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PMs têm menos de 2% de chance de serem presos por homicídio em São Paulo

Um policial militar paulista que matou alguém corre menos de 2% de risco de ser condenado e preso. De 1.823 assassinatos cometidos por PMs que foram registrados em boletins de ocorrência entre 2015 e 2020, apenas 20 resultaram em condenações de pelo Tribunal do Júri até setembro de 2024.

Os dados são inéditos. Foram levantados, organizados e analisados pela advogada e pesquisadora Débora Nachmanowicz de Lima para sua dissertação de mestrado. Ela foi aprovada em 19 de setembro passado na Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), com recomendação para publicação pela banca. É brilhante.

A autora desenha e descreve o funil de impunidade que vai sumindo com boletins de ocorrência, arquivando inquéritos e absolvendo os poucos que chegam às mãos de um juiz. Também narra os júris.

Logo de cara, Nachmanowicz de Lima demonstra que 29% das ocorrências registradas nem sequer foram investigadas. Não há referência a 530 dos assassinatos nos dados oficiais que a pesquisadora obteve do Tribunal de Justiça de São Paulo via Lei de Acesso à Informação. Ninguém sabe, ninguém viu. Em tese, todos deveriam ter sido investigados. Esses não foram.

Os 71% restantes viraram 1.293 inquéritos conduzidos pela Polícia Civil (821) e pela própria Polícia Militar (98) ou tiveram um destino pouco claro. Esses 374 que faltam da conta estão em andamento, correm em segredo de Justiça ou simplesmente não tiveram movimentações registradas pelo TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo). Na prática, foram arquivados. Sabe-se lá onde.

Fato é que dos 1.293 inquéritos iniciados entre 2015 e 2020 para apurar homicídios por policiais militares, apenas 122 foram transformados em denúncia pelo Ministério Público à Justiça até setembro de 2024. Isso mesmo, só 9% das investigações chegaram à conclusão de que havia provas ou testemunhos suficientes para sustentar uma acusação formal, uma denúncia criminal.

Faltou investigação? Faltou perícia? Faltou vontade?

Não, segundo Nachmanowicz de Lima. A explicação mais recorrente que a pesquisadora ouviu de policiais civis e promotores é que quem matou sabia o que estava fazendo. Fez de um jeito que não deixou vestígios forenses, nem vídeos, nem testemunhas. Só corpos e o relato dos próprios policiais. Tem método.

E as 122 denúncias, que fim levaram? Nachmanowicz de Lima perseverou e descobriu o destino de cada uma delas. Mais da metade não resultou em punição, ao menos por enquanto:

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  • Trinta e três estão em andamento;
  • Em 16, os denunciados foram absolvidos sumariamente pelo juiz;
  • Quatro foram desclassificadas como homicídio doloso pelo juiz;
  • Em uma, o réu morreu e processo foi extinto;
  • O resto teve fins diversos, mas nenhuma condenação.

Sobraram apenas 60 casos que o juiz encaminhou para o Tribunal do Júri para que os réus fossem julgados pelos seus pares. Desses:

  • Em 21, os réus foram absolvidos pelos jurados;
  • Dois foram desclassificados como homicídio doloso;
  • Onze continuam em tramitação;
  • Seis tiveram fins diversos, mas ninguém foi condenado.
  • Em 20, os réus foram condenados.

Apenas 20. É 1,5% dos 1.293 inquéritos policiais ou 1,1% dos 1.823 boletins de ocorrência originais.

Das 20 condenações, quatro foram de um mesmo policial. Ou seja, só 17 PMs foram condenados por assassinato e terminaram presos.

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