Comissão da Verdade diz que tortura no país começou antes da luta armada
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A Comissão da Verdade, criada pelo governo para investigar as violações aos direitos humanos durante a ditadura militar (1964-1985), afirmou nesta terça-feira (21) que os órgãos de repressão começaram a torturar muito antes de surgir a luta armada no país.

"A tortura começou a ser praticada nos quartéis em 1964. A tortura está na origem da ditadura militar. Ela ocorre antes da luta armada", afirmou a historiadora Heloísa Starling, uma das integrantes da Comissão, ao apresentar hoje em Brasília um balanço das atividades realizadas pelo organismo desde sua criação há um ano.

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Intelecto de Dilma e dinheiro de Pelé foram alvo da ditadura14 fotos

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Documentos do Deops (Departamento Estadual de Ordem Política e Social) de São Paulo, subordinado ao Dops (Departamento de Ordem Política Social), principal órgão de inteligência e repressão durante a ditadura militar, mostram que regimes autoritários ficharam figuras públicas como o ex-jogador de futebol Pelé, o cantor Roberto Carlos, os apresentadores Silvio Santos e Hebe Camargo e o escritor Monteiro Lobato. As fichas e prontuários podem ser consultados no site "Memória Política e Resistência", vinculado ao Arquivo do Estado. Conheça algumas das personalidades fichadas pela ditadura VEJA MAIS > Imagem: Arte/UOL

Os integrantes da Comissão disseram ter analisado os documentos que demonstram que os pesquisadores políticos eram torturados desde 1964, ano do golpe militar que derrubou o então presidente João Goulart, apesar das leis de exceção que instituíram a repressão terem sido ditadas pelo regime militar em 1968.

O regime de exceção de 1968 foi uma suposta resposta da ditadura ao surgimento de grupos guerrilheiros que pegaram em armas e muitos militares justificaram as torturas como uma resposta à ação de "subversivos" e "terroristas" que queriam instalar um regime comunista no país.

"Em 1964 já é possível identificar centros de detenção e de tortura", afirmou Starling ao descartar que a violência institucional teve início apenas quatro anos depois e ao citar pelo menos 32 bases de torturadores em sete diferentes estados do país.

A integrante da Comissão disse igualmente que, pelos dados recolhidos até agora, é possível dizer que a torutra não era uma prática isolada, mas a "base" da repressão.

"A tortura não é praticada de forma pontual. Ela é a base da matriz da repressão da ditadura", afirmou.

O que é a comissão?

A Comissão Nacional da Verdade é um grupo formado por sete integrantes que irá "examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos" praticadas entre 1946 e 1988 e redigir um relatório oficial, em um período de dois anos.

Entre os objetivos estabelecidos na lei que cria a comissão está o de "identificar e tornar públicos as estruturas, os locais, as instituições e as circunstâncias relacionados à prática de violações de direitos humanos (...) e suas eventuais ramificações nos diversos aparelhos estatais e na sociedade".

Segundo os dados recopilados pela Comissão, 1969, um ano depois do Governo assumir poderes excepcionais e suspender garantias constitucionais, foi quando mais se generalizou a prática da tortura.

Segundo o balanço parcial apresentado nesta terça, a Comissão criada pela presidente Dilma Rousseff, uma militante de esquerda que foi detida e torturada pela ditadura, escutou até agora 268 testemunhos, entre os quais os de 37 militares acusados de abusos e os de 207 vítimas do regime.

O professor Paulo Sergio Pinheiro, coordenador da Comissão, assegurou que em um ano de trabalho o grupo descobriu a existência de 250 "estruturas de inteligência" que funcionavam nos ministérios e nos estabelecimentos públicos.

"É impressionante a capilaridade do serviço de inteligência em todo o território nacional", afirmou Pinheiro.

Pinheiro acrescentou que a Comissão, cujo mandato se estende até dezembro de 2014, recopilou provas que demonstram a prática de violência e de tortura durante a ditadura, incluindo documentos militares que admitem que até os próprios uniformizados que se opunham ao regime foram submetidos à repressão física que os deixou "deficientes".

Segundo Starling, a informação recopilada também permite dizer que o presidente da República e os ministros militares participavam da linha de comando dos organismos de repressão e tinham conhecimento do que ocorria nessas instituições.

Os membros da Comissão admitiram que em seu relatório final recomendarão algum tipo de medida que permita o processo dos torturadores, crime imprescritível para a legislação brasileira, embora não esclareceram se solicitarão a revisão da Lei de Anistia que favorece até agora os tais repressores.

"Os crimes de lesa-humanidade são imprescritíveis. Se temos esse conhecimento (da prática desses crimes), temos que recomendar que esses casos sejam submetidos à justiça", segundo a advogada Rosa Cardoso, outra integrante do grupo.

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