Festas e passeios noturnos sem controle ameaçam piscinas naturais de Maceió
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O sucesso dos passeios noturnos às piscinas naturais da praia de Ponta Verde, em Maceió, se tornou uma preocupação ambiental pelo risco que submete aos corais em uma das áreas mais ricas da biodiversidade marinha do país. O caso foi parar no MPF (Ministério Público Federal), que apura os danos ambientais gerados pelo turismo hoje sem controle na área.
O banho de lua, como é chamado, virou uma das vedetes do turismo na capital alagoana, mas ambientalistas apontam que ele é ameaça e defendem uma regulamentação da ida ao local —que também é visitado durante o dia.
O passeio é feito em horários e dias variados, a depender da maré e da fase da lua. O cliente é levado ao local por jangadas e catamarãs, a preços a partir de R$ 50, até as famosas piscinas naturais — que estão a cerca de 1 km da costa, e onde permanecem por até três horas.
A ida noturna ao local começou há poucos anos e virou um sucesso de público. Segundo a prefeitura, há dias que mais de 500 pessoas vão ao local. Lá são realizadas festas, que contam com luzes, som alto e shows.
Qual o temor?
O debate ganhou força a partir do dia 31 de janeiro, quando o pesquisador Robson Santos, do Laboratório de Ecologia e Conservação no Antropoceno da Ufal (Universidade Federal de Alagoas), divulgou carta alertando para os danos ambientais que a superlotação nos passeios noturnos estavam causando nos corais. "O turismo depende de recifes de corais saudáveis", alertou.
No documento, ele cita que a promoção de festas noturnas nos ambientes recifais "não está alinhada com práticas de turismo sustentável, comprometendo o próprio futuro das atividades de turismo."
Atualmente, os corais de Maceió passam por um processo sem precedentes de branqueamento e morte por conta do calor das águas do Atlântico, que torna o ecossistema ainda mais vulnerável.
Os impactos de um turismo sem regramento em uma área recifal envolvem problemas com a ancoragem das embarcações e pisoteio dos recifes, o que leva a danos físicos diretos aos organismos do recife, como quebra, soterramento, dentre outros.
Robson Santos
Segundo ele, estudos já demonstraram que a luz da lua tem um papel importante na desova dos corais, e a introdução de luzes artificiais podem fazer com que os corais não desovem."

A iluminação artificial intensa pode desorientar organismos marinhos, afetar o comportamento e reprodução de corais e pode atrair predadores para áreas onde normalmente não estariam. Música alta pode afetar a comunicação e comportamento de peixes e invertebrados, além de estressar organismos sensíveis, como algumas espécies de peixes e tartarugas marinhas que utilizam os recifes como local de descanso.
Robson Santos
Além disso, ele cita que a exploração do turismo durante dia e noite "promove um impacto crônico contínuo aos ambientes recifais." Hoje, o laboratório desenvolve um projeto de monitoramento dos recifes, qualificação do turismo e experimentos de restauração.
O turismo pode e deve ser uma ferramenta de conservação dos recifes de coral, pois ele ajuda a conectar as pessoas a estes ambientes, mostrar suas belezas, monitorar a sua saúde e perceber as suas fragilidades. Temos outras atividades alternativas de turismo noturno poderiam ser exploradas e que são de baixo impacto, como passeios de Stand-Up Paddle (SUP) ou caiaque, sem uso de iluminação intensa e ancoragem nos recifes, com guias treinados e em rotas seguras e pré-definidas.
Robson Santos

Prefeitura cria grupo para debate
O caso chegou ao MPF de Alagoas, que informou que recebeu uma denúncia no último dia 13 e que está "em fase inicial de avaliação, e as informações apresentadas estão sendo devidamente apuradas".
O secretário Municipal de Meio Ambiente e Urbanismo, Cantídio Mundim, afirma que está preocupado com o que está ocorrendo nas piscinas.
Para tentar chegar a uma solução, ele explica que foi criado um grupo de trabalho com outros órgãos do estado e federal para debater o que pode ser feito em termos de ações para ordenar o passeio e evitar mais.
Entretanto, não se sabe hoje se a melhor solução seria limitar áreas e número de pessoas ou mesmo proibir a visitação ao local.
Hoje não se tem um diagnóstico de qual a melhor solução, mas o que não pode é continuar como está: ter 500 a 800 pessoas sapateando ali em cima desses corais. Se nada for feito, rapidinho vamos ter todos os corais detonados. Precisamos não só evitar os danos, como queremos um projeto de recuperação desses corais.
Cantídio Mundim

O Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) afirma, em nota a coluna, que está participando do debate sobre a questão.
Está prevista, para breve, uma reunião entre representantes do Ibama, do MPF, da Prefeitura de Maceió, do IMA), da Marinha do Brasil e da Universidade Federal de Alagoas. A ideia é abordar o tema, para fins de elaboração de proposta de regulamentação.
Ibama
Também em nota, o IMA (Instituto do Meio Ambiente de Alagoas) diz que tem tomado medidas de proteção e educação ambiental, como" por meio de programas como 'Conduta Consciente em Ambientes Recifais', que orienta turistas e moradores sobre a interação responsável com os recifes".
Preocupação de jangadeiros

A ideia de limitar ou mesmo vetar o passeio noturno preocupa os jangadeiros que levam maceioenses e turistas ao local. "O banho de lua é o principal carro chefe das nossas atividades, pois é um passeio exclusivo local", diz Jaaziel Esli, que faz o passeio há 6 anos.
Ele explica que o passeio tem dois pontos de embarque, nas praias de Ponta Verde e Pajuçara. "Só do lado que operamos, são cerca de 25 a 30 jangadas. No outro lado não sabemos ao certo, mas certamente o número é maior", diz.
O grupo de jangadeiros, afirma, está em processo de formalização de uma associação para defender os interesses da classe.
Jaaziel diz ainda que o desembarque dos turistas ocorre em um banco de areia e acredita que os operadores minimizam os impactos e são conscientes da necessidade de preservar o meio ambiente.
Sempre orientamos os clientes em relação ao descarte do lixo, todas as jangadas tem lixeiras. Sempre orientamos também a não caminhar pelos corais: apenas é permitido a flutuação para observação em algumas áreas.
Jaaziel Esli
9 comentários
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João Bosco de Miranda
Está acontecendo praticamente no litoral todo. Só vai piorar, até acabar tudo. Quem viu viu, quem não viu nunca mais verá. Isso vale pra tudo na natureza hj.
Jo o Paulo Uriartt da Rosa
Proíbe tudo! Até visitação! Quem infringir vai fazer festa no xilindró! Põe uma corveta da Marinha armada até os dentes pra fiscalizar. Pelo menos dá uma utilidade pra eles, pra não ficarem pensando em golpes de estado...
Flavio da Costa Westermann
O Brasil infelizmente possui uma política de turismo nocivo e canibal. Ele possui a ganância com o ganho econômico acima de qualquer coisa, explorando seus recursos naturais de forma extensiva e danosa, sem qualquer preocupação do meio ambiente. Infelizmente verificamos isso em todas as capitais. Isso se chama de Turismo amador, aquele que não tem visão de preservar para poder utilizar os recursos naturais de forma sustentável e por mais tempo. Tomara que possam proibir este tipo de atividade que de certo irá acabar com a riqueza da natureza no local.