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Opinião

De retrocesso em retrocesso, é hora de reagir

Aos trancos e barrancos, é inegável que tivemos avanços civilizatórios após a redemocratização do país, com leis e políticas públicas para mitigar a profunda desigualdade social e garantir o mínimo de direitos humanos para todos, mas estamos voltando ao vale-tudo da barbárie institucional do governo anterior, agora promovido pelo Congresso de maioria bolsonarista. Numa penada, essas conquistas estão todas ameaçadas.

Com as pautas-bomba de "costumes" lançadas pelas bancadas BBB (da bíblia, do boi e da bala), sob os auspícios de Arthur Lira, o legítimo herdeiro de Eduardo Cunha na presidência da Câmara, podemos regredir décadas em poucas semanas, sempre em "regime de urgência".

Tudo agora é anti: antiaborto, antidrogas, antipraias e escolas públicas, antiproteção do meio ambiente, antiressocialização dos presos, antidesarmamento. Em benefício de quem? Dos estupradores, dos traficantes, do crime organizado, das milícias, dos fanáticos religiosos, da especulação imobiliária, dos exploradores de trabalho escravo, dos fabricantes de armas.

De retrocesso em retrocesso, esta primeira quinzena de junho de 2024 ficará marcada na História pela ofensiva reacionária nos mais diferentes campos da vida nacional. Aonde vamos parar? De volta à Ditadura Militar, à República Velha, à Idade Média?

Só falta agora revogar a Lei Áurea, o voto feminino, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto do Idoso, as demarcações das terras indígenas, o salário mínimo, o direito à aposentadoria (só dos civis), à educação e à saúde, o Carnaval e a lei da oferta e da procura.

Tenho até medo de estar dando ideias, eles podem gostar...Me pergunto o que move gente como Arthur Lira e o deputado Sóstenes Cavalcanti, da bancada evangélica, autor do projeto que criminaliza as mulheres vítimas de estupro e alivia a barra dos seus algozes?

É algo tão avassalador que, nas últimas semanas, o governo simplesmente desapareceu das discussões sobre estas pautas parlamentares anticivilizatórias que pretendem fazer do Brasil um grande Afeganistão, como a Folha registrou em manchete no sábado.

"É preciso barrar os retrocessos", prega o jornal em editorial, mas esta não pode ser uma tarefa só do governo de turno, em franca e crescente minoria no Congresso, mais perdido do que cachorro em dia de mudança.

Tem que haver uma reação forte da sociedade civil organizada, a mesma que se mobilizou nas ruas contra a ditadura na Campanha das Diretas e impediu pelo voto a permanência dos golpistas no poder em 2022.

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Os primeiros sinais de que o povo não aceitará calado o avanço do atraso foi dado com as manifestações de protesto cada vez maiores organizadas na última semana por movimentos de mulheres, com grande participação masculina, nas principais capitais do país.

Só depois disso, no sábado, o presidente Lula, em viagem ao exterior, se manifestou pela primeira vez, de maneira contundente, na crítica a essa aberração legislativa de punição às mulheres obrigadas a fazer aborto nos casos previstos em lei.

"Eu sou contra o aborto. Entretanto, a gente precisa tratar o aborto como uma questão de saúde pública. É insanidade alguém querer punir uma mulher com pena maior do que o estuprador".

Quem sabe agora os líderes governistas deixem dessa história de liberar as bancadas nos projetos de "costumes", para priorizar a pauta econômica, e se engajem nesta luta humanitária que já ganhou as ruas e o apoio presidencial. Foi comovente ver a grande marcha de Porto Alegre na noite de sexta-feira, em meio aos destroços da enchente. Onde há vida, há esperança.

Perder votações é do jogo, mas o que não se admite é deixar de combater esses arautos das trevas em todas as tribunas, nos espaços públicos e virtuais, para impedir o retrocesso galopante.

"A derrota não é do governo. A derrota é dos pobres, dos negros, das mulheres e, principalmente, das meninas", escreveu Renato Vieira (de Florianópolis, SC) no Painel do Leitor da Folha. É esse sentimento que deve mover a sociedade, como mostrou no mesmo espaço a leitora Lorena Pardelhas (de Porto Alegre, RS): "Não foi o governo Lula que perdeu. Fomos nós, sociedade e nação (...). Perde o brasileiro".

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Ainda é tempo de virar este jogo.

Vida que segue.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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