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OPINIÃO

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Turbulência à vista: campanha de Lula precisa sair do piloto automático

16.ago.1994 - Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso no debate da TV Bandeirantes, em São Paulo: outros tempos, mais civilizados - 16.ago.1994 - Jorge Araújo/Folhapress
16.ago.1994 - Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso no debate da TV Bandeirantes, em São Paulo: outros tempos, mais civilizados Imagem: 16.ago.1994 - Jorge Araújo/Folhapress

Colunista do UOL

02/09/2022 12h29

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As pesquisas Datafolha e Ipec divulgadas esta semana mostram que a campanha de Lula precisa fazer mudanças no seu plano de voo na reta final da campanha nestes 30 dias que faltam para a eleição.

Voando em céu de brigadeiro desde o início do ano eleitoral, enquanto o governo Bolsonaro afundava numa maré de más notícias na economia, Lula podia se dar ao luxo de jogar parado, apenas comparando como o povo vivia no seu tempo e como está vivendo agora.

A coordenação da campanha do ex-presidente acionou o piloto automático e foi colhendo melhores resultados a cada pesquisa.

Mas, desde o início da campanha oficial, os ventos viraram na economia a favor do governo, e Lula passou a sofrer ataques cada vez mais ferozes, não só de Bolsonaro, mas também dos candidatos da terceira via. No debate de domingo passado, ficou claro que ele virou o alvo preferencial dos concorrentes.

Nas últimas pesquisas, Lula passou a oscilar negativamente, tanto no primeiro como num eventual segundo turno, agora cada vez mais possível, mesmo com Bolsonaro sem sair do lugar.

Como explicar esta aparente contradição, se o capitão não tirou votos dele, mas a diferença entre os dois vem diminuindo?

Creio que é preciso olhar para a parte de baixo da tabela do último Datafolha divulgado na quinta-feira.

Ali se vai ver que há um estoque de 23% de eleitores que não votam nem em Lula nem em Bolsonaro: 9% são de Ciro, 5% de Tebet, 4% de brancos/nulos/nenhum, 3% de outros e 2% de não sabem em quem votar.

Com as oscilações positivas de Ciro e Tebet, foi desse contingente que saíram os votos perdidos por Lula desde maio, quando tinha atingido 48%, podendo decidir a eleição já no primeiro turno.

Não adianta só chamar Bolsonaro de genocida, fascista, canalha e daí para baixo, porque isso não vai tirar votos consolidados do atual presidente, garantidos pela fatia do eleitorado que pensa e se comporta como ele.

É preciso cativar os eleitores do nem-nem, com uma campanha mais criativa, propositiva e emotiva, não só para mostrar a atual situação de calamidade do país, mas apontando para o futuro, mostrando claramente o que Lula pretende fazer para melhorar a vida dos brasileiros caso seja eleito. Eleição serve para renovar esperanças.

Para isso, é fundamental reformular o programa do PT no horário gratuito do rádio e da televisão, que está parecido com o dos outros candidatos, e não surpreende mais nem cativa o eleitor, ao contrário do que se viu em campanhas anteriores.

Lula precisa dedicar mais tempo à gravação das suas falas, por ser seu maior cabo eleitoral e já estar ficando sem voz, pois estão muito repetitivas e burocráticas, temperando melhor defesa e ataque, se possível com bom humor e propostas, mais do que resenhas do que já fez em seus dois mandatos.

Tem que ser um programa mais jornalístico, mais vibrante, respondendo prontamente às demandas de cada momento, e menos de propaganda, para desmentir no ato as fake news, e levar ao ar os melhores momentos dos últimos comícios, indicando dia e local.

A nota "Agora ou nunca", que abre a coluna Painel da Folha na edição de hoje, mostra que a ficha já começou a cair no comando da campanha e que é preciso jogar tudo para tentar vencer a eleição no primeiro turno.

Fábio Zanini informa que na avaliação do partido a melhora da economia deve ter seu maior impacto a partir de agora, o que ajudará o presidente na reta final. "A ofensiva passa por aumentar o tom contra o presidente, apresentar novos planos para a economia e buscar atrair o eleitorado de Ciro Gomes (PDT)".

Acrescento que deve também falar para os eleitores de Simone Tebet e os indecisos, pois é ali que se vai decidir se haverá ou não segundo turno. De um jeito ou de outro, será uma votação muito apertada, como prevê Mauro Paulino, ex-diretor do Datafolha. O chamado "voto útil" para impedir a vitória de um ou outro candidato costuma se consolidar só nos últimos dias de campanha, de acordo com a evolução das pesquisas.

Tem muito número, "povo fala", clipe musical e pouca reportagem no roteiro do programa, que parece engessado, sem mudar de uma edição para outra. O PT tem o maior tempo no horário eleitoral e precisa saber explorar esta vantagem. Não dá mais para jogar parado e ficar no piloto automático.

O jogo vai ficar cada vez mais pesado e o adversário na polarização agora não é mais um tucano civilizado, mas um assumido extremista de direita, que não tem limites para mentir e manipular a opinião pública com factoides, como o de dizer que foi ele quem levou água para o sertão nordestino (88% da obra foi iniciada e concluída nos governos do PT, e é preciso mostrar isso).

Lula ainda está na frente em todas as regiões do país, mas as diferenças vêm diminuindo.

De outro lado, para diminuir sua rejeição, que já atingiu 52%, um índice proibitivo para qualquer candidato, Bolsonaro continua despejando dinheiro nas hortas dos eleitores. Ainda hoje, anunciou a inclusão de mais 803 mil famílias no Auxílio Brasil, a um mês das eleições, elevando a 21 milhões o número de domicílios beneficiados, a um custo de R$ 26 bilhões. Até agora, porém, isso ainda não se refletiu nas pesquisas a favor do presidente.

Faltam agora apenas 10 programas no horário eleitoral. Dá tempo de recalcular a rota.

Vida que segue.