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Sem regulamentação, mineração em Terras Indígenas ocupa área superior ao RJ
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Uma área de 50 mil km² dentro de Terras Indígenas (TIs) no país tem requerimentos para atividade de mineração. Para efeito de comparação, o estado do Rio de Janeiro tem 43,6 mil km². O levantamento consta no livro "Mineração em terras indígenas: desenvolvimento para quem?", lançado ontem em Brasília.
Ou seja, cerca de 4% da extensão territorial destinada às TIs encontram-se em situação de inconstitucionalidade, com processos minerários ativos a elas sobrepostos."
Trecho do livro
Dados consideram informações publicadas até fevereiro de 2022. São análises feitas a partir do Sistema de Informações Geográficas da ANM (Agência Nacional de Mineração), órgão federal responsável pelo registro dos processos minerários, com cruzamentos sobre as áreas indígenas disponíveis na Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas).
Mapa de processos minerários sobrepostos dentro de TIs:
Os dados, ressalte-se, só incluem processos legais e excluem os casos de garimpo ilegal, como ocorre dentro da terra Yanomami e vem provocando uma crise humanitária. O garimpo é uma forma de mineração feita de modo artesanal.
O que diz a lei
Segundo a Constituição Federal, a mineração em TIs depende ainda de regulamentação do artigo 231. Com a falta dela, o MPF (Ministério Público Federal) ajuizou ação civil pública para o governo suspender os requerimentos de pesquisa ou exploração em terras indígenas.
A ANM afirmou que vem realizando um mutirão de estudos e cancelando as outorgas ou pedidos dos mineradores. "Como resultado desse trabalho, os indeferimentos vêm sendo publicados, diariamente". A agência enviou despachos de indeferimento publicados no Diário Oficial da União nos dias 9 e 10 de fevereiro deste ano.
Mais de 100 projetos de lei foram apresentados no Congresso para regulamentar a mineração, desde 1988. Entretanto, não chegaram a uma definição, diante da complexidade e divergências sobre o tema.
É fundamental que se conheça a dimensão e o potencial dado pela geodiversidade desses territórios. Para isso, teríamos de ter um inventário geológico detalhado para que os povos indígenas, o governo brasileiro e a sociedade possam escolher qual será o futuro da exploração nestas terras."
Suzi Hoff, geóloga e coordenadora do livro
Como o debate não é novo, especialistas defendem uma ação do governo federal. "Os ministérios deveriam ter uma articulação e implantar o que já foi discutido lá atrás: apoiar as populações que têm interesse nos processos [de mineração], e proteger as que não têm", diz Fábio Reis.
Se você olhar o mapa, vê muitas liberações também em áreas de interseção, o que gera uma tensão econômica, uma pressão para poder entrar no território."
Fábio Reis, geólogo e um dos autores do livro
Ocupação
No Brasil, as TIs ocupam 1,18 milhão de km², ou 14% do total do território do país —o equivale à extensão de França, Alemanha e Reino Unido juntos.
Desse total, ainda há 104,9 mil km² com processos de pedido de mineração em interseção com as TIs, ou seja, ao lado de áreas indígenas, o que, segundo pesquisadores, também gera tensão. A área é equivalente ao estado de Pernambuco.
Segundo o livro, a ANM tinha, até fevereiro de 2022:
- 211 mil processos minerários cadastrados.
Desses:
- 2.581 são em áreas em interseção ou sobreposição em Terras Indígenas.
Segundo Suzi Huff, alguns desses pedidos podem ser considerados legais, se foram protocolados na ANM antes da Constituição de 1988.
"Outro caso possível pode ocorrer se o processo for anterior à homologação da TI. São possibilidades que devem ser consideradas, mas a grande maioria dos processos é bem mais recente", diz.
Geólogos defendem que sejam criados territórios livres de mineração, baseados nos princípios de rigidez socioambiental, que está em contraposição à chamada "rigidez locacional" (que determina que a exploração mineral só pode ocorrer no local onde minério ocorre).
O que nós argumentamos é que esse impedimento poderia resguardar determinados territórios, por seu valor cultural, social e de proteção à população indígena que não optar pela permissão da exploração mineral."
Suzi Huoff
Sobre o livro
A publicação foi feita em parceria por Febrageo (Federação Brasileira de Geólogos), Sindicato de Geólogos do estado de São Paulo e Associação Baiana de Geólogos.
O patrocínio da obra foi do Confea (Conselho Federal de Engenharia e Agronomia) e da Caixa de Assistência dos Profissionais do Crea.
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