Médico se entope de ultraprocessados e relata o estrago no corpo e na mente
Sono perturbado, constipação, hemorroidas, irritação, tristeza, cansaço e ganho de peso. Em quatro semanas, o médico britânico Chris Van Tulleken viveu na própria pele os efeitos de comer alimentos ultraprocessados sem restrições.
Para saber se esses produtos faziam mesmo tão mal à saúde como alertam cientistas de todo o mundo, Tulleken passou quatro semanas comendo porcaritos no café da manhã, no almoço e no jantar. E os seus achados e relatos estão no livro "Gente Ultraprocessada", lançado nesta semana no Brasil (ed. Elefante).
Nesse período, 80% das calorias que ele ingeria vinham de comida congelada, sorvetes, biscoitos, cereais matinais açucarados e refrigerantes.
"Não achei que seria interessante, porque não é nada heroico", ele diz em entrevista ao podcast A Hora, do UOL. Essa é a quantidade que um quinto dos britânicos e norte-americanos comem de ultraprocessados, em média.
Ultraprocessado é um conceito elaborado pelo pesquisador brasileiro Carlos Monteiro em que se enquadram produtos elaborados a partir de ingredientes artificiais como emulsificantes, texturizantes, aromatizantes e corantes que imitam comida de verdade, mas não o são.
É, como diz Monteiro, o sorvete de morango que não tem morango na receita, nem leite, nem creme de leite. Leva, no lugar, leite em pó, óleo de palma, soro de leite, aroma de morango, cor de morango, muito açúcar e aditivos artificiais mil.
Tulleken narra as mudanças que sentiu com o passar dos dias. A primeira semana acabou incólume. Na segunda, passou a acordar à noite várias vezes para fazer xixi --o sódio em excesso dos ultraprocessados aumentou sua sede. Com o tempo, o intestino travou, ficou com hemorroidas e fissuras anais dolorosas. A qualidade do sono despencou.
Na quarta semana, o autor folgou o cinto em dois buracos. A sensação era de que envelheceu dez anos, ele conta. Estava exausto e triste. Engordou seis quilos e dobraria o peso do corpo se mantivesse o ritmo em um ano.
Os hormônios da fome e da saciedade estavam desarranjados e seu cérebro parecia que tinha dado bug. Ele tinha vontade de comer porcaritos, mas ao mesmo tempo sentia repulsa ao se informar cada vez melhor sobre o processo de produção.
Concluiu que a indústria de ultraprocessados opera em várias frentes para garantir o consumo cada vez mais elevado. Não apenas com aromatizantes, embalagens atraentes e propagandas estimulantes. Mas também com a posição certa nas prateleiras dos supermercados, além do pagamento a influenciadores, pesquisadores e as melhores cabeças para atuarem a favor do negócio.
"Cientistas trabalham duro para te fazer comer muito. Se está difícil se controlar e reduzir a quantidade, a culpa não é sua. É o propósito dessa indústria", diz o médico.
Ao publicar o livro na Inglaterra, o autor temia ser processado pelas grandes redes citadas nominalmente na obra. No evento de lançamento do livro no Brasil, na última terça-feira, ele contou que uma das primeiras mensagens que recebeu foi do McDonald's. Ele tremeu, mas não precisava. Era "só" um convite para se tornar embaixador para alimentação e nutrição da rede de fast food.
Bingo, a tese estava comprovada.
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Podcast A Hora, com José Roberto de Toledo e Thais Bilenky
A Hora é o novo podcast de notícias do UOL com os jornalistas Thais Bilenky e José Roberto de Toledo. O programa vai ao ar todas as sextas-feiras pela manhã nas plataformas de podcast e, à tarde, no YouTube.
Escute a íntegra nos principais players de podcast, como o Spotify e o Apple Podcasts já na sexta-feira pela manhã. À tarde, a íntegra do programa também estará disponível no formato videocast no YouTube. O conteúdo dará origem também a uma newsletter, enviada aos sábados de manhã.
35 comentários
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Deusdete Feliciano de Melo
Alimentar da trabalho, por exemplo fazer uma comida caseira com temperos frescos e alimentos frescos, como legumes e verduras, no mínimo leva uma hora, e depois vem a limpeza, mais uns quarenta minutos, saladas e legumes frescos é o que mais demora, como a maioria das pessoas leva uma vida corrida, acompanhado do desânimo de se dedicar a culinária, acabam se entupindo de alimentos fáceis de ser preparados, mas nada saudáveis.
Edson Shigueru Sakai
Muita gente nao tem dinheiro - os ultraprocessados sao baratos em relacao a comida fresca - e podem ficar armazenados por longo fempo, eu vi uma pessoa simples falando ao filho: nao vou chegar tempo, prepare aquela linguica da geladeira, alem de tudo, sao faceis de preparar, nao sao de todo ruins, mas realmente poderiam ser preparados de forma mais saudavel. Agora, ha um certo sensacionalismo nisto, ninguem envenena os outros porque quer, nem ha conspiracao para fazer as pessoas comerem ate estourar, do outro lado, isto tambem vende horrores em livros e likes e estes medicos e inflenciadores se entopem em quantidades muitissimo acima do normal, seria como comer colheradas de sal e acucar. Nao defendo ultraprocessados de jeito nenhum, mas, enlatados e conservas ja salvaram gente de morrer de fome em guerras.
Ivan Mendonça Loureiro de Carvalho
As conclusões a que ele chegou são de uma obviedade gritante. Deveria dizer também que ele fez uma cópia do trabalho anterior do.feito na rede mundial norte-americana…