal do Rio Grande do Norte) por coação no curso do processo, calúnia e injúria contra a procuradora regional do Trabalho Ileana Neiva Mousinho.

De acordo com a denúncia, Rocha utilizou as redes sociais para acusar a procuradora de perseguição contra a Guararapes, controladora da Riachuelo e da qual é vice-presidente, além de ter se referido a ela como "louca", "perseguidora” e “exterminadora de empregos”.

A Riachuelo afirmou que não iria comentar a denúncia, pois Flávio Rocha ainda não foi notificado pelo MPF.

As ofensas à procuradora, publicadas em páginas do empresário em redes sociais, se deram após Ileana e outros nove procuradores do trabalho terem ajuizado uma ação civil pública, no dia 19 de maio, contra a empresa Guararapes Confecções S/A.

O MPT (Ministério Público do Trabalho), na ação, responsabiliza a companhia por irregularidades em confecções que prestam serviços terceirizados ao grupo varejista e pede uma indenização coletiva de R$ 37,7 milhões.

A ação foi feita após o órgão ter feito inspeção em mais de 50 confecções em 12 municípios, onde foi constatado que os empregados terceirizados destas oficinas de costura recebem remuneração mais baixa e possuem menos direitos trabalhistas que os empregados contratados diretamente pela Guararapes Confecções.

Acusações à procuradora

No dia 17 de setembro, o empresário publicou em seu perfil do Facebook uma carta dirigida à procuradora Ileana Neiva acusando-a de ser autora de uma perseguição sistemática à empresa por meio de denúncias infundadas à Delegacia do Trabalho.

O empresário também sugeriu que a procuradora estivesse intencionalmente prejudicando a empresa, já que ela não havia feito “exigências absurdas que não faz a nenhum dos nossos concorrentes”.

Em outras postagens, Rocha chamou-a de “louca”, “perseguidora” e “exterminadora de empregos”, chegando a sugerir o afastamento da procuradora. “A proposta é simples. Tirem a doutora Ilena Mousinho de nossa vida e nós vamos transformar o Rio Grande do Norte”, afirmou.

Campanhas e manifestações

Além dos ataques à procuradora, Rocha também lançou, em redes sociais, as campanhas "#mexeuComPainhoMexeuComNósTudinho", em referência a Nevaldo Rocha, fundador da Guararapes e pai de Flávio Rocha, e "#ExterminadoraDeEmprego", em referência à procuradora Ileana Neiva. 

O empresário também liderou uma manifestação, com cerca de 5.000 funcionários do grupo Guararapes, em frente à sede do Ministério Público do Trabalho, em Natal, no dia 21 de setembro. Por conta do protesto, o expediente da Procuradoria teve que ser reduzido, por questões de segurança. Na ocasião, o empresário postou frases como "o nosso povo está animado..." e "entendeu o recado, doutora?".

Ação "em defesa dos direitos coletivos dos trabalhadores"

De acordo com o MPF, a ação civil movida contra a Guararapes Confecções se dá "em defesa dos direitos coletivos dos trabalhadores, sempre instrumentalizada por meios de provas, submetendo suas imputações ao diálogo e à possibilidade de ser firmado compromisso de ajustamento de conduta entre as partes (MPT e empregador) --dentro dos parâmetros legais-- ou ao amplo contraditório, no âmbito da Justiça do Trabalho”.

O MPF ainda afirma que "não é contrário a qualquer forma de manifestação de liberdade de expressão”, mas ressalta que o empresário “teria transbordado os limites constitucionais, atingindo deliberadamente a honra de servidora pública no exercício da função”.

"Mais uma vez, Flávio Gurgel Rocha atribuiu à procuradora regional do Trabalho ser autora de comportamento típico de natureza penal, consistindo além de crimes de abuso de autoridade, previstos expressamente na Lei nº 4898/1965, no crime de prevaricação, previsto no art. 319 do Código Pena", destaca a denúncia. O crime de prevaricação consiste em deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra a disposição expressa em lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.

Outro lado

Antes da denúncia do MPF, no dia 20 de setembro, o empresário afirmou, por meio do Facebook, que "ao defender os interesses da Guararapes Confecção", não teve a intenção de "atingir a honra da procuradora Ileana Mousinho" e que foi "enfático" nas críticas a ela porque o emprego de milhares de pessoas "estava em jogo". 

Rocha disse, também, na ocasião, que não incitava a violência e que reafirmava sua posição a favor de "práticas trabalhistas mais modernas", como as aprovadas recentemente pelo Congresso Nacional, que entrarão em vigor em novembro.

Procurada pela reportagem do UOL, a assessoria de imprensa da Riachuelo disse que Flávio Rocha ainda não foi notificado sobre a denúncia do MPF e que não irá comentar o assunto.

Com relação à ação do Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Norte, a Guararapes afirma que a "teoria de subordinação estrutural defendida pelo MPT-RN não se aplica neste caso, pois se trata de uma negociação entre empresas independentes: a Guararapes e outras empresas do segmento de moda com 120 oficinas de costura localizadas no Rio Grande do Norte". "As oficinas de costura são empresas com configuração jurídica própria e autonomia na condução de seus negócios e de seus funcionários. Inclusive, é decisão das oficinas de costura para quais marcas vão produzir."
 
Segundo a nota,  as oficinas de costura cumprem a legislação trabalhista. "Pelo Pró-Sertão, as oficinas de costura são obrigadas a cumprir todas as normas trabalhistas previstas em lei, sendo que a fiscalização é feita pela Associação Brasileira do Varejo Têxtil (ABVTEX). Ainda assim, a Guararapes promove auditorias frequentes nas 61 oficinas de costura que fornecem para a empresa e, sempre que alguma desconformidade é identificada, a oficina de costura é retirada do cadastro de fornecedores. O cumprimento da legislação trabalhista é condição inegociável da Guararapes ao firmar contratos com seus fornecedores."